Os versos da canção “Tropicália”, de Caetano Veloso, concretizam em voz e mistura sonora o movimento que abalou as estruturas da música brasileira. Quarenta anos depois de seu surgimento, os reflexos desta revolução ainda podem ser sentidos na arte de uma descendente direta do tropicalismo, Ava Rocha.
Filha do cineasta Glauber Rocha e da multiartista Paula Gaitán, ela desembarca no próximo sábado (27), no Teatro Bradesco. Em sua terceira passagem pela capital mineira, a cantora e também cineasta apresenta, em um show, a amálgama sonora de seu último álbum, “Ava Patrya Yndia Yracema”.
Mais que resgatar este momento de ruptura e reinvenção da música brasileira, acontecido em 1967, Ava cria nas canções de seu álbum uma mescla entre “a estética lúdica da Tropicália e o novo rock, funk, samba”, como dito pelo crítico musical do “The New York Times”, Ben Ratliff, que projetou a cantora no cenário internacional.
“Ele enxergou isso porque a minha formação é, de certa forma, tropicalista. Eu não procuro produzir a mesma sonoridade que eles produziam, mas procuro estar nesse movimento de constante invenção, de trazer a força desse devir revolucionário”, explica Ava.
No entanto, a revolução musical de Ava Rocha não se restringe apenas às melodias. A cantora também se posiciona politicamente em suas composições e canta abertamente sobre questões de gênero e feminismo.
“O disco, de forma inconsciente, se revela extremamente feminino, acho que pelo fato de eu ser uma mulher e trazer questões implícitas deste universo, do devir feminino, e isso naturalmente é transbordado”, pontua Ava que, na canção “Auto das Bacantes”, entoa às mulheres o mantra “meta um grelo na geopolítica”.
Para o show da próxima semana na cidade – depois de uma apresentação reverenciada pelo público no Festival Coquetel Molotov, no Cine 104, em outubro do ano passado –, a artista busca continuar esse movimento feminino. No palco, Ava recebe a mineira Juliana Perdigão e destaca a alegria que sente em voltar à cidade.
“Cara, eu amo Belo Horizonte. Acho as pessoas aí maravilhosas, de uma sensibilidade extrema, são pessoas que gostam de música. Nesse show, vou ter a participação esplendorosa da Juliana, que é uma grande amiga, uma irmã mesmo, e eu ‘tô’ muito feliz de tê-la no palco comigo”, conta Ava.
Legado
Filha da artista Paula Gaitán, Ava afirma que a mãe foi uma de suas maiores referências, bem como seu avô, o poeta colombiano Jorge Gaitán Duran. “Minha maior influência mesmo, da minha vida inteira, é a minha mãe. E ela sempre trouxe a poesia do pai dela para a nossa vida, então, eu já tinha uma vontade muito forte de musicar um poema dele”.
Depois de resgatar a memória do avô com o poema musicado “Sé Que Estoy Vivo”, Ava segue os passos do pai no cinema – embora tenha convivido com Glauber Rocha por apenas 2 anos. “Não gosto de ficar muito centrada na questão da paternidade, mas no fato de que ele é um grande artista, cuja obra permanece viva, reveladora, e que é um presente dos deuses para a humanidade”, comenta a cantora, quando perguntada sobre o pai.
Neste ano, em que se comemora o aniversário de 50 anos do filme “Terra em Transe”, Ava planeja trazer de volta aos palcos o show “O Som de Glauber Rocha por Ava Rocha”, apresentado pela primeira vez em 2015. No espetáculo, a filha do cineasta apresenta obras musicais e poemas criados por Glauber. “Ele era um cara que de certa forma se via como músico – e que sempre flertou com a música”, afirma.
Ava Rocha
Com participação especial de Juliana Perdigão.
Teatro Bradesco (r. da Bahia, 2244, Lourdes). Dia 27 (sábado), às 21h. R$ 30 (inteira).
Faça login para deixar seu comentário ENTRAR