Sem legislação específica que regulamente o uso da técnica no Brasil, a Sociedade Brasileira de Hipnose (SBH) aproveitou a convenção dedicada ao tema, realizada em janeiro com mais de 400 profissionais, em Belo Horizonte, para lançar um código de ética próprio. Segundo o fundador da entidade – que já possui 150 filiados em todo o país –, Erick Heslan, o documento deve dar segurança a profissionais e pacientes que consomem o “produto hipnoterapia”.
“Até então, como não há regulamentação, a profissão é livre. Há profissionais de várias áreas, muitas vezes até diferentes das áreas da saúde que trabalham com hipnose. Essa liberdade tem o lado bom, de popularizar rapidamente a técnica, mas também o lado ruim, de dar brechas para que algo ruim possa acontecer”, reforça.
Segundo Heslan, o Conselho Federal de Psicologia também proíbe o psicólogo de fazer demonstrações públicas de hipnose. “O conselho estruturou essa regra para proteger a população de constrangimento. Até então, o hipnoterapeuta comum, que não tem formação em psicologia, não tinha nenhum código de ética, nenhuma regra que o impedisse a fazer algo ruim”, diz.
A importância dessas medidas, segundo Heslan, também vai ao encontro do grande crescimento da técnica no país e ajuda a quebrar barreiras e estigmas que ainda cercam a profissão. “No Brasil, ainda há um estranhamento, mas, por outro lado, o mercado brasileiro é muito maior do que em qualquer outro local do mundo. Não existe nenhum lugar que reúna tantas pessoas interessadas em cursos, eventos ou procurando tratamento de hipnose. Mas a gente está buscando desmistificar a técnica, informar melhor a população e educar as pessoas”, diz.
O fundador da SBH atribui o crescimento da hipnose no Brasil a um fenômeno recente. “Aqui no país têm alguns fenômenos na internet, como youtubers, que diferem do resto do mundo”, pontua.
No entanto, apesar das evidências dos recentes estudos científicos, muitos mitos ainda são barreiras para a aceitação do método como tratamento terapêutico. “Quero que a hipnose deixe de ser vista pelos pacientes como uma última alternativa, uma medida desesperada, mas como uma das alternativas”, diz.
Depoimento
“Procurei a hipnose porque estava com problemas no casamento. Comecei a ter depressão, tinha medo de tudo e muita ansiedade, mas não queria tomar medicamentos controlados. Em um curso, conheci um hipnólogo e apostei todas as fichas na técnica. Fiz 15 sessões, e minha vida mudou. Não salvei o casamento, pois não dependia apenas de mim. Mas mudei minha vida profissional e me livrei de todos os medos. Não podia ver aranha que tinha fobia. Hoje já consigo, e, se precisar matar a aranha, até mato. Fiz a técnica do balão gástrico hipnótico e consegui emagrecer 30 kg associando a hipnose com o coaching. Faço sessões de manutenção e, como passei por um problema muito grave recentemente – perdi um bebê e, em seguida, tive uma trombose –, assim que eu for liberada pelo médico vou voltar a fazer outras sessões. Todo o processo da hipnose me trouxe muitas mudanças, até para saber lidar com todas essas situações. Sou adepta da meditação e da auto-hipnose até hoje”.
Graziela Chiquim
37 anos
Dentista – Curitiba (PR)
Minientrevista
Melissa Tiers
Professora de medicina alternativa
Fundadora do Centro de Hipnose integrativa em nova York
A senhora acha que a hipnose já se popularizou e foi desmistificada no Brasil e no mundo?
Eu acho que está no caminho certo, mas ainda não é totalmente aceita em todos os lugares. Eu acho que, a cada nova pesquisa, ela torna-se mais e mais aceitável, mas a gente não chegou lá ainda. Existem muitos conceitos errados e mitos que são provocados pela indústria do cinema de Hollywood e da TV e também por alguns hipnotistas.
Alguns desses estigmas muitas vezes vêm mesmo por parte dos médicos ou eles já estão mais abertos a esse tema?
Sim. Eles estão ficando cada vez mais e mais abertos. Na verdade, depende de onde eles estão. Em Manhattan, nos Estados Unidos, em alguns hospitais, a hipnose já está ficando mais aceita, mas alguns médicos ainda não acreditam nessa prática. Eu treino médicos, e então, eles fazem mais trabalhos, e os pacientes falam para mais pessoas, e a hipnose vai se ramificando cada vez mais.
Sua palestra durante a Convenção Brasileira de Hipnose teve como tema “Coaching da mente inconsciente”. Como a senhora percebe esses resultados em seu dia a dia?
Eu trabalho com a comunicação de multinível. Isso significa que é preciso preparar a mente inconsciente das pessoas no primeiro momento em que eu falo com elas. Existem várias formas de influenciar cada momento. Quando ofereço um café ou chá gostoso, a pessoa já tende a acreditar que sou uma pessoa agradável. Antes do atendimento, eu coloco um cheiro de limão. Pesquisas mostram que, em ambientes agradáveis, as pessoas agem mais honestamente.