RIO DE JANEIRO - A onda de violência que atingiu o Rio entre a madrugada e a manhã de ontem levou medo aos moradores e deixou 18 pessoas mortas. Das vítimas, sete estavam em um ônibus que foi queimado e morreram carbonizadas. Há mais de 20 feridos.
A partir da 0h, os criminosos atacaram a tiros ao menos cinco delegacias, carros e cabines da Polícia Militar. No início da manhã, um posto policial no Alto da Boa Vista também foi atacado.
Nove ônibus foram queimados. Para o secretário da Segurança Pública, Roberto Precioso, a ordem para os ataques partiu de presos, que temem mudanças na administração penitenciária a partir de 2007, com a troca de comando do governo do Estado, e o endurecimento do regime disciplinar.
Uma das preocupações dos criminosos seriam os prejuízos financeiros causados por ações do governo, como as de repressão ao tráfico de drogas. Precioso descartou que a série de ataques tenha sido motivada contra ações de milícias em morros da cidade.
Pânico
A onda de violência atingiu diferentes pontos e levou pânico aos moradores do Rio. Entre os 18 mortos estão sete supostos criminosos. Os nomes das vítimas ainda não foram divulgados. Do total de mortos, sete estavam em um dos ônibus incendiados, da Viação Itapemirim.
O veículo havia saído de Cachoeiro de Itapemirim (ES) e deveria chegar a São Paulo na manhã de ontem, com 28 passageiros. O ataque ocorreu no viaduto que liga a rodovia Washington Luiz à avenida Brasil. Alguns passageiros, assustados, fugiram do local e ainda são procurados pelas autoridades.
A viação afirma que assumirá as despesas dos traslados dos mortos. A Polícia Militar informou que três homens apontados por uma testemunha como envolvidos no incêndio foram presos. Eles estão com as mãos queimadas e não teriam apresentado justificativas para os ferimentos. (Folhapress)
Ataque a ônibus da Itapemirim mata sete
RIO DE JANEIRO - A 1h de ontem, os 28 passageiros do ônibus da Itapemirim haviam percorrido 300 km do Espírito Santo ao Rio. Muitos dormiam quando o ônibus foi interceptado bruscamente por cerca de 30 homens com fuzis e pistolas, no trevo das Missões, que liga a avenida Brasil à rodovia Washington Luís, de onde seguiriam por mais 450 km até São Paulo.
Um dos criminosos entrou, roubou passageiros, jogou gasolina no corredor e depois ateou fogo com as pessoas dentro do ônibus e com a passagem obstruída pelo agressor. A carroceria se incendiou rapidamente e houve pânico.
Alguns passageiros conseguiram sair pela porta e outros quebraram os vidros das janelas para escapar. Sete deles não conseguiram puxar a alavanca da janela de emergência e morreram carbonizados.
Relatos de passageiros indicam que a maioria dos mortos era idosos, sem forças para pular a janela. Pelo menos 12 pessoas ficaram feridas - três em estado grave.
Não puderam ser socorridos de imediato pelos bombeiros porque, logo após o ataque, começou um tiroteio entre os traficantes e PMs, que se deslocaram para o local. Em meio ao tiroteio, os sobreviventes correram para uma das pistas da avenida Brasil em busca de socorro.
Só depois de duas horas é que começaram a ser atendidos. Os corpos ficaram irreconhecíveis e só poderão ser identificados por exame de DNA. A Itapemirim divulgou uma lista com as pessoas que estavam no ônibus, mas ainda não podia informar os nomes dos mortos.
Todos os passageiros embarcaram na cidade de Cachoeiro. "Devia haver uns 20 homens armados. Me salvei porque eu pulei a janela. Quem não conseguiu pular, morreu", disse uma das sobreviventes, a auditora Cleite Couto Calheira, 30, que sofreu apenas cortes nos pés. (Folhapress)
Ambulante morre ao proteger filho
RIO DE JANEIRO - Sueli Maria Lima de Souza, 33, morreu servindo de escudo ao filho Gabriel, 6, contra os disparos feitos por bandidos que metralharam uma cabine da Polícia Militar na praia de Botafogo, na madrugada de ontem. Vendedora ambulante, havia cerca de um ano, vendia naquele ponto sorvete que fabricava em casa.
Foi atingida nas costas e morreu no local. O menino, atingido de raspão na cabeça e no braço, foi levado para o Hospital Miguel Couto, ainda sujo com o sangue da mãe que o salvou das balas. No mesmo ataque, foi baleado o soldado da Polícia Militar Fábio Chot da Silva, que levou um tiro em um braço.
-O menino contou que, quando os homens chegaram atirando, ela se jogou em cima dele e falou: "Se protege, meu filho"", contou uma cunhada de Suely, que não quis se identificar.
No momento do ataque, enquanto Sueli se abraçava ao menino para protegê-lo dos tiros, as outras crianças conseguiram escapar. O corpo de Sueli foi enterrado às 17h de ontem, no cemitério São João Batista, em Botafogo. (Folhapress)
Governador eleito admite acionar Força Nacional
RIO DE JANEIRO - O governador eleito do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), afirmou hoje que a onda de violência ocorrida entre a madrugada e esta manhã não vai intimidar o novo governo e admitiu que, se necessário, acionará a Força Nacional de Segurança Pública. As ações causaram 18 mortes.
Nosso governo não vai se intimidar e não vai tolerar esses ataques. Colocaremos um policiamento ostensivo nas ruas e se necessário, chamaremos a Força Nacional de Segurança Pública-, disse em nota.
A onda de ataques criminosos no Rio tornou-se ontem mais um tema a dividir Cabral e a governadora do Rio, Rosinha Matheus. Enquanto Cabral disse que pode buscar o apoio do governo federal, Rosinha afirmou que a ajuda não é necessária.
Ela disse que não solicitará ao governo federal o envio da Força Nacional de Segurança, em decorrência dos incidentes de ontem na região metropolitana do Rio. - São Paulo não precisou, por que aqui vai precisar"-, declarou a governadora, depois de assistir à implosão do Complexo Penitenciário da Frei Caneca, no centro do Rio.
Em Brasília
A onda de violência não motivou comentários oficiais por parte de integrantes do governo e do comando do Congresso. Os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), também não comentaram o assunto.
Procurados pela imprensa, disseram que não iriam se manifestar oficialmente. Institucionalmente, no entanto, o governo tem tratado do assunto com o governo e políticos do Rio.
O líder do PFL na Câmara, deputado Rodrigo Maia (RJ), disse que recebeu a informação do Ministério da Justiça de que o caso está sendo acompanhado com preocupação. Ele considerou os ataques um " final lastimável de uma política de segurança que não deu certo". (Folhapress)
Governo teria sido alertado no dia 26
RIO DE JANEIRO - No último dia 26, as chefias de todos os órgãos de segurança do Rio de Janeiro receberam um relatório da área de inteligência da Polícia Federal (PF) informando que bandidos promoveriam ataques na cidade, ontem.
Na investigação, escutas mostram que o traficante Jorge Ferreira, conhecido como Gim, da Cidade de Deus, na zona oeste da cidade, se reuniu com traficantes de outras facções criminosas no morro da Mangueira, na zona norte, para organizar as ações em represália às invasões de milícias promovidas por uma facção rival.
Os alvos preferenciais dos ataques, conforme levantou a inteligência da PF, seriam ônibus e instalações policiais. De posse desse documento, o secretário de Administração Penitenciária Astério Pereira dos Santos providenciou o isolamento dos chefes de facções criminosas na Penitenciária de Bangu III, na zona oeste.
De acordo com o que apurou a área de inteligência do governo federal, a onda de violência no Rio era para ser muito pior: um grande "banho de sangue" às vésperas do réveillon, no momento em que a cidade recebe cerca de 500 mil turistas
Divergências
As duas autoridades de segurança do Rio divergem sobre motivos que levaram os bandidos a promover os ataques. Para o secretário de Segurança Pública Roberto Precioso, a onda de violência foi uma resposta à mudança no comando da administração penitenciária no Estado.
"A próxima administração poderia adotar um regime diferente. É isso que eles temem" , disse. Precioso responsabilizou traficantes de drogas de várias facções de agirem conjuntamente.
-Não existe um comando central. Quando há um interesse comum é natural que se unam. Foi um ataque desorganizado, do tipo cavalo-maluco. Ou seja, o primeiro PM que o bandido encontra, ataca e mata", declarou.
Já Pereira dos Santos não acredita que as ações tenham qualquer relação com a mudança de governo, como afirma Precioso.
-Todos sabiam que havia a possibilidade de união entre as facções em razão das ações das milícias que são altamente perniciosas para a administração pública. Não tenho a menor dúvida quanto a isso", declarou. (Agência Estado e Folhapress)