Os problemas provocados pela pandemia do coronavírus e a interrupção de diversas atividades atingiram em cheio as escolas privadas da educação básica nesta semana. Após uma norma técnica que recomenda a suspensão dos contratos para o ensino infantil e desconto mínimo de 29,01% para as demais instituições em todo o Estado, o Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG) não recuou e começou uma queda de braço com o órgão.
De acordo com a entidade, caso as determinações sejam cumpridas, as creches e pré-escolas de Minas podem fechar as portas e deixarem 217 mil alunos sem matrícula neste ano. Há ainda a possibilidade de mais de 50 mil profissionais da educação serem demitidos. "Muitas diretoras me ligaram e demonstraram vontade de encerrar as atividades", disse a presidente do Sinep-MG, Zuleica Reis.
A dirigente enfatizou ainda que as instituições se esforçam para encaminhar materiais educativos online aos pais e que as aulas serão repostas após o fim das medidas de isolamento social provocadas pelo coronavírus.
"Estamos sem entender o motivo da interferência do Procon, agora todos os familiares pressionam a escola frente a essa recomendação. As instituições não são obrigadas a acatar, não é uma lei. E quem acatar acaba fechando, demitindo os professores", argumenta.
Apesar de garantir que as escolas privadas prestam apoio à família dos alunos, muitos pais se dizem indignados com as instituições. É o caso da Tatiana Milabranches, 43, que tem duas filhas – uma de 12 e outra 2 anos – em uma escola particular de Belo Horizonte. Além da falta de qualidade das plataformas digitais utilizadas para a continuidade do ensino, a advogada conta que as escolas já tiveram custos operacionais reduzidos.
"Estamos tentando há quase duas semanas a negociação e agora nem e-mail respondem mais. Chegaram a mandar vídeos de Youtube que nem dos próprios professores são, além de cobrar serviços extracurriculares, como lanche coletivo. Nem o material didático do ano conseguiram entregar", enfatiza.
O marido, Alexandre Miranda, 50, reforça as críticas. "O que foi contratado foram as aulas presenciais. A escola tinha um custo com essa estrutura que agora não tem mais. E como se não bastasse isso, a qualidade do ensino a distância é muito inferior. Há famílias com mais de uma criança em casa e que não tem condições e nem estrutura para que todos consigam assistir aulas online", complementa.
Sindicato recomenda negociar caso a caso
Já a presidente do Sinap, Zuleica Reis, lembra que as escolas entendem que muitas famílias perderam a fonte de renda, a exemplo de comerciantes e profissionais autônomos que tiveram suas atividades afetadas pelo isolamento social. Porém, ela garante que as escolas não têm condições de conceder o desconto de quase 30% na mensalidade de março para todos os alunos – desacatando a recomendação do Procon.
"Temos uma variedade de situações e não é possível tratar todos da mesma forma, há muitos pais que continuam com seus recebimentos normais. A orientação é que cada escola abra um canal de atendimento e diálogo para analisar caso a caso, mas é importante que isso seja feito pessoalmente", frisa.
Escolas já concedem descontos
Antes da recomendação do Procon, parte das escolas de Belo Horizonte já havia determinado a concessão de descontos nas mensalidades. É o caso da Fundação Torino, no Belvedere, região Centro-Sul da capital, que reduziu em 80% as cobranças mensais para alunos dos maternais 1 e 2, além de outros 30% para os demais estudantes.
No bairro Buritis, região Oeste da capital, outra instituição de ensino médio também acatou o pedido dos pais, que não serão mais obrigados a pagar o valor integral da mensalidade enquanto durar o isolamento social. Depois, esse valor será cobrado com a normalização das aulas e da carga horária obrigatória.
Procon mantém recomendações
Mesmo com dúvidas geradas pela norma técnica, o Procon informou nesta quarta que todas as recomendações estão mantidas. De acordo com o promotor de Defesa do Consumidor, Paulo de Tarso Morais, as escolas que não acatarem a norma, os pais podem ingressar com ações judiciais para pedir o abatimento da mensalidade ou a suspensão do contrato para a educação infantil. O magistrado conta também que o Ministério Público de Minas Gerais pode entrar com uma ação na Justiça para que as determinações sejam cumpridas.
"Há uma interpretação equivocada pelas escolas e o sindicato na análise da norma técnica. Houve o decreto do isolamento social e, entre os dias 23 e 30 de março, ainda não havia nenhuma regulação sobre as aulas remotas. Como falar em prestação de serviço se a deliberação do Conselho Estadual de Educação só saiu no fim do mês?", questiona.
O promotor pede ainda mais transparência das instituições privadas, que devem mostrar, por exemplo, planilhas relacionando os custos das aulas presenciais com a educação a distância para negociar um abatimento nas próximas mensalidades.
"E depois de passado o isolamento social e verificada a possibilidade de reposição das aulas, sem prejuízo para a qualidade do ensino, as escolas terão o direito de recobrar tudo aquilo que descontaram antes", finaliza.