Na noite da decisão do afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República, e no dia seguinte, com sua saída do Palácio do Planalto e a posse do presidente interino, a frase martelou constantemente minha cabeça. Atribuída ao poeta romano Públio Terêncio Afro e, segundo alguns, ensinamento predileto de Machado de Assis e Marx, ela sintetiza a complexidade do que senti vendo acabar de desmoronar aquilo que foi parte de minha vida.
Os que porventura me lerem devem se lembrar de que nunca votei em Dilma e que, ao fim e ao cabo, foi diante da violência da imposição da candidatura dela ao PT por Lula, com a sucessão de decisões por ele tomadas para fazê-la vitoriosa, que deixei definitivamente o partido que ajudei a fundar.
Mas a gente não se livra de algo pelo qual lutou tanto tempo de uma só vez. Por mais que tudo que ocorreu tenha sido falha humana e que eu tente por isso compreender, a gente morre várias e sucessivas vezes diante do fracasso de seu ideal. Quem já teve algum tipo de perda na vida – e todos nós temos – compreende o que quero dizer com isso.
Diante dos brasileiros, abre-se agora um novo período. Sei que muitos estão esperançosos em dias melhores. Oxalá tenham razão. Mas o tamanho do estrago deixado pela herança dela e do próprio PT – haja vista o que vem acontecendo no governo de Minas Gerais, para não falar de outros Estados, governados por siglas como o PMDB no Rio e o PSDB em São Paulo – gera em mim um medo terrível do sofrimento dos excluídos. Falo dos trabalhadores de modo geral, dos pobres, daqueles que não tiveram sequer as oportunidades de possuir um teto, uma cama confortável, comida no prato todos os dias, bons médicos e remédios quando doentes, empregos seguros, uma vida de família repleta de momentos alegres. E, lembrando Drummond às avessas, “até um cão”.
Temo pela reconstrução na política, na economia, nas instituições e nas relações entre elas. Temo pelas consequências dessa mais que necessária operação de combate à corrupção sistêmica que acompanha o Brasil há muito, mas que chega ao paroxismo quando muitos investigados, réus ou já condenados, têm a coragem de pegar o microfone no Congresso Nacional e decidir a condenação de outros acusados, como Delcídio do Amaral e Dilma Rousseff. O rosário de discursos hipócritas de lado a lado, tanto dos que votaram contra a presidente quanto dos que tentaram defendê-la –, tudo isso me trouxe a exata dimensão de quantos desafios esperam o país daqui para a frente.
E, se não bastassem todos esses temores, vi perfilados na despedida de Dilma no Palácio muitos dos que foram responsáveis pelas humilhações que vivi enquanto estive na vida pública. Porque nela não vivi apenas glórias e sucessos. Também sofri demais dentro do PT.
Termino este artigo invocando o poeta que me tem consolado: “Todos estes que aí estão/ atravancando meu caminho,/ eles passarão.../ eu passarinho” (Mario Quintana).
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