polêmica

Biólogos afirmam que pés apreendidos em Pouso Alegre não são maconha

Mais de 100 plantas foram arrancadas de um lote pela Polícia Militar do Sul de Minas no último dia 24 de novembro; nas redes sociais, várias pessoas se manifestaram após verem reportagens sobre a apreensão

Por JOSÉ VÍTOR CAMILO
Publicado em 15 de dezembro de 2014 | 20:47
 
 
 
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A Cannabis sativa, que no Brasil é mais conhecida como maconha, é a droga ilícita mais consumida em todo o planeta com mais de 177 milhões de usuários de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas, emitido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2012. Apesar disso, muito pouco se sabe sobre a planta, algumas vezes levando até mesmo autoridades a cometerem erros.

No último dia 24 de novembro, em Pouso Alegre, no Sul de Minas Gerais, a Polícia Militar (PM) fez uma apreensão de mais de 100 pés de uma planta que seria maconha e estavam localizados em um lote vago do bairro Faisqueiras. Após a veiculação de fotos em veículos de imprensa, várias pessoas se manifestaram nas redes sociais fazendo brincadeiras sobre a apreensão, indicando que as plantas seriam na verdade de mamona ou mandioca.

Após a repercussão, O TEMPO ouviu o biólogo Pedro Lage Viana, que é doutor em Taxonomia Vegetal, ramo em que se trabalha na identificação de espécies. Segundo ele a planta não é maconha e nem mamona ou mandioca. "Trata-se de uma espécie da família das Euphorbiaceae chamada Astraea lobata (L.) Klotzsch, que é conhecida em algumas localidades como Erva-de-rola ou Sangregão", precisou o especialista.

Ainda conforme o biólogo, uma das várias diferenças entre as plantas de maconha e as apreendidas pela polícia é facilmente identificada. "A maconha tem folha digitada, que é uma folha composta, subdividida em folíolos distintos que saem de um mesmo ponto, como os dedos de uma mão. Já a Erva-de-rola tem folhas lobadas, que é uma folha simples, ou seja, não é subdividida em folíolos, mas apresenta lobos, como a folha do mamão", explicou o especialista.

Viana ficou sabendo da reportagem por meio de um grupo no Facebook chamado DetWeb, que reúne mais de 4.500 pessoas em sua maioria botânicos profissionais e estudantes da flora brasileira. "O objetivo do grupo é a troca de experiências e, também, determinações botânicas por meio de fotografias. Um dos moderadores divulgou essa reportagem e inicialmente gerou muitas brincadeiras, porém, achamos que a situação é extremamente grave, já que revela o despreparo por parte da polícia", explicou.

Os biólogos procuraram a imprensa para se pronunciarem formalmente repudiando o ocorrido e ressaltando a importância da identificação precisa de espécies. "O que nos espanta não é não-profissionais da área errarem isso, mas sim o fato de não procurarem algum botânico taxonomista para confirmarem a identificação da espécie", indagou o biólogo.

Investigação

Procurado pela reportagem, o delegado de Tóxicos de Pouso Alegre, Gilson Baldassari, informou que um laudo técnico feito pela perícia do município havia confirmado o encontro do THC, que é o principal princípio ativo da planta. Ao ser informado sobre especialistas que garantem que a planta apreendida não é a droga, o policial se defendeu.

"Hoje eles estão mexendo nessas coisas igual fazem com alimentos transgênicos. Vai ver que surgiu uma nova espécie de maconha e a gente nem sabe", afirmou Baldassari. A assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que o laudo inicial realmente indica que se trata de maconha. Porém, uma amostra das plantas foi encaminhada para a perícia de constatação em Belo Horizonte, sendo que os resultados ainda não foram devolvidos ao delegado responsável pelo caso.

Após uma nova matéria publicada em um site de notícias em que se afirmava que os laudos periciais confirmavam que a planta se tratava de maconha, um dos especialistas que fazem parte do grupo DetWeb procurou o veículo de imprensa e postou um texto tratando sobre o assunto na rede social.

Na mensagem, o profissional afirma que neste caso o problema não foi além da botânica por ninguém ter sido preso no local. "Mas se o proprietário do terreno fosse encontrado, poderia ser intimado por plantar o que ele nunca plantou. Além disso, quando a polícia informa possuir um laudo que garanta ser a planta Cannabis sativa ele acaba transferindo o ônus da prova ao possível preso, o que poderia ser muito difícil de provar pois as plantas podem ter sido incineradas", diz o texto. 

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