Imunização

Minas vai vacinar todas grávidas contra Covid: letalidade para o grupo é o dobro

Vacinação irá começar assim que novos lotes da Pfizer e da Coronavac chegarem ao Estado

Por Aline Gonçalves, Letícia Fontes e Cristiano Martins
Publicado em 11 de junho de 2021 | 16:14
 
 
 
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Todas as gestantes foram incluídas, nesta sexta-feira (11), no grupo prioritário de vacinação contra Covid-19 em Minas Gerais. Mas a imunização vai depender ainda da chegada de novas remessas das vacinas da Coronavac e da Pfizer no Estado. Até o momento, apenas grávidas com comorbidades poderiam se imunizar. Em Belo Horizonte, a prefeitura informou que ainda não foi comunicada oficialmente sobre a recomendação. 

A mudança no protocolo aconteceu depois que diferentes grupos pressionaram, ao longo da semana, pela posição à favor da vacinação de grávidas sem comorbidades no Estado. Cidades como São Paulo e Natal, no Rio Grande do Norte, por exemplo, já iniciaram, no início desta semana, a vacinação do grupo, com apresentação de laudos médicos. 

Atualmente, a taxa de letalidade de gestantes e puérperas em Minas é o dobro em relação à população em geral. Segundo dados do DataSus, a letalidade entre grávidas puérperas é 105,3% superior do que a média da população geral no Estado. No ano passado, 25 grávidas morreram em Minas Gerais. Já nos cinco primeiros meses deste ano, 124 gestantes vieram a óbito, um aumento de 416%. No país, a situação ainda é pior. A taxa de letalidade entre gestantes em decorrência da Covid-19 é de 7,2% – mais que o dobro da atual taxa de letalidade pela doença, que é de 2,8%. (Veja abaixo)

"Gestantes normalmente, com ou sem comorbidade, apresentam queda na imunidade e dificuldade em lidar com o vírus. E para além da questão da letalidade, a Covid na gestação potencializa o risco de internação, intubação, problemas cardíacos e até alterações placentária e diminuição do fluxo sanguíneo", explica o diretor da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig), Eduardo Cunha.

A publicitária Júlia Cruz, 29, está com 22 semanas de gestação. À espera do Pedro, ela não vê a hora de estar em um posto de vacinação e poder compartilhar ao lado da esposa a gravidez com a família. "Eu não tenho medo da vacina. Eu tenho medo da doença. Estar grávida durante a pandemia não é fácil. Além do receio de ser contaminada, principalmente pelos altos índices de mortalidade, tem todo o emocional envolvido. Sabe aquela alegria de compartilhar com a família o crescimento da barriga, ver as pessoas querendo sentir o bebê mexer, os encontros, o carinho tão importante para nós, gestantes? Não teve. Minha mãe ainda não me viu grávida. O que fica é a solidão de viver um momento tão importante longe dos nossos familiares, dos nossos amigos, das pessoas que a gente ama", desabafa. 

Entenda. 
As grávidas e puérperas como um todo chegaram a ser incluídas no Programa Nacional de Imunizações (PNI), do governo federal, mas a investigação de mortes de mulheres após o uso do imunizante da Astrazeneca fizeram a orientação do Ministério da Saúde mudar, seguindo recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no dia 11 de maio. Passou-se, então, a priorizar apenas a vacinação de grávidas com comorbidades - ainda assim com vacinas Coronavac, que não chega a Minas Gerais desde 18 de maio,  ou Pfizer.

Em contato com a reportagem, o Ministério da Saúde informou que a recomendação é para que gestantes, puérperas e lactantes recebam a vacina Covid-19 "desde que pertençam a um dos grupos prioritários, especialmente se tiverem alguma comorbidade". Todavia, a pasta frisa que seguir a orientação não é algo obrigatório aos prefeitos. "Os gestores locais do SUS têm autonomia para seguir com a estratégia regional de vacinação, de acordo com as demandas locais", informa.

Em BH, a Prefeitura de Belo Horizonte informa que “segue rigorosamente as orientações do Ministério da Saúde”. Por isso, atualmente estão sendo vacinadas contra a Covid-19 “grávidas com comorbidades ou que estejam especificadas como trabalhadoras de serviços essenciais (desde que tenha a avaliação individual de risco benefício realizada em conjunto com o médico)”, informou. O município destacou ainda que para a imunização do público é imprescindível que novas remessas de vacinas sejam entregues. 

Procurado, o governo de Minas informou que a mudança foi possível porque o Ministério da Saúde passou a incluir grávida, puérperas e lactantes sem comorbidades no Plano Nacional de Imunização. Mas questionado, o governo federal não confirmou a alteração no protocolo. A Secretária Estadual de Saúde destacou ainda que o grupo será incluído no grupo prioritário assim que novas remessas da Pfizer e da Coronavac forem destinadas ao Estado. "A inclusão de grávidas, puérperas e lactantes que não possuem algum tipo de acometimento na saúde será feita pela Comissão Intergestores Bipartite da Secretaria de Estado de Saúde", disse em nota. 

Até a noite desta sexta-feira (11), o governo federal não informou qual a previsão de novas remessas de imunizantes ao Estado.

Conselho Municipal de Saúde pretende acionar Ministério Público em BH para incluir gestantes na vacinação

Em Belo Horizonte, a prefeitura da capital informou que ainda não foi comunicada sobre a orientação de vacinar gestantes sem outras comorbidades. No entanto, a priorização do grupo é defendida pelo Conselho Municipal de Saúde, que pretende encaminhar um ofício ao prefeito e ao Ministério Público pedindo a inclusão imediata de grávidas e puérperas na vacinação. 

"As maternidades têm recebido muitas gestantes jovens contaminadas por Covid já com quadros graves de internação. É uma situação que pode ser evitada se houver vacinação desse grupo. Temos várias cidades e Estados já vacinados com outras vacinas que não a Astrazeneca. Sabemos que o Ministério da Saúde não é um órgão que passe credibilidade", afirma a presidente da entidade, Carla Anunciata, em referência a determinação do governo federal em suspender a vacinação dos grupo após a morte de uma gestante de 35 anos em decorrência de um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVC), que poderia ter ligação com o uso da vacina da AstraZeneca. O fato ainda não foi comprovado. "Como eles podem aferir questões técnicas se nem infectologistas eles possuem em seu escopo de profissionais? A vacina é o único recurso para esse grupo super vulnerável", completa. 

A publicitária Camila Salazar, 35, mora em Belo Horizonte e está grávida de 18 semanas. Em meio a incerteza da imunização, ela critica os critérios adotados pelas autoridades. "Eu gostaria muito de ser vacinada e concordo que os profissionais da saúde e educação também devam ser imunizados, mas acho que algumas coisas estão fugindo a regra e isso me incomoda. Funcionários administrativos em home-office são vacinados e a gente? A lista não está sendo seguida da forma como deveria, a gestação deveria ser vista como grupo prioritário a começar pelos estudos que apontam os riscos da doença na gravidez", avalia. 

Segunda dose Astrazeneca 
O Ministério da Saúde informou que grávidas ou puérperas - incluindo as sem fatores de risco adicionais - que tomaram a primeira dose da vacina Covid-19 da AstraZeneca/Oxford/Fiocruz devem aguardar o fim da gestação e do período puerpério (até 45 dias pós-parto) para completar o esquema vacinal com o mesmo imunizante. 

Minientrevista
Agnaldo Lopes 
Presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO)

Quais os riscos de uma gestante ser contaminada por Covid tanto para a saúde da mulher quanto para a do bebê? Estamos aprendendo com a pandemia e tudo que se refere a gestação é complexo. O que sabemos é que a transmissão mãe e bebê durante a gravidez provavelmente não acontece ou é algo raro. Os casos que se têm até então também não apontam má formação do feto ou sequelas futuras para esse bebê.

Grávidas devem ser incluídas no grupo prioritário? A mortalidade na gestação é muito elevada, metade das mulheres que morreram gestantes no mundo são brasileiras. Vacinar grávida com comorbidade não temos dúvida disso, mas não estamos falando só do risco de morte. Complicação entre mulheres grávidas no geral são maiores do que em não grávidas, principalmente quando falamos em riscos na parte respiratória, é mais difícil se colocar gestantes em respiração mecânica, por exemplo. Além disso, tem outras questões associadas como prematuridade do parto.

Qual vacina utilizar neste grupo? Por uma questão de cautela e até se comprovar os riscos, não se utiliza a Astrazeneca, mas esse não é o único imunizante. Até então, todos os imunizantes disponíveis no Brasil e os que podem chegar, como a vacina da Janssen, podem ser usados. 

Covid entre grávidas e puérperas em Minas Gerais 
Veja a taxa de letalidade entre gestantes e puérperas no Estado e no país

NO BRASIL

Mortes
2020 - 544 gestantes e puérperas morreram de Covid no Brasil (média semanal de 12,1 óbitos)
2021 -  Até maio, foram 911 mortes (média semanal de 47,9 óbitos)

Letalidade
7,2% é a taxa de letalidade entre gestantes e puérperas no país
2,8% é a letalidade geral da população

A taxa de letalidade no país é mais que o dobro (157%) da taxa atual de mortes na população em geral 

EM MINAS GERAIS

Covid-19 entre Grávidas e Puérperas em Minas
Casos confirmados: 2.843
Mortes confirmadas: 149
Letalidade: 5,24%
 
Covid-19 em Minas Gerais (população geral) 
Casos confirmados: 1.667.905
Mortes confirmadas: 42.589
Letalidade: 2,55%

*A taxa de letalidade entre grávidas puérperas em Minas é 105,3% maior do que na média da população geral
 
Mortes de Grávidas e Puérperas em Minas Gerais
2020 - 25
2021 - 124

**Só em BH, há mais de 22 mil mulheres gestantes e puérperas
 
Fonte: OpenDataSUS/e-SUS VE/Sivep Gripe/Ministério da Saúde, Fiocruz e Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG)

 

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