MÁRCIO COIMBRA

Bolsonaro e a política

Para Bolsonaro, portanto, não importam os rumos da agenda legislativa, mas os caminhos das narrativas que reforçam sua posição de antagonista do sistema


Publicado em 09 de dezembro de 2019 | 03:00
 
 
 
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Depois dos solavancos do primeiro ano de governo, tudo indica que a margem de apoio a Bolsonaro se estabilizou na opinião pública. Ao voltar-se exclusivamente para sua base, um eleitorado situado no corner direito do espectro político, posicionou-se como líder desta parcela da população. Este movimento estratégico tornou-se suficiente para realizar sua manutenção no poder, impondo um método que passa pelo controle da narrativa, mesmo que sem resultados tangíveis.

O espírito combativo e a postura descolada da política consolida sua posição de político de direita, ocupando de forma isolada este nicho, impenetrável até o momento por qualquer outro aspirante ao Planalto. Neste núcleo não importam os resultado reais de sua agenda, mas simplesmente sua disposição em assumir a liderança desta narrativa. 

Diante deste cenário, torna-se importante para Bolsonaro encarnar a figura de antagonista contra o sistema. Neste modelo impõe-se a crítica contundente e a posição de indiferença sobre temas, líderes, agendas e até instituições. Neste ponto, a postura de Bolsonaro lembra muito o ex-presidente Afonso Pena, que certa vez pontuou: “Na distribuição das pastas não me preocupei com a política. Os ministros executarão meu pensamento. Quem faz a política, sou eu”. No caso de Bolsonaro, ao negar-se a fazer política, acaba adotando uma forma pouco usual, mas eficaz de exercício de poder (e política) com seus apoiadores.

Se Bolsonaro conseguiu sedimentar-se diante do eleitorado como o nome da direita política nestes primeiros meses de governo, o mesmo não se pode dizer sobre a sua relação com o Parlamento. Entretanto, seu grupo político, mesmo sem colher resultados objetivos e fazer com que sua agenda caminhe no Congresso Nacional, consegue entregar a narrativa de antagonista do sistema, que funciona de forma efetiva para mobilizar sua base de apoio eleitoral.

Os riscos existem e precisam ser calculados. Ao mesmo tempo que consegue liderar esta parcela da direita, o capitão percebe que precisa blindar esta faixa do eleitorado em torno de sua candidatura. Isto explica a radicalização do discurso e a formação deste novo partido em torno de seu nome e liderança, fornecendo uma simbiose entre partido e líder, o que enfraquece o debate e reforça o tradicional cunho personalista da política. 

Para Bolsonaro, portanto, não importam os rumos da agenda legislativa, mas os caminhos das narrativas que reforçam sua posição de antagonista do sistema. Inclusive reiteradas vitórias do governo no Parlamento reforçariam a ideia de conchavos, acertos e práticas de uma suposta velha política em curso. A estratégia do confronto deixa o governo em evidência e fortalece sua imagem de outsider.

Logo, o modelo em curso possui método e lógica dentro da estratégia política. Bolsonaro cerca-se de uma base fiel, que beira um terço do eleitorado, responde aos seus desejos e pautas, bancando esta agenda. Na medida que ocorre a escalada do confronto e aumento da polarização, este grupo tem mais oportunidades de criar sua narrativa. Ao rejeitar a política, torna-se um símbolo de seus novos mecanismos.

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