Um gesto de solidariedade que atravessa gerações voltou a alimentar centenas de pessoas em Belo Horizonte nesta Sexta-Feira da Paixão (18/04). Pelo 32º ano consecutivo, a tradicional entrega gratuita de peixes reuniu centenas de pessoas na Praça do Peixe, no bairro Bonfim, região Noroeste da capital. As 7h da manhã, a fila que começou na Praça do Peixe já chegava à metade da Avenida Pedro II.
A iniciativa, que se tornou um símbolo da Semana Santa na cidade, vai muito além do alimento: para muitos, é a única oportunidade de realizar uma refeição no dia que marca a paixão de Cristo.
Entre os primeiros da fila, estava Maurício de Sousa, de 50 anos, ajudante de pedreiro. Ele chegou ao local ainda na madrugada do dia anterior, acompanhado da família. “A fila é muito grande. Todo ano a gente é os primeiros. Eu cheguei aqui duas da manhã de ontem (17)”, contou.
Mesmo diante da espera prolongada, ele destacou a rede de solidariedade que se forma no local. “Graças a Deus, a doação (de comida e água) chega aqui na porta pra gente. Tem marmitex, água, às vezes café, suco”, relatou.
Maurício comemorou a chance de preparar o prato que tanto desejava. “Eu tava com vontade de comer peixe frito é vou comer”, disse, com um sorriso no rosto.
Além do alimento
Afonso Teixeira, que cresceu na zona rural, carrega consigo um ensinamento que aprendeu ainda criança: caridade. De acordo com ele, esse é o motivo de realizar a ação todos os anos. “Eu morava em fazenda, e aprendi que naquele dia já não se vendia o leite. Tirava o leite pra doar”, contou.
A quantidade de peixe distribuída não é divulgada, por uma razão muito clara. “A gente não fala de quantidade, porque senão fica fácil pra pessoa saber quanto que foi de dinheiro. Eles podem pegar um quilo, multiplicar pelo preço que tá nas peixarias e já vai falar em dinheiro. E a intenção aqui não é falar em dinheiro, é falar em doação.”
Para Afonso, a motivação principal é espiritual. A entrega de peixes vai além do alimento. É um ato de fé e uma forma de retribuição. “ Porque o lado de lá (céu) a moeda que a gente leva, é o bem que você fez aqui.”
A reportagem viu que muitos disseram que o único peixe que comem no ano é o que recebem aqui. “Meu coração se enche de alegria com o ‘Deus que ajude’. É uma moeda de pagamento que não tem explicação. Esse ‘Deus que ajude’, que vem dessa pessoa pobre, necessitada, que sai lá de dentro do coração, tem nada igual não”, comentou o empresário, com orgulho.