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Desastres naturais causaram prejuízo de R$ 401 bilhões em todo o país em 10 anos

Fenômenos climáticos são desafios para o poder público e para a sociedade; grandes centros urbanos são afetados pela expansão imobiliária

Por Nubya Oliveira e Rayllan Oliveira
Publicado em 01 de abril de 2024 | 04:00
 
 
 
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Desastres naturais, como a chuva e a seca, causaram um prejuízo de R$ 401,3 bilhões em todo o Brasil nos últimos dez anos, conforme levantamento realizado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM). A média é de um prejuízo de R$ 40,1 bilhões por ano, valor que é quase o dobro do orçamento previsto para o Ministério das Cidades neste ano, de R$ 20,48 bilhões.

O estudo, realizado entre janeiro de 2013 e fevereiro de 2023, exemplifica que, neste período, foram mais de 2,2 milhões de moradias danificadas em todo o país, sendo que 107 mil ficaram destruídas. A perda, somente em habitação, ultrapassou a marca de R$ 26 bilhões.

A pesquisa também aponta que 93% dos municípios brasileiros foram afetados por esses fenômenos climáticos. Ao longo do período analisado, o Brasil teve 59.311 decretações de situação de emergência e calamidade pública. O principal motivo foi a seca, que representa 41% destes decretos, seguido pela chuva, com 27%. “São os municípios que mais sofrem com esses desastres. Eles precisam garantir serviços básicos, além de lidar com situações de mortes, feridos, doenças, entre outras”, expõe o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.

No atual período chuvoso, que começou no dia 27 de setembro do último ano, Minas Gerais destinou mais de R$ 805 mil na compra de produtos como cestas básicas, colchões, telhas, kits de higiene, de limpeza, entre outros, para oferecer à população afetada pelos temporais. Conforme balanço da Defesa Civil, divulgado no dia 24 de março, 96 municípios decretaram situação de anormalidade por causa da chuva desde o início do atual período. Ainda segundo o levantamento, seis pessoas morreram, 399 ficaram desabrigadas e outras 2.833 ficaram desalojadas devido aos temporais.

Uma das cidades afetadas pela chuva foi Governador Valadares, na região do Rio Doce. O município decretou situação de emergência em janeiro após um forte vendaval, acompanhado de chuvas intensas. O fenômeno foi considerado como "um dos piores" na história do município. "O decreto foi necessário para obter recursos para suprir as demandas. Os recursos federais e estaduais são importantes para socorrer os atingidos. É por meio deles, por exemplo, que habilitamos o município junto à Caixa Econômica Federal para pagar o FGTS aos moradores afetados", aponta o secretário de Governo da cidade, Daniel Portes.

Editoria de Arte / O Tempo

Impactos dos eventos climáticos

Em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, a forte chuva da madrugada do dia 20 de março deixou cerca de 500 pessoas desabrigadas. Um temporal, de cerca de 100 milímetros, atingiu o município durante quatro horas. O volume de chuva representou mais da metade da quantidade prevista para o mês, segundo a Defesa Civil.

A comerciante Jozimara dos Santos, de 48 anos, moradora da rua Joaquim Camargos, no bairro Água Branca, teve a casa alagada. O volume da água estragou a geladeira, o fogão e a máquina de lavar, além de alimentos e outros pertences. 

"Saímos eu e o meu marido, só com a roupa do corpo. A que estou vestindo agora foi a minha cunhada que emprestou", contou. Essa não foi a primeira vez em que Jozimara foi afetada pela chuva. Em 2017, parte da casa desabou. A parede da sala caiu, atingindo o banheiro e o quintal de um vizinho. "A sensação é a de que estamos abandonados pelo poder público. Muda a administração, falam que precisam desapropriar, que não conseguem entrar em acordo, e nada é feito. É preciso ter uma solução, o que não dá é a minha sogra de quase 83 anos morrer afogada", lamenta.

Drama semelhante enfrentou o empresário Marcus Souza, de 28 anos, que reside na rua Nossa Senhora da Paz, no bairro Jardim das Oliveiras, também em Contagem. Durante o temporal, a rua onde está a residência da família dele ficou alagada. O volume da água derrubou um muro, vindo a atingir o quarto, e inundando a casa. "Perdemos tudo, menos a vida", desabafa o aposentado Carlos Alberto de Souza, de 62 anos, pai de Marcus.

Segundo a família, eles já haviam procurado o poder público em busca de uma solução. "A gente alerta sobre isso há um tempo. A prefeitura já visitou a região, fez algumas obras, mas não o necessário para resolver. Então, mais chuva e mais prejuízos. Perdemos tudo, e não sabemos por onde recomeçar", expõe. 

Fenômenos naturais extremos desafiam cidades

A Prefeitura de Contagem atribuiu os estragos provocados pela chuva às mudanças climáticas e ao acúmulo de lixo. “Temos observado que o lixo depositado nas ruas inadequadamente tem entupido bocas de lobo e gerado enchentes significativas. Agora, outra coisa que está provocando [as enchentes] são as mudanças climáticas. Tivemos uma única bacia hidrográfica, que é a do córrego Ferrugem, que em 30 minutos registrou 49 milímetros de chuva. Isso só ocorre em um mês”, afirma a subsecretária da Defesa Civil, Angela Gomes.

Para a professora de biologia e sustentabilidade Fernanda Raggi, o momento, com chuvas fortes e calor intenso, serve de alerta para o poder público e toda a sociedade. Ela avalia que esses fenômenos tendem a ficar cada vez mais extremos devido ao aumento do desmatamento e à especulação imobiliária. “Esse crescimento desproporcional da área urbana provoca um desequilíbrio ecológico. A gente tem esse encontro das massas de ar quente e frio com maior intensidade, e diante da impermeabilização do solo, por exemplo, percebemos como consequência esses casos de inundações e alagamentos”, explica.

A especialista avalia que as cidades ainda não estão preparadas para este novo momento climático. Ela alerta ser necessário repensar o planejamento urbano, preservando as áreas verdes, a fim de proporcionar melhores condições de vida e de segurança. “É hora de olhar com muito cuidado para as margens dos rios, as áreas de preservação e os topos de morro. Muitas cidades não têm mais para onde crescer, e o que resta são esses espaços, mas eles não podem ser ocupados. Eles são importantes para a manutenção da qualidade de vida das nossas cidades”, finaliza.

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