Na tarde desta segunda-feira (15), o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), assinou um memorando de intenções para a aquisição da vacina russa Sputnik V para a capital mineira, documento que inicia e formaliza negociações, mas ainda não configura um contrato de compra. Mesmo que o diálogo com o fabricante avance, a aplicação de doses do imunizante em BH e em pelo menos três municípios da região metropolitana que negociam o produto depende do aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), cujo processo de avaliação da vacina não tem atualizações desde meados de janeiro deste ano. 

Betim, Contagem e Santa Luzia também anunciaram a intenção de compra da Sputnik V. Juntas, as quatro cidades avaliam a compra de aproximadamente 6,9 milhões de doses da vacina, 4 milhões apenas para a capital. De acordo com a Prefeitura de BH (PBH), cada unidade custa até US$ 10 (ou cerca de R$ 56,50, pela cotação atual do dólar) e ainda não está definido se a importação será realizada diretamente pelo governo municipal ou por intermédio da União Química, empresa que representa os fabricantes da vacina no Brasil e funciona em Brasília. 

A utilização das doses na população só será possível após autorização da Anvisa. A aquisição das vacinas pelas prefeituras é permitida graças à sanção de uma lei federal que autoriza que outros entes federativos, além do Planalto, comprem imunizantes. De qualquer forma, a agência reguladora precisa ter aprovado o uso emergencial ou o registro definitivo da opção antes de ela ser distribuída aos cidadãos. 

Até o momento, o imunizante sequer está sob análise da Anvisa, de acordo com o órgão. Em janeiro, ele foi submetido a avaliação, mas o processo foi encerrado pela agência federal por falta de documentos o bastante, que não foram apresentados novamente pela fabricante desde então. A reportagem questionou a União Química sobre quando ela retomará o processo e aguarda retorno. 

*Disputa*

Caso as vacinas de fato cheguem às cidades, não haveria chance de o Ministério da Saúde as integrar obrigatoriamente no Plano Nacional de Imunização (PNI), na perspectiva do advogado e diretor-executivo do Instituto Questão de Ciência, Paulo Almeida. “Existe um mecanismo constitucional, a requisição administrativa, em que, em situações específicas, o governo federal pode solicitar para o seu uso e diante de uma remuneração justa insumos adquiridos por outros entes. Mas, na pandemia, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que isso não pode acontecer”, detalha, citando uma decisão de 2020, quando o governo federal pretendia utilizar respiradores contratados pelo Estado do Piauí e foi impedido pelo STF. 

Na visão do especialista, a possibilidade de os municípios efetivamente receberem vacinas compradas por eles próprios parece remota, por ora. “De alguma maneira, o governo central está se organizando. Desde o princípio, as ações dos Estados e municípios foram por inércia do governo federal, mas o volume de doses prometido por ele acaba matando essas iniciativas. Acho importante que haja essa mobilização dos municípios, mas penso que isso só tem chance de vingar se houver fracasso completo das negociações do governo federal”, avalia.

Nesse domingo (14), um consórcio de governadores dos Estados do Nordeste formalizou a compra de 37 milhões de doses da Sputnik V com a promessa de as repassar ao PNI, sendo distribuídas a todo o Brasil.