Quem foi criança nos anos 1990 provavelmente desejou experimentar uma fatia do emblemático bolo do filme “Matilda” (1996), devorado inteiro pelo personagem Bruce, a mando da diretora da escola.
Da telona para a vida real, desde 2013 a confeiteira Luana Drumond proporciona a experiência de defrontar-se com uma versão da inspiradora receita na vida real. Antes hospedado no extinto restaurante Belo Comidaria, o Bolo da Matilda – agora oficialmente da Doce que Seja Doce – tornou-se um dos cakes mais famosos da capital mineira, junto a gostosuras como a torta de chocolate com cobertura trufada da Fany Bombons, tradição há 40 anos.
Sim, o bolo de chocolate é uma unanimidade. Mas engana-se quem ainda pensa que não é possível incrementar ainda mais a iguaria. Cada vez mais, chefs confeiteiros, como Luana, se propõem a criar versões inovadoras da receita, prezando sempre por ingredientes de qualidade em todas as etapas da confecção. No caso do Matilda, a receita, que leva o nobre chocolate da Callebaut – uma empresa belga – tanto na massa quanto no recheio, resulta em uma estética “rústica”, porém super atrativa ao olhar. “É um bolo muito simples, com intensidades diferentes de chocolate. Acho que menos é mais, o produto precisa ser mais gostoso do que bonito, sempre”, acredita. “Ele é um bolo fiel e mostra exatamente o que você vai comer”, frisa ela, referindo-se às tentadoras camadas alternadas de chocolate e de caramelo belga.
Assim como Luana, a opção por ingredientes de qualidade faz toda a diferença. E, neste caso, quem manda, claro, é o chocolate. Para o chef confeiteiro Lucas Corazza, jurado do programa “Que Seja Doce” (GNT), é um fator é fundamental. Muitas de suas receitas, vale dizer, usam cacau nacional, produzido por fazendas de ponta.
A execução do bolo de chocolate não guarda muitos segredos. “O brasileiro criou o hábito de comer bolos bem ‘molhadinhos’ – e até ensopados. Mas prefiro uma boa massa, firme e úmida, feita com cacau, para ficar bem escura. O recheio é uma boa ganache com creme de leite fresco, cremosa e brilhante. Tudo adquire uma mesma textura. E é na mordida que você sente a diferença entre a massa e o recheio”, entrega ele, que opta por uma massa com pouca farinha, para obter um bolo denso e aromático, em uma das várias receitas que cria por ano.
FOTO: Breno Mayer/divulgação |
O bolo da T Special Cakes é feito com camadas de brownie, recheio de brigadeiro de doce de leite e ganache de chocolate belga |
Novo paladar
Conta a história que a parceria entre bolo e chocolate existe desde o século XVII, na Inglaterra. De lá para cá, ganhou variações e também “menos açúcar”, priorizando o sabor mais próximo ao amargo. A chef pâtissière Mariana Correa, da La Parisserie, incrementa a massa com farinha de avelãs e chocolate belga 50%, enquanto o confeiteiro Thiago Caixeta, da T Special Cakes, trocou uma massa tradicional por uma base de brownie e recheio de brigadeiro de doce de leite. “O amargo com o doce proporciona uma sensação diferente. Também uso sempre uma pitada de sal para realçar o sabor do chocolate e abrir as papilas gustativas”, ensina Thiago.
Para Lucas Corazza, o chocolate amargo está ganhando mais espaço no mercado da confeitaria. “O que ainda me assusta são os bolos que concentram muito açúcar, o que sobrecarrega o paladar e impede a apreciação do sabor por completo, inclusive do ingrediente principal, que é o cacau”.
Receita
Gâteau gianduia (Receita da chef pâtissière Mariana Correa, da La Parisserie)
FOTO: Victor Schwaner/divulgação |
Bolo de chocolate callebaut 50% com farinha de avelãs, ganache giandua e avelãs caramelizadas |
Ingredientes
- Massa:
60g de farinha de trigo
1 colher de café de fermento
50g de farinha de avelãs
100g de açúcar refinado
80g de manteiga sem sal
3 ovos
150g de chocolate 50%
- Ganache:
200g de chocolate gianduia
75g de creme de leite fresco
25g de leite integral
- Decoração:
30g de chocolate ao leite
50g de avelãs
25g de açúcar refinado
Modo de preparo
- Massa:
Derreta o chocolate com 5 colheres de sopa de água, e reserve. Derreta a manteiga e deixe esfriar. Bata os ovos com açúcar até ficar bem fofo. Junte a farinha, o fermento, a manteiga derretida, a farinha de avelãs e o chocolate derretido nessa ordem. Misture bem com uma espátula e asse em forno pré-aquecido a 180ºC, em forma untada, por 45 minutos a uma hora. Espere 5 minutos antes de desenformar. Deixe esfriar completamente antes de decorar.
- Ganache:
Aqueça o leite e o creme de leite. Despeje sobre os chocolates e a pasta de avelãs. Misture até ficar homogêneo. Leve à geladeira até começar a firmar. Coloque em um saco de confeitar com bico liso e decore.
- Decoração:
Faça um praliné com as avelãs e o açúcar. Deixe esfriar e quebre em pedaços grandes. Decore o bolo. Derreta o chocolate ao leite e faça riscos finos sobre o bolo.
Clássicos X inovadores
Mesmo apostando em técnicas da culinária francesa, a chef pâtissière Mariana Correa não questiona, em momento algum, o poder da clássica receita do bolo de chocolate com recheio e/ou cobertura de brigadeiro. Mas é fato: a inovação obtida pela exploração de novos sabores – como a prevalência do amargo na receita e as porcentagens de cacau no chocolate – segue sim, em alta.
FOTO: Fany Bombons/Divulgação |
A cobertura generosa de chocolate trufado em volta da torta da Fany Bombons |
Por outro lado, poucas receitas são tão nostálgicas como o clássico bolo de chocolate – e, nesse caso, por lembrar a infância, o acento da doçura é quase obrigatório. “Os tradicionais ‘bolos da vovó’ sempre terão presença garantida à mesa das famílias, principalmente pelo fato de acionarem a nossa memória afetiva. Afinal, crescemos comendo esses bolos”, analisa a chef. Na Fany Bombons, a torta de chocolate, carro-chefe da casa há anos, combina recheio de brigadeiro à cobertura trufada. Uma delícia.