Trabalhei com marketing anos a fio e – Deus me livre! – nunca vi tanta pesquisa no Brasil.
O que elas revelam, caro público-alvo? Fácil: as sondagens mostram que os institutos ligados aos maiores grupos de comunicação andam em pânico. Já se foram os tempos da farta grana oficial via campanhas publicitárias com propriedades amaciantes. Descontentes com o regime, viraram seus tablets raivosos para o governo, que prefere usar o Twitter quando se comunica, de graça.
Para piorar, os algoritmos onipresentes e seus coleguinhas da moderna inteligência artificial são hoje muito mais confiáveis que humanos fazendo perguntas a humanos. Para piorar ainda mais, a frieza dos resultados estatísticos foi substituída pelo calor da paixão ideológica. Assim, em breve surgirá uma pesquisa dizendo que o governo atual é lindo e maravilhoso.
Quem já trabalhou na área sabe que uma pesquisa é uma ferramenta sujeita a chuvas e trovoadas. Com jeitinho, ela pode ser maquiada, ajeitada às conveniências do momento ou às necessidades do freguês. Se mal-intencionada, basta, por exemplo, aplicar um tanto de canalhice na formulação das questões e outro tanto de safadeza na seleção do universo pesquisado.
Um batonzinho aqui, um pó de arroz ali e chapinha no cabelo. Pronto: a nova pesquisa já pode sair às ruas certa de que vai abafar. Penso que já é hora de os institutos captarem o retrato do momento nacional com honestidade, realismo e sem frescuras. Para começar, cairia súper bem uma pesquisa sobre... os institutos de pesquisa.
Pergunta única: “Ao ouvir os resultados de uma nova pesquisa, você achou que os números do nosso instituto mostraram
a) um retrato fiel do periclitante cenário nacional;
b) uma forçada de barra daquelas descaradas;
c) uma tentativa de fazer a cabeça dos incautos com fins inconfessáveis; ou
d) ficção conspiratória para breve consolo e vãs esperanças dos derrotados na última eleição”?
Outra pesquisa urgente é a que poderia aferir a credibilidade da chamada “mídia tradicional”. O senhor entrevistado acredita totalmente, em parte ou bulhufas do que dizem os jornais e telejornais? Certos fatos do momento podem ser comparados a um rinoceronte enfurecido dentro de uma loja de cristais. Boa parte da imprensa finge não ver o bicho quebrando tudo e, em vez disso, dá prioridade ao vestido da vendedora, que não combinou com os brincos.
Vejam o caso da delação do arrependido Palocci. O ex-homem-forte dos governos petistas gravou vídeo detalhando o repasse de bilhões para as campanhas do partido em troca de MPs.
Pergunta: quantos jornalistas investigativos – esses profissionais da moda – correram afobados com câmeras e microfones rumo à notícia escandalosa?
Na semana da delação do italiano, uma famosa jornalista preferiu entrar na sala de jantar de Moro e exibir os pratos da esposa do ministro – que tem todo o direito de curtir louças e talheres na sua intimidade, ué. Replicou a foto da mesa arrumada, limpinha, e assim despertou a ira sobretudo das novas selvagens – aquelas tribos seminuas, de corpos pintados, que comem com as mãos, agachadas, deixando tudo sujo em volta.
Cá entre nós, venho realizando por minha conta pesquisas urgentes que faltam. Público-alvo: cidadãos comuns, como você e eu, trabalhadores, pagadores de impostos; índice de credibilidade de 100%. Questão única: o que você acha das atitudes de parte da imprensa, de parte dos políticos, de parte dos militantes digitais, de cineastas especializados em filmes de sequestro de filhas de autoridades e de portais que chamam crianças de “imbecis”?
Já que O TEMPO é lido por gente bem-educada, acho melhor guardar os resultados e as respostas cabeludas só para mim.