A médica Claudia Soares Alves, presa por suspeita de sequestrar uma recém-nascida no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU), no Triângulo Mineiro, driblou portaria e profissionais de vigilância, colocou uma bebê dentro de uma mochila e foi acompanhada até a saída do edifício com tranquilidade, conforme boletim de ocorrência. Esse é um retrato de falhas no controle interno no sistema de saúde, conforme o especialista em segurança pública Jorge Tassi. Ele avalia que o crime deve aumentar a sensação de perigo nas instituições. O HC-UFU abriu um processo administrativo para apurar possíveis responsabilidades no sequestro. 

“A insegurança nesses ambientes é total. Os pais devem sim, infelizmente, se manter vigilantes com os filhos o tempo inteiro. Esse caso vai aumentar a desconfiança no sistema, o que é resultado da falta de transparência quanto aos métodos de segurança nos hospitais. Qual o protocolo? Se isso fosse de amplo conhecimento, não abriria espaço para quem desafia o sistema”, pondera Tassi. De fato, a gerente de Atenção à Saúde do HC de Uberlândia publicou um vídeo admitindo que o processo de segurança precisa melhorar. 

A gerente Liliane Passos afirmou que a unidade deu início a um processo de aprimoramento do controle de acesso ao hospital para impedir que casos semelhantes ocorram. "Ressalto o nosso compromisso com o aprimoramento dos processos de trabalho, e, especialmente, com os controles de acesso no nosso hospital, assim vamos garantir que outros casos como esse não voltem a acontecer", disse no comunicado. 

Não é um caso fora da curva 

O especialista Jorge Tassi afirma que casos de entradas e saídas irregulares em hospitais públicos não são raros, mas, em maioria, acontecem com gravidade reduzida quando comparados a um sequestro de recém-nascido. Por exemplo, o porte de drogas ou visitas não autorizadas de familiares. “Não é um caso de loucura, isso acontece porque há brecha para isso”, reforça. “É importante entender que o hospital é uma estrutura como qualquer outra, que funciona com regras de acesso. As normas, no entanto, têm falhas e não existem o suficiente para cessar todas as possibilidades de fraude”, analisa.

Sobre a versão de um dos vigilantes do HC de Uberlândia, conforme o registro da ocorrência, que informou não ter autorização para fazer revistas pessoais, Tassi afirma que os vigilantes, como parte da instituição hospitalar, precisam agir com direitos de polícia administrativa. “Isso é poder administrativo, ele existe para confirmar que as normas daquela instituição serão cumpridas. Controle de entrada e saída é uma norma, e fiscalizar é direito. É possível que ainda falte regimento para tratar de todas as situações suspeitas, mas um vigilante com poder administrativo poderia tomar esse tipo de decisão dentro desse espaço de controle. É essencial para resolver certas questões”, analisa. 

O que diz o Ministério da Saúde?

O Ministério da Saúde, provocado, informou que é responsável pelo Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), instituído pela Portaria nº 529/13. O protocolo qualifica o cuidado assistencial em saúde e traz normas de identificação correta do paciente, “contribuindo diretamente para a sua segurança”. Segundo a pasta, no entanto, o programa “não se relaciona diretamente com políticas de segurança institucionais que garantem o acesso e fluxo de pessoas no ambiente hospitalar”. 
 
“Sobre requisitos de boas práticas de funcionamento para os serviços de saúde, é necessário buscar esclarecimentos com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)”, acrescentou. A reportagem demandou a Anvisa. Em caso de retorno, essa matéria será atualizada. 

A reportagem demandou, também, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que administradora o hospital em Uberlândia, para conhecer o protocolo de segurança da unidade. Em caso de resposta, essa matéria será atualizada. 

Assista ao vídeo:

O que diz o HC de Uberlândia? 

"O HC-UFU informa que por volta da meia noite uma mulher trajada como profissional de saúde, portando crachá institucional, entrou na maternidade e evadiu com um bebê recém-nascido do sexo feminino.

Poucos instantes após o fato, a equipe do hospital acionou a Polícia Militar de Uberlândia e cedeu as imagens das câmeras de segurança requisitadas pela corporação.

O HC já iniciou apuração interna de todas as circunstâncias do caso e está colaborando com as investigações. A instituição está à inteira disposição das autoridades e da família para a breve solução do caso."

O que diz a Polícia Civil? 

"A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) informa que, na noite de ontem (23/7), em um hospital situado no município de Uberlândia, uma mulher de 42 anos, que se passou por médica pediatra, entrou no quarto, onde estava uma recém-nascida, levando-a do quarto da mãe. Em seguida, a suspeita entrou em um banheiro, colocou a bebê em uma mochila e saiu do hospital.

Em operação conjunta da PCMG com a PCGO foram realizadas diligências e, em menos de 24h, a bebê foi localizada no município de Itumbiara GO, na manhã de hoje (24/7), e a suspeita do crime foi presa pela Polícia Civil de Goiás.

Outras informações poderão ser prestadas com o avanço dos trabalhos de polícia judiciária."