No país

Repasse de fita de glicemia passa a ser restrito em BH

Diminuição de verba e insumos também gera ‘efeito cascata’ em outras capitais

Por Raquel Sodré
Publicado em 08 de julho de 2016 | 03:00
 
 
 
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A Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) de Belo Horizonte emitiu nesta semana uma nota técnica que restringe a distribuição de fitas de glicemia, usadas por diabéticos para controlar a doença. As fitas passaram a ser distribuídas somente a crianças menores de 12 anos, gestantes e pacientes que fazem hemodiálise.

A justificativa para a restrição é a falta de insumos, que deveriam ter sido enviados pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG). “Em março, a SES disponibilizou o recurso de R$ 1,2 milhão para a SMSA e informou que não fornecerá o insumo no segundo semestre de 2016. O recurso repassado naquela época possibilitou a aquisição de 3,4 milhões de tiras de glicemia, quantidade insuficiente para atender a demanda anual da Rede SUS-BH”, esclareceu a SMSA.

Questionada, a SES-MG declarou, também por nota, que o fornecimento está regular. “A quantia enviada correspondeu a todo o valor investido em tiras reagentes para o município no ano de 2016”, garante o texto.

A SMSA-BH, contudo, esclarece que R$ 1,2 milhão foi o orçamento disponibilizado pela SES-MG para a compra desses insumos, e o órgão municipal utilizou inteiramente a quantia. No entanto, o total de fitas compradas ainda é insuficiente para o número de pacientes insulinodependentes da cidade.

A SMSA/BH declara ter uma demanda real de aproximadamente 1 milhão de fitas por mês. Assim, as 3,4 milhões de unidades compradas pela SES-MG foram suficientes para pouco mais de três meses.

Para quem precisa das fitas, a realidade é dura e cheia de incertezas. De acordo com a profissional de relações públicas Carol Freitas, 37, o fornecimento das fitas na rede pública está irregular desde janeiro do ano passado. “Moro na região Oeste de Belo Horizonte. Fiz um levantamento dos 18 postos de saúde da região e, até abril, nenhum deles tinha fitas. A SMSA sempre me falava: ‘Estamos regularizando (a situação)’, e não resolviam nunca”, critica Carol.

Diagnosticada com diabetes ainda bebê, ela conta que usa de seis a oito fitas de glicemia por dia, e comprá-las na rede privada de saúde é inviável. “Cada caixa de fitas vem com 50 unidades e custa entre R$ 100 e R$ 110. Uso quatro caixas por mês”, revela. Atualmente, Carol está se arriscando com algumas fitas que estão com a validade vencida, que ela recebeu como doação de amigos de outros Estados.

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Repúdio. A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) em Minas Gerais se declarou surpresa com a decisão da SMSA-BH, já que as fitas têm papel importante na medição da quantidade necessária de insulina que cada paciente precisa.

“O uso de insulina salva a vida das pessoas com diabetes, mas envolve também risco. Em excesso, aumenta muito o perigo de complicações crônicas da doença. Em glicemias muito baixas (hipoglicemias), podem ter consequências agudas gravíssimas, como perda de consciência, crises convulsivas e acidentes automobilísticos, além de eventos cardiovasculares graves como arritmia cardíaca, infarto agudo do miocárdio ou mesmo acidente vascular cerebral (AVC)”, declarou a Sbem em nota à imprensa.

“Essa medida representa um prejuízo enorme, que poderá representar o descontrole de pacientes que já estavam com a doença controlada”, complementa o presidente da sociedade, Márcio Lauria.

Tratamento

Moderno. A alternativa mais atual para o tratamento do diabetes é a bomba de insulina, que é implantada no abdômen do paciente. Ela faz as medições e dispensa a insulina automaticamente.

Alternativas

SUS. A SMSA sugere que os pacientes que não receberão mais as fitas se dirijam a unidades básicas de saúde para fazer suas medições. Essa medida, no entanto, pode ser inviável, já que certos pacientes fazem a medição até 12 vezes por dia.

Não é gratuito. Está para ser lançado no Brasil o equipamento Libre, um sensor que é colocado no braço e cujo leitor faz as medições da glicose. O kit custa R$ 599 e cada sensor, que dura duas semanas, custa R$ 240.

Em Maceió, falta atinge todos os itens

Os recursos para compra de insumos para diabéticos são repassados pelo Ministério da Saúde para os Estados que, por sua vez, os destinam aos municípios. No país, cidades como Maceió (AL), Petrolina (PE) e Brasília (DF), somente para citar algumas, passam por situação semelhante à de Belo Horizonte, com restrição para a distribuição de fitas reagentes.

O pior cenário é em Maceió, onde pacientes com diabetes e seus familiares realizaram, nessa quarta-feira (6), um protesto em frente à Secretaria de Estado da Saúde (Sesau). Lá, além das fitas de insulina, faltam a insulina lantus e insumos para bombas de insulina, que já deveriam ter sido entregues desde novembro de 2015. “O custo médio para uma criança que não utiliza a bomba é de R$ 1.300 por mês. Já para as que usam a bomba, esse valor sobe para R$ 2.400”, diz Cícero dos Santos, pai de uma garota diabética. (RS)

Leia a íntegra da nota da SMSA enviada à reportagem nesta sexta-feira:

1.    A Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Saúde – SMSA, esclarece que as fitas de glicemia são fornecidas ao município pela Secretaria Estadual de Saúde – SES;
2.    Para garantir o abastecimento das tiras de glicemia para a população, a SMSA já iniciou o processo de compra em caráter emergencial, para complementar o quantitativo fornecido pela SES, visto que o repasse realizado pelo governo do estado é insuficiente para atender à demanda da população de Belo Horizonte. A previsão é que no início de agosto a situação seja regularizada;
3.    O repasse das tiras de glicemia pela SES é realizado trimestralmente.  Entretanto, em 2016, a SMSA recebeu só em abril, da SES, o primeiro repasse referente às tiras, no valor de R$1.226.308,50, que permitiu a aquisição de 3.406.400 tiras de glicemia. O consumo médio mensal em Belo Horizonte é de aproximadamente 1 milhão de fitas;
4.    É importante informar, ainda, que os insumos para diabetes têm sofrido reajustes. Em 2015, a média do valor unitário da tira de glicemia era de R$ 0,19. Em 2016, o valor subiu para R$ 0,36, em média. Apesar do aumento no valor do insumo, não houve reajuste no repasse de recurso disponibilizado pela SES;
5.    As fitas foram entregues em 15/04/16 e disponibilizadas durante os meses de abril, maio e junho;
6.    No final de junho, a SMSA encaminhou à SES nova programação para garantir o abastecimento para mais três meses. Entretanto, a SES informou que o repasse efetuado em março correspondia ao recurso total anual previsto para o município;
7.     A Prefeitura de Belo Horizonte repassa um valor superior estabelecido pela legislação federal em relação a assistência farmacêutica. O valor para assistência farmacêutica, considerando repasses do governo federal e estadual – e os recursos estabelecidos na legislação de responsabilidade do município - está na ordem de R$ 9,83 por pessoa/por ano. Para garantir o atendimento para a população, a PBH investe anualmente, por pessoa, cerca de R$ 26. Este complemento é feito com recursos próprios da Prefeitura.

SES-MG afirma que repassou 100% do que foi pedido

Em nota enviada a O TEMPO no fim da tarde desta sexta-feira, a Secretaria de Estado de Saúde informou que "cumpriu integralmente todos os valores solicitados pelas prefeituras e disponibilizou as tiras reagentes aos municípios para que os mesmos pudessem distribui-las aos usuários. A pasta reforçou que fez o repasse de 100% do que foi pedido.

"Para a Prefeitura de Belo Horizonte, a Secretaria antecipou 100% dos quantitativos solicitados pelo município, referentes a 2016, para que fossem distribuídos ao longo de todo o ano. Considerando que o município é o responsável pela gestão de estoque dos itens a serem disponibilizados aos usuários do SUS, cabe à Prefeitura de Belo Horizonte o planejamento adequado da distribuição desses itens para que não falte aos usuários", diz a nota.

Atualizada às 18h37.

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