Um professor de sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi denunciado nos últimos dias por afirmações racistas que teriam ocorrido em sala de aula. "Africanos têm apetite sexual maior" e "Alunos 'índios' nem a nossa língua falam" foram algumas das falas "problemáticas" do docente que foram repudiadas nos últimos dias pelo Centro Acadêmico Lélia Gonzalez de Antropologia e Arqueologia (Calz) da universidade.
Revoltados com as afirmações, alunos da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) resolveram espalhar cartazes no prédio da instituição com algumas das afirmações preconceituosas que o professor teria feito.
"Os africanos possuem um apetite sexual maior, por isso o contingente populacional é tão grande" e "Nós, professores, temos que decidir se jubilamos (expulsamos) esses alunos 'índios' porque nem nossa língua eles falam", diziam os cartazes afixados.
A reportagem de O TEMPO procurou a assessoria de imprensa da UFMG, que informou apenas que, até o momento, nenhuma denúncia formal contra o professor foi recebida pela Ouvidoria da universidade. Já uma fonte do Centro Acadêmico informou que a denúncia foi formalizada na manhã desta terça-feira (11 de julho).
Mais tarde, a universidade enviou uma nota afirmando que recebeu a denúncia na tarde de terça, por meio de sua Ouvidoria. "A demanda será encaminhada à Diretoria da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH) para que o processo de apuração aconteça e as medidas disciplinares possam ser tomadas", disse.
Por fim, a UFMG disse repudiar toda "forma de discriminação" e garantiu estar comprometida com a promoção dos esclarecimentos dos fatos, "com o devido rigor processual".
Por meio de uma nota de repúdio, o Calz lamentou o que chamou de "declarações e práticas racistas" do professor de sociologia. "(Elas) têm sido prejudiciais por serem incompatíveis com os princípios de igualdade, diversidade e inclusão que devem nortear o ambiente educacional", diz o texto.
"O papel do professor é orientar os alunos na construção do conhecimento, estimulando o pensamento crítico e a reflexão, mas jamais propagar discursos de ódio ou perpetuar ideologias preconceituosas. Aos estudantes que foram afetados pelas palavras racistas e preconceituosas do professor, expressamos nossa solidariedade e apoio. Vocês não estão sozinhos, e estamos aqui para lutar ao lado de vocês pela justiça e pelo respeito", continua o Centro Acadêmico.
Confira a nota de repúdio da íntegra:
"Nós do CA Lélia Gonzalez vimos por meio desta nota expressar nosso veemente repúdio às declarações e práticas racistas de professor de sociologia, que têm sido prejudiciais por serem incompatíveis com os princípios de igualdade, diversidade e inclusão que devem nortear o ambiente educacional.
O papel do professor é orientar os alunos na construção do conhecimento, estimulando o pensamento crítico e a reflexão mas jamais propagar discursos de ódio ou perpetuar ideologias preconceituosas.
Aos estudantes que foram afetados pelas palavras racistas e preconceituosas do professor, expressamos nossa solidariedade e apoio. Vocês não estão sozinhos, e estamos aqui para lutar ao lado de vocês pela justiça e pelo respeito.
A universidade pública, ao longo de um extenso período, foi concebida e estruturada por brancos para brancos, ignorando a diversidade racial e étnica. Foi somente em 2012, com a implementação de politicas de ações afirmativas, que começou a ocorrer uma mudança significativa nesse cenário quase exclusivamente eurocêntrico dentro das instituições de ensino, permitindo, pela primeira vez, a entrada de estudantes negros e indígenas.
No entanto, essa transformação desencadeou uma sensação de revolta naqueles que sempre tiveram acesso privilegiado a esses espaços. Sentiram-se invadidos por aquela gente que veio da mata e da senzala, como se estivessem usurpando lugares que não foram destinados a elus. Indignados, recorreram ao racismo em todas as suas formas: sistemática, institucional, recreativa e até mesmo científica, na tentativa de causar medo e intimidação. Porém, esqueceram-se de que essas pessoas teimosas têm resistido há 523 anos a processos de escravidão, apagamento, genocídio e aquilo que Achille Mbembe chamou de necropolítica.
Por isso, eu afirmo a vocês, sinhá e sinhô, que é hora de se acostumarem com a nossa presença, pois viemos para ficar. Contaremos "a história que a história não conta", pois não aceitaremos mais a exclusão e a marginalização. Não permitiremos a construção de um Brasil sem nós."
Atualizada às 10h35 do dia 12 de julho de 2023