Tragédia

Sobe para 11 o número de mortos em desabamento de prédio em Pernambuco

Mais três mortes foram confirmadas, neste sábado (8), após o desmoronamento do bloco D7 do conjunto Beira Mar, em Recife (Pernambuco)


Publicado em 08 de julho de 2023 | 10:48
 
 
 
normal

Mais três mortes foram confirmadas, neste sábado (8), após o desmoronamento do bloco D7 do conjunto Beira Mar, em Recife (Pernambuco). Entre as vítimas identificadas, está Eloá Soares da Silva, uma jovem de 21 anos. O Corpo de Bombeiros e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) confirmaram ao G1 a informação de que um casal também foi encontrado sem vida. No entanto, até o momento, os nomes e as idades do casal não foram divulgados.

Os bombeiros foram acionados por volta das 6h30 dessa sexta-feira (7/7). Cerca de 50 profissionais participaram das buscas, com ajuda de voluntários. Um deles, Vinicius Silva, 24, é sobrinho da vítima de 43 anos, que ele identificou como Maria Tereza. Segundo ele, a tia morava no terceiro andar do edifício com dois filhos.

"Ela estava toda encoberta, a gente cavou e tirou o escombro. Tive que me segurar porque a gente tem que encontrar mais corpos", disse Vinicius. Ele contou também que a tia estava dormindo quando houve o desabamento.

O aposentado Marcos Antônio mora há 20 anos no condomínio. Ele reside em outro bloco, que não desabou, e disse que ouviu um estrondo por volta das 6h30. "Ouvi um barulho forte, mas não pensei que fosse um desabamento", relata. Ele afirma que soube primeiro pelos telejornais do acontecimento. "Vi primeiro na TV e depois que saí para ver que tinha sido com um prédio aqui do residencial."

Daiane Souza tem quatro parentes desaparecidos nos escombros e acompanhava as buscas aflita com uma amiga no local. "Uma tia e três primos meus estão nos escombros. Outra prima conseguiu sair cedo antes de desabar", contou à reportagem, pela manhã.

Daiane não mora no condomínio, mas reside em local próximo ao bairro do Janga, em Paulista. "Assim que soube, vim logo para cá acompanhar."
A região metropolitana do Recife é atingida por chuvas intensas desde a noite de quinta (6). Por isso, o Corpo de Bombeiros teve dificuldade em alguns momentos para seguir com as buscas.

"Está chovendo agora e também choveu durante a madrugada. Acreditamos que isso possa ter contribuído [para o desabamento]", disse André Gustavo Carneiro Leão, secretário de Segurança e Defesa Civil.

Após a confirmação das mortes, o Corpo de Bombeiros dizia ter esperança de encontrar pessoas com vida. "Os bolsões de ar [em meio aos escombros] fazem com que a gente encontre vítimas que estejam nos escombros", afirmou o coronel Robson Roberto, que coordena as ações da corporação.

O edifício que desabou parcialmente é do tipo "caixão", com térreo e três andares. Em cada pavimento, são quatro apartamentos. Construídos em larga escala nos anos de 1970 na região metropolitana do Recife, esses prédios têm como principal característica a ausência de colunas e pilares de concreto armado, aço ou outros materiais que funcionam como uma espécie de esqueleto estruturante. São as paredes de alvenaria, blocos ou tijolos ligados por argamassa, as responsáveis por suportar o edifício.

A Prefeitura de Paulista disse, em nota, que "o imóvel estava interditado desde o ano de 2010 e foi reocupado por grupos de sem-teto". A gestão municipal, no entanto, não respondeu há quanto tempo as famílias ocupavam o imóvel irregularmente nem o motivo da interdição.

"O panorama não é diferente de outras cidades da RMR (Região Metropolitana do Recife). A situação na RMR é crônica, com imóveis interditados e outros que ruíram", afirmou a prefeitura em nota.

A prefeitura também declarou que já solicitou ao governo federal "uma solução definitiva por parte da Caixa Econômica Federal e das seguradoras responsáveis pelos prédios". A Caixa afirma que não tem relação com o imóvel.

"A gente já tinha alertado para isso há muito tempo, mais de dez anos que os prédios foram desativados. Cobrar agora da seguradora a responsabilidade. Inclusive, aqui no Janga, a gente já desativou um prédio que também estava nessa mesma situação, quando a Justiça nos ajudou a derrubar o prédio", disse o prefeito Yves Ribeiro (MDB), em um pronunciamento em uma rede social.

"É preciso esse grito de alerta para que essa seguradora tome providências e outras pessoas não venham a morrer e outras cidades não venham a passar por essa tragédia que Paulista está passando", completou.
A reportagem questionou qual é a seguradora e a relação dela com o conjunto habitacional, mas não recebeu resposta até publicação da reportagem.

A advogada Janielly Nunes, que defende os proprietários dos apartamentos interditados, esteve no local dos desabamentos e diz que, desde 2009, os donos dos imóveis entraram na Justiça para receber auxílio para aluguel.

"Os processos foram ajuizados em 2009. Os proprietários já recebem aluguel para residir em outros imóveis. A medida que a gente vai tomar agora é [reforçar pedido para] que os outros seis que ainda não recebem a Justiça possam receber."

Mais de 5.000 prédios no Grande Recife são do tipo "caixão"; diz especialista

Os edifícios do tipo caixão são oficialmente chamados de prédios de alvenaria estrutural. "Não é nenhum crime construir com essa técnica", afirma o engenheiro-civil Gibson Queiroz, membro do Ibape-PE (Instituto Brasideliro de Avaliações e Perícias de Engenharia de Pernambuco.

O risco de desabamento existe, porém, quando as normas de segurança para essas construções são desrespeitadas. O descumprimento mais comum é a substituição dos blocos chamados de estruturais por outros, mais baratos, adequados apenas para a vedação.

Com mais de 40 anos de experiência em vistorias em edifícios desse tipo, Queiroz afirma que mais de 5.000 prédios precisariam ser demolidos na Grande Recife caso todos aqueles construídos fora da norma fossem condenados.

Para evitar um agravamento do déficit habitacional e novas tragédias, a solução é a avaliação técnica desses prédios. Algo trabalhoso e que poucas empresas ou profissionais da engenharia gostam de fazer, pois atestar a segurança desses prédios é assumir um risco elevado, ele explica.

Por meio de nota, SulAmérica lamenta desabamento. Leia:

"A SulAmérica lamenta profundamente o ocorrido no Conjunto Beira-Mar, em Paulista (PE). 

 

A empresa explica que não é proprietária ou seguradora do prédio. Sua participação, assim como de diversas outras seguradoras, foi como prestadora de serviços na operação de apólice pública do Seguro Habitacional do Sistema Financeiro de Habitação (SH-SFH). Esse seguro habitacional é suportado pelo governo federal, por meio do Fundo de Compensação e Variações Salarial (FCVS), administrado desde o ano 2000 pela Caixa Econômica Federal (Caixa), responsável pelas questões legais relacionadas a esse seguro habitacional. 

O Supremo Tribunal Federal concluiu, em junho de 2020, pela responsabilidade da Caixa pelas apólices públicas do SH-SFH, decisão essa que é  definitiva e vinculante, dada a sua repercussão geral.

Apesar da conclusão do STF, há decisões de outras instâncias judiciais que determinam que a empresa preste serviços de guarda e vigilância de alguns desses imóveis, além do pagamento de aluguel a moradores desalojados. A empresa tem cumprido integralmente as decisões, apesar de não concordar com a atribuição de responsabilidade pelo seguro público.

A seguradora não tem poder para retirar os ocupantes dos imóveis ou para demolir os prédios. Essa prerrogativa é exclusiva das autoridades públicas, conforme correto posicionamento do Ministério Público, confirmado por decisão judicial assim assentada: “que os municípios tomem as devidas precauções para a proteção do patrimônio e vida das pessoas em casos que constatem riscos” (ação civil pública 0008987-05.2005.4.05.8300). 
 
Desde 2011, a SulAmérica fez vários alertas sobre a situação de risco do bloco D7 (torres A e B) do Conjunto Beira-Mar, inclusive tendo relatado isso no processo judicial em curso, situação confirmada pela Defesa Civil. 

É importante ressaltar que, apenas para atender às melhores práticas de governança, a SulAmérica decidiu proceder a vistorias, dentre as quais, a visita recente de engenheiro ao aludido conjunto. Ressalta-se que não se teve acesso à torre B, porque o imóvel estava ocupado irregularmente."

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!