Racismo

'Africanos possuem apetite sexual maior': fala de professor da UFMG é denunciada

O docente dá aulas de sociologia e foi alvo de cartazes de protesto dos alunos e de nota de repúdio do Centro Acadêmico

Por José Vítor Camilo
Publicado em 11 de julho de 2023 | 13:02
 
 
 
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Um professor de sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi denunciado nos últimos dias por afirmações racistas que teriam ocorrido em sala de aula. "Africanos têm apetite sexual maior" e "Alunos 'índios' nem a nossa língua falam" foram algumas das falas "problemáticas" do docente que foram repudiadas nos últimos dias pelo Centro Acadêmico Lélia Gonzalez de Antropologia e Arqueologia (Calz) da universidade.

Revoltados com as afirmações, alunos da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) resolveram espalhar cartazes no prédio da instituição com algumas das afirmações preconceituosas que o professor teria feito.

"Os africanos possuem um apetite sexual maior, por isso o contingente populacional é tão grande" e "Nós, professores, temos que decidir se jubilamos (expulsamos) esses alunos 'índios' porque nem nossa língua eles falam", diziam os cartazes afixados.

A reportagem de O TEMPO procurou a assessoria de imprensa da UFMG, que informou apenas que, até o momento, nenhuma denúncia formal contra o professor foi recebida pela Ouvidoria da universidade. Já uma fonte do Centro Acadêmico informou que a denúncia foi formalizada na manhã desta terça-feira (11 de julho).

Mais tarde, a universidade enviou uma nota afirmando que recebeu a denúncia na tarde de terça, por meio de sua Ouvidoria. "A demanda será encaminhada à Diretoria da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH) para que o processo de apuração aconteça e as medidas disciplinares possam ser tomadas", disse.

Por fim, a UFMG disse repudiar toda "forma de discriminação" e garantiu estar comprometida com a promoção dos esclarecimentos dos fatos, "com o devido rigor processual".

Centro Acadêmico repudia falas

Por meio de uma nota de repúdio, o Calz lamentou o que chamou de "declarações e práticas racistas" do professor de sociologia. "(Elas) têm sido prejudiciais por serem incompatíveis com os princípios de igualdade, diversidade e inclusão que devem nortear o ambiente educacional", diz o texto.

"O papel do professor é orientar os alunos na construção do conhecimento, estimulando o pensamento crítico e a reflexão, mas jamais propagar discursos de ódio ou perpetuar ideologias preconceituosas. Aos estudantes que foram afetados pelas palavras racistas e preconceituosas do professor, expressamos nossa solidariedade e apoio. Vocês não estão sozinhos, e estamos aqui para lutar ao lado de vocês pela justiça e pelo respeito", continua o Centro Acadêmico.

Confira a nota de repúdio da íntegra:

"Nós do CA Lélia Gonzalez vimos por meio desta nota expressar nosso veemente repúdio às declarações e práticas racistas de professor de sociologia, que têm sido prejudiciais por serem incompatíveis com os princípios de igualdade, diversidade e inclusão que devem nortear o ambiente educacional.

O papel do professor é orientar os alunos na construção do conhecimento, estimulando o pensamento crítico e a reflexão mas jamais propagar discursos de ódio ou perpetuar ideologias preconceituosas.

Aos estudantes que foram afetados pelas palavras racistas e preconceituosas do professor, expressamos nossa solidariedade e apoio. Vocês não estão sozinhos, e estamos aqui para lutar ao lado de vocês pela justiça e pelo respeito.

A universidade pública, ao longo de um extenso período, foi concebida e estruturada por brancos para brancos, ignorando a diversidade racial e étnica. Foi somente em 2012, com a implementação de politicas de ações afirmativas, que começou a ocorrer uma mudança significativa nesse cenário quase exclusivamente eurocêntrico dentro das instituições de ensino, permitindo, pela primeira vez, a entrada de estudantes negros e indígenas.

No entanto, essa transformação desencadeou uma sensação de revolta naqueles que sempre tiveram acesso privilegiado a esses espaços. Sentiram-se invadidos por aquela gente que veio da mata e da senzala, como se estivessem usurpando lugares que não foram destinados a elus. Indignados, recorreram ao racismo em todas as suas formas: sistemática, institucional, recreativa e até mesmo científica, na tentativa de causar medo e intimidação. Porém, esqueceram-se de que essas pessoas teimosas têm resistido há 523 anos a processos de escravidão, apagamento, genocídio e aquilo que Achille Mbembe chamou de necropolítica.

Por isso, eu afirmo a vocês, sinhá e sinhô, que é hora de se acostumarem com a nossa presença, pois viemos para ficar. Contaremos "a história que a história não conta", pois não aceitaremos mais a exclusão e a marginalização. Não permitiremos a construção de um Brasil sem nós."

Atualizada às 10h35 do dia 12 de julho de 2023

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