"Eu não morri porque Deus não quis e não era a hora”. O relato é do comentarista esportivo da rádio Super FM 91.7, Lélio Gustavo, de 48 anos, que denuncia o tratamento recebido no Hospital Vera Cruz, administrado pelo plano de saúde Hapvida, em Belo Horizonte. Lélio teve complicações clínicas após ser operado em decorrência de um infarto sofrido em novembro de 2022 e critica a falta de assistência médica que, por pouco, não custou a vida dele. Ele precisou pagar pela continuidade do tratamento no hospital Felício Rocho e o valor ultrapassou a marca de R$ 90 mil.
“Fiquei desnorteado porque pagava (o plano) com o intuito de ter conforto quando precisasse, mas foi pura fantasia. O médico que me operou no Vera Cruz, por exemplo, só teve contato comigo duas vezes, no máximo. Ele, ou alguém da equipe, deveria fazer o acompanhamento diário, igual ocorreu no Felício Rocho — onde ele fez o tratamento particular. É uma impotência. Me entreguei nas mãos de Deus para ele me salvar e me tirar de lá. Triste”, relembra o comentarista esportivo da Super, que afirma ter se sentido sem forças diante de tudo o que sofreu com o plano de saúde, que é pago mensalmente.
A “odisseia”, segundo definido por Lélio, se estendeu pelos últimos dois meses do ano passado. De acordo com o comentarista, foram dias intensos e de luta para tentar garantir um atendimento decente, o que não ocorreu. “Depois do dia 8 de dezembro, pra mim acabou. Papo com o plano de saúde é só na Justiça. Só quero me recuperar. Brincaram com a minha vida”, desabafa o profissional, que durante o tratamento médico precisou acionar a Polícia Militar para conseguir atendimento imediato. A justificativa do hospital Vera Cruz era a falta de médicos, segundo o paciente.
40 dias de sofrimento
O drama vivenciado pelo comentarista da rádio Super durou cerca de 40 dias. “Fui internado no dia 23 de novembro. Cheguei no Vera Cruz com um infarto, me colocaram por dois dias no Centro de Terapia Intensivo (CTI), fiz o pré-cirúrgico e no dia 30 de novembro fui operado”, lembra Lélio Gustavo. Na unidade de saúde, ele colocou quatro pontes de safena. Ainda enquanto estava no CTI, Lélio afirma ter percebido uma demora para ser medicado. Isso foi provado pela mudança de sistema que ocorria no hospital. “Superamos essa parte e depois de ficar no CTI, voltei para o quarto. Só que tive outro problema, pois foi detectado um pequeno AVC que me tirou parte da visão. Cheguei a ficar dois dias sem enxergar”.
A visão do comentarista está retornando aos poucos. Depois de ficar mais de 15 dias hospitalizado, Lélio recebeu alta no dia 8 de dezembro, porém, no mesmo dia ele precisou voltar a ser hospitalizado. “Estava simplesmente com meu tórax todo costurado, mas com vazamento de secreção com sangue. Era tossir que jorrava”, detalha.
Ao retornar para o Hospital Vera Cruz, Lélio não recebeu atendimento médico imediato. A justificativa, na ocasião, era a falta de médicos. O comentarista somente fez exames de sangue e de saturação, além de radiografia. “Voltei para lá às 23h e a moça falou que eu seria atendido às 7h do dia seguinte [9 de dezembro]. Só que nem neste horário foi, mas sim às 9h e, mesmo assim, porque minha esposa chamou a polícia. O médico apareceu na hora”, relembra.
Lélio conta que foi medicado com antibiótico, o curativo que utilizava foi trocado e, depois de receber um atendimento “mais ou menos” do médico, acabou sendo liberado para a casa.
Internação particular
Mesmo estando em casa, Lélio conta que não se sentia bem e que ficava somente “prostrado na cama” sem se alimentar. No dia 12 de dezembro, a família tomou uma atitude. “Tive que decidir entre voltar ao hospital que ignorou o que aconteceu comigo ou buscar uma alternativa. Como me sentia mal, com o coração fraco, a decisão foi buscar o Hospital Felício Rocho”, explica.
O plano de saúde de Lélio não tem convênio com a unidade escolhida, sendo assim, o tratamento aconteceu de maneira particular. “Tive que passar por outra cirurgia. Meu coração estava tapado de tanto líquido e ia parar de bater. Aí já era e não poderia sequer receber uma desfibrilação sem abrir o peito”, comenta.
O tratamento e o acompanhamento médico recebidos no hospital despertaram a atenção de Lélio, visto a diferença, se comparado com os do plano de saúde. “Após a cirurgia de drenar o líquido [do coração], a equipe falou que não iria me mandar para casa”.
Lélio voltou para a casa no último sábado (31), mas antes disso passou por um procedimento no tórax. “Barbaridade” é o termo encontrado pelo comentarista esportivo para definir tudo que passou no Hospital Vera Cruz e pelo plano Hapvida.
Queixas recorrentes
O calvário enfrentado por Lélio devido ao péssimo atendimento do Hapvida, conforme avaliado pelo comentarista, já foi denunciado por outros usuários no site Reclame Aqui. “Três horas para ser atendida por um clínico. O hospital não tem triagem, falta de respeito com pacientes de mais urgência, médicos totalmente despreparados, equipe de enfermagem pequena. Parece que estão ali por obrigação e não estão fazendo o que gostam. Essa não foi a primeira vez que aconteceu tal situação. Uma confusão na chamada de atendimento na hora de ir para a consulta fica chamando a mesma senha por muito tempo”, escreveu um usuário.
No mesmo site, outra usuária questionou a falta de médicos e também de clínicas conveniadas. "Necessito de um neuropediatra mas não consigo marcar. Nenhum telefone está dando certo. Nas clínicas que o aplicativo indica, elas próprias falam que não estão trabalhando com o Hapvida", questionou.
Recuperação
Lélio vem se sentindo bem e se adaptando à nova rotina. Hoje, em casa, ele conta com a ajuda da família e dos amigos. “Hoje sou outra pessoa, graças a Deus. Em vista do que fiquei, clinicamente me sinto melhor. É dar sequência no tratamento, pois o que mais quero é voltar a trabalhar. Estou sentindo falta”, finaliza.
O que diz o Hapvida
Após questionamentos da reportagem de O TEMPO, representantes do plano de saúde Hapvida entraram em contato com a família de Lélio Gustavo durante a manhã desta quarta-feira (4) e se comprometeram a prestar assistência. “Eles me ligaram hoje cedo e eu expliquei tudo o que aconteceu desde o dia 23 de novembro. A representante me pediu um voto de confiança e disse que o plano vai solucionar o ocorrido”, informou Karina Aparecida Batista, mulher do comentarista esportivo.
Por meio de nota, o plano de saúde confirmou o contato com a família. “A empresa informa, também, que já entrou em contato e acolheu a família do paciente, se colocando inteiramente à disposição para qualquer dúvida ou esclarecimento”, disse. O Hapvida também lamentou a situação pela qual o profissional foi submetido durante o tratamento. “A prioridade da empresa é, sempre, oferecer a melhor assistência médica aos clientes. Por isso, a companhia lamenta qualquer intercorrência no atendimento do cliente”, completou.
Para Karina Batista, a expectativa da família é a de que o plano de saúde possa cumprir com o que foi prometido e evitar que tenham uma nova frustração. “A gente espera que resolvam. Eles ficaram de encaminhar a relação de documentos que devem ser repassados”, disse. No entanto, a família se preparando para recorrer à Justiça caso o problema não seja solucionado.
Confira a nota do plano de saúde
"A prioridade da empresa é, sempre, oferecer a melhor assistência médica aos clientes. Por isso, a companhia lamenta qualquer intercorrência no atendimento do cliente. No hospital, desde sua entrada, o paciente recebeu toda assistência médica necessária e nada foi negado durante sua estadia. A empresa informa, também, que já entrou em contato e acolheu a família do paciente, se colocando inteiramente à disposição para qualquer dúvida ou esclarecimento. Desde a aquisição do hospital, a companhia realizou uma série de investimentos em sua estrutura, como ampliação de serviços e de leitos, e trabalha, continuamente, para salvar vidas e prestar um serviço de qualidade".