Polêmica

Kalil defende pedras sob viaduto para evitar depredações

Mas críticos alegam que intenção é expulsar população de rua que vive sob os elevados

Por Letícia Fontes
Publicado em 24 de agosto de 2019 | 20:52
 
 
 
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Dirceu Batista, de 48 anos, mora debaixo do Viaduto Leste, na Lagoinha, há pelo menos sete anos. Nas últimas semanas ele foi surpreendido por pedras pontiagudas no local. Neste sábado (24), sua mãe Luzia Ferreira, de 76 anos, foi o visitar, como faz todos os sábados, levando roupa e comida. O que era para ser uma conversa em família, virou discussão. Dirceu precisou convencer a mãe que ficaria bem.

"Não teve aquele viaduto que também caiu aqui durante a Copa? Não fizemos nada lá. Não cuidam do que precisam cuidar e querem tirar a gente daqui", questiona. "Já estamos acostumados com o que é difícil. Se não ficarmos aqui, vamos para onde? Outra rua?", lamenta o morador de rua.

Neste sábado (24), o prefeito Alexandre Kalil (PSD) defendeu a implantação de pedras embaixo de viadutos do Complexo da Lagoinha, na região Leste de Belo Horizonte. Segundo a prefeitura, o local vem recebendo a instalação de pedregulhos com o objetivo de coibir a queima de fios furtados para a extração de cobre. Críticos, no entanto, argumentam que a medida visa a evitar que moradores em situação de rua permaneçam debaixo dos viadutos.

Segundo o prefeito, o assunto foi tratado pelo Departamento de Obras da prefeitura e não foi avaliado pela Secretaria Municipal de Assistência Social. Mas ele admitiu que o fato de pessoas atearem fogo em objetos debaixo dos viadutos preocupa, porque isso pode comprometer as estruturas dos elevados.

“Aquilo põe a população de Belo Horizonte em risco, aquilo derruba viaduto. Quando um viaduto daquele cair na cabeça (de alguém), em um monte de carros, porque bandidos colocam fogo na estrutura dos viadutos, alguém vai ser responsabilizado”, afirmou Kalil durante visita às obras do Campo do Cigano, no bairro Lagoa, em Venda Nova.

Segundo Kalil, há uma complicação em se tratar a situação da população de rua na capital devido à atuação de órgãos como o Ministério Público e a Defensoria Pública.

“Tem praça, tem rua que já está muito ocupada. A Defensoria Pública não deixa a prefeitura agir como gostaria, isso tem que ficar muito claro. Entra o Ministério Público, então, há uma complicação. E tem a parte humana que precisamos olhar. Agora, pelo amor de Deus, gente, (se) proteger a estrutura de viaduto virou crime social, então esse povo está doido”, declarou.

Dirceu se diz bem, mas o sonho de Luzia é que o filho volte para casa. A aposentada sai de Santa Luzia, na região metropolitana, pega um ônibus e um metrô para encontrar o filho. "É 1h30 para chegar aqui. Mãe não abandona filho, ele pode estar onde estiver. Minha casa é simples, não tem muita coisa, queria que ele fosse para lá. Mas o vício não deixa", conta emocionada.

"Eu tenho é vergonha, não quero que minha família me veja como eu fico aqui. Falo para ela não vir, mas eu morro de saudade", admite Dirceu.

Outro lado

Por meio de nota, a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) informou que a intervenção faz parte das obras no Boulevard Arrudas, no trecho que compreende a avenida do Contorno, entre as ruas Vinte e Um de Abril e Rio de Janeiro, e o viaduto Leste no Complexo da Lagoinha. Estão sendo investidos R$ 5,7 milhões em obras de revitalização no trecho como, por exemplo, urbanização, paisagismo, irrigação e iluminação. Segundo a pasta, não há previsão de início de obras de urbanização em outros viadutos.

Procurada, a prefeitura de Belo Horizonte também listou uma série de ações realizadas em prol da população em situação de rua. A administração municipal cita a criação de programas de qualificação profissional e vagas em postos de trabalho para essa população.

Segundo a PBH, ano passado foi inaugurado o Centro Integrado de Atendimento à Mulher na região da Lagoinha, voltado às mulheres em situação de vulnerabilidade social, além da ampliação do programa Bolsa Moradia e também dos centros de acolhimento institucional e dos restaurantes populares.

"Desde 2017, diversos esforços têm sido empreendidos na promoção, qualificação e ampliação dos serviços, programas e benefícios que atendem diretamente a população em situação de rua. Foram criadas 129 novas vagas na modalidade de acolhimento institucional para as pessoas em situação de rua e a implantação de duas novas unidades, totalizando hoje 1054 vagas de acolhimento, em 12 unidades para pessoas adultas e suas famílias e quatro exclusivas para adolescente com trajetória de vida nas ruas. Até outubro de 2019 serão implantadas duas novas unidades de acolhimento institucional, totalizando mais 70 vagas, destas, 50 exclusivas para mulheres em situação de rua e 20 para gestantes e puérperas com seus bebês", afirmou o Executivo em nota.

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