Nancy Gonçalves Cunha Ferreira e Kerollen Vitória Cunha Ferreira foram condenadas a 12 anos de prisão em regime fechado por injúria racial contra crianças negras. A sentença foi proferida pela justiça do Rio de Janeiro, na última segunda-feira (18/8). As influenciadoras, que são mãe e filha, ofereceram banana e macaco de pelúcia às vítimas em vídeos publicados nas redes sociais.
A juíza Simone de Faria Ferraz, da 1ª Vara Criminal de São Gonçalo, caracterizou os atos como "racismo recreativo", conforme previsto na Lei 7.716/1989. Segundo informações do G1, além da pena de prisão, as condenadas deverão pagar R$ 20 mil de indenização para cada uma das vítimas, com valores corrigidos monetariamente.
A dupla poderá recorrer em liberdade, mas está proibida de publicar conteúdos semelhantes em plataformas digitais, além de manter qualquer tipo de contato com as vítimas.
Os crimes foram cometidos em 2023, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Nancy e Kerollen abordaram duas crianças negras, uma de 10 e outra de 9 anos, oferecendo objetos historicamente associados a estereótipos racistas. Os vídeos foram compartilhados com tom humorístico nas redes sociais das influenciadoras, que somavam, na época, mais de 12 milhões de seguidores.
A magistrada considerou como agravantes o fato de os crimes terem sido cometidos em contexto de recreação e por mais de uma pessoa. Na decisão, destacou que as influenciadoras "animalizaram" as crianças e "monetizaram a dor" das vítimas.
Marcas graves na vida das crianças
Após a divulgação dos vídeos, o menino retratado passou a ser chamado de "macaco" na escola e abandonou seu sonho de se tornar jogador de futebol. A menina começou a brincar sozinha e precisou de acompanhamento psicológico.
Durante o processo judicial, as acusadas apresentaram defesa alegando que não tinham intenção de ofender as crianças. Nancy afirmou que "não sabia o que era racismo" e que apenas queria "alegrar as crianças". Já Kerollen declarou que só compreendeu a gravidade de seus atos após a repercussão negativa do caso. Ambas argumentaram que os vídeos faziam parte de uma "trend" (tendência) do TikTok.
A sentença determina que, após o trânsito em julgado do processo, sejam expedidos mandados de prisão e cartas de sentença contra as duas. O início do cumprimento da pena ainda não está definido, pois a defesa anunciou que irá recorrer.
Os advogados que representaram a família das vítimas celebraram a decisão judicial. "A sentença projeta-se para além do caso concreto: ela afirma que a infância negra não pode ser objeto de humilhação recreativa e que o racismo estrutural deve encontrar resistência efetiva no judiciário", afirmam em nota os advogados Marcos Moraes, Felipe Braga, Flávio Biolchini e Alexandre Dumans, do Escritório Modelo Nilo Batista (SACERJ).
"Embora ainda caiba recurso, trata-se de um marco simbólico e jurídico que reforça a função democrática do processo penal: transformar a memória histórica de impunidade em compromisso real com a igualdade e a dignidade humanas", concluem.
O advogado Mário Jorge dos Santos Tavares, que defende Nancy e Kerollen, declara que "manifesta total respeito ao Poder Judiciário, mas não concorda com a decisão". Ele acrescenta que "as rés sempre colaboraram com o processo e confiam que a Justiça reconhecerá sua inocência. Por isso, será interposto recurso ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, visando a reforma da condenação".
A defesa ainda "reafirma seu compromisso em demonstrar, nas instâncias superiores, a verdade dos fatos e a plena correção da conduta das acusadas".