Em Venda Nova

PC apura suspeita de agressão de seguranças do metrô de BH contra serralheiro

A namorada do serralheiro deve ser ouvida nesta sexta-feira (9) na Delegacia de Polícia Civil de Venda Nova

Por Lara Alves e Natália Oliveira
Publicado em 09 de abril de 2021 | 12:51
 
 
 
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A Polícia Civil abriu inquérito para investigar a denúncia de agressão de seguranças do metrô contra um serralheiro de 30 anos na plataforma da estação Vilarinho, na região de Venda Nova, na noite de terça-feira (6). A namorada dele deve ser ouvida nesta sexta-feira (9).  Na ocorrência feita à Polícia Civil consta que Anderson José da Silva foi agredido pelos funcionários da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) que o atingiram com socos e chutes, como também borrifaram gás de pimenta em seus olhos.

O serralheiro está internado no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, e deve passar por cirurgia. Por meio da assessoria de imprensa, a Polícia Civil informou que a ocorrência foi registrada na Delegacia de Plantão 3 (Deplan 3), na quarta, como lesão corporal e que um procedimento foi aberto para apurar os fatos. "As investigações estão a cargo da 3ª Delegacia de Polícia Civil em Venda Nova. Demais informações serão repassadas em momento oportuno", ressaltou a PC.

A vítima realizou o exame de corpo de delito, nesta quarta-feira (7), no Instituto Médico-Legal D., André Roquette, região Oeste de Belo Horizonte e o laudo está sendo elaborado. "Assim que disponível, a vítima ou o representante legal pode comparecer à 3ª Delegacia de Polícia Civil em Venda Nova, onde tramita a investigação, para solicitar a cópia do exame que integra o Inquérito Policial", informou.

Segundo a advogada do serralheiro, Luísa Helena Martins, policiais civis foram até a casa da namorada de Silva para tentar ouvi-lo, porém ele está internado. A namorada do serralheiro será ouvida pela Polícia Civil sobre o caso nesta tarde. 

A vítima, nascida em Pernambuco, vive há cerca de um ano na capital mineira. Silva terá que passar por uma cirurgia na mão por causa das fraturas.   

O caso

O histórico da ocorrência registrada por Anderson José da Silva na manhã de quarta-feira (7), documento que foi acessado pela reportagem, detalha que o serralheiro havia saído do bairro Eldorado, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, após o trabalho, e seguia às 21h de terça-feira (6) para a residência onde mora com a namorada no bairro Fernão Dias, na região Nordeste de BH. Em um dia normal, ele teria desembarcado do metrô na estação Minas Shopping e caminhado até o endereço. Entretanto, à ocasião, como esclarece a advogada, Anderson cochilou e acordou apenas no final da estação Vilarinho.

“Ele acordou assustado e sem saber onde estava porque vive em Belo Horizonte há menos de um ano. Quando percebeu, quatro seguranças caminhavam em sua direção e ele apavorado, com muito sotaque, perguntou onde estava. Os seguranças, então, começaram a gritar com ele. Logo que ele respondeu que não sabia onde era ali, um dos seguranças começou a agredi-lo e tentou acertá-lo com um chute”, narra.

Em relato no boletim policial, Anderson comentou que um dos seguranças disse a ele antes de acertá-lo: “está de gracinha? Está zoando? Como você não sabe onde está?”. Após o primeiro segurança tentar atingi-lo com um chute no peito, um segundo funcionário do metrô o teria atingido com um spray de pimenta e disparado contra ele um laser. “Foi nesse momento que o Anderson caiu, com muita ardência nos olhos. Ele, como reação, acabou evacuando e se sujou com fezes e urina, de susto, de medo. No chão, os seguranças o chutaram. Ele recebeu uma série de socos e chutes”.

Após as agressões, o serralheiro teria permanecido desacordado e, deixado no chão pelos seguranças, foi ajudado por dois casais que o levaram para fora da estação. À Polícia Civil, Anderson disse que por ser natural de Pernambuco acredita que os seguranças o agrediram pelas diferenças culturais – por não terem entendido o que ele dizia em razão do forte sotaque – e também por injúria racial.

O documento lista que ele sofreu lesões no braço e no punho esquerdos, no peito e na região lombar. O celular dele foi quebrado. “No próprio boletim consta que o Anderson acredita não ter sido bem compreendido pelos seguranças pelas diferenças culturais, pelo fato dele ser nordestino, pelo sotaque. Foi logo depois dele dizer que não sabia onde estava e que não era de Belo Horizonte que as agressões começaram. Há uma questão de xenofobia e injúria racial”.

Na ocorrência foi registrado que “provavelmente há câmeras de monitoramento na estação”. A advogada Luísa Helena Martins está em busca das imagens para reforçar a defesa de seu cliente.

Ajuda negada e internação

Depois de sair da estação com o amparo dos dois casais – que a defesa também procura para que sejam testemunhas das agressões sofridas por Anderson, o serralheiro foi até um posto da Polícia Militar (PM) na avenida Vilarinho, na região de Venda Nova. Entretanto, a ajuda teria sido negada a ele, como detalha a advogada.

“Ele pediu ajuda no posto policial, mas o militar o olhou de cima para baixo e negou pelo fato dele ter evacuado na roupa. Apesar dele estar muito machucado, foi negada ajuda. Em seguida, o Anderson foi para casa e contou tudo para a namorada, que é com quem ele mora, mas não conseguiu explicar bem, estava muito confuso. De manhã (na quarta-feira, 7) ele conseguiu contar e a namorada disse: ‘você precisa registrar um boletim’. Só que, depois do que aconteceu com a PM, ele já não queria. Depois de muita insistência é que ele aceitou procurar uma delegacia”.

O serralheiro pernambucano foi submetido a um exame de corpo de delito e, atendido no Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, após o registro da ocorrência, acabou internado. “Ele terá que passar por uma cirurgia na mão em face das agressões sofridas. Agora estamos aguardando que ele seja transferido. O Anderson está muito assustado, com medo, e se sentindo sozinho… O que nós queremos são as imagens. São as imagens que nos ajudarão a provar na Justiça o que aconteceu. Anderson sofreu uma série de agressões e violações”.

A advogada do serralheiro disse à reportagem na noite de quinta-feira (8) que pretende entrar com um mandado de segurança à Justiça de Minas Gerais para acessar as imagens do circuito interno da estação como prova das agressões sofridas por seu cliente. De acordo com ela, funcionários da CBTU alegaram que apenas abordaram Anderson José da Silva por ele estar sem máscara e negaram as agressões.

Ainda segundo a advogada, enquanto era espancado, o serralheiro chegou a evacuar e, logo em seguida, quando procurou ajuda policial em uma unidade na avenida Vilarinho, militares se recusaram a apoiá-lo em função de suas condições físicas.

Resposta

Em nota, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), responsável pelo transporte ferroviário, informou que o passageiro não formalizou nenhuma denúncia sobre o caso junto ao órgão, mas que não compactua com violência. Leia na íntegra:

"A CBTU-BH esclarece que foi  procurada por oficiais da Delegacia de Plantão 3 (Deplan 3) da Polícia Civil, após denúncia promovida por um usuário que alega ter sofrido lesão corporal durante um procedimento de abordagem registrado na Estação Vilarinho no dia 6 de abril, às 22h. O passageiro não chegou a formalizar nenhum registro junto a CBTU-BH, optando por fazê-lo apenas junto à corporação.
 
A CBTU-BH reafirma que não admite e não compactua com nenhum desvio de conduta e repudia todo e qualquer ato de violência e já está prestando todo o suporte necessário à Polícia Civil para a elucidação dos fatos. A Gerência de Segurança da Companhia também esclarece que recebeu nesta sexta (9) solicitação da Polícia Civil para análise prévia das imagens de câmeras de monitoramento e já se colocou à disposição da Corporação para a cessão dos arquivos, caso a autoridade policial julgue necessário.
 
Como não houve relato por parte do usuário, tão logo procurada pela Polícia Civil, a Superintendência de Trens Urbanos de Belo Horizonte determinou a imediata instauração de procedimento administrativo junto à Corregedoria Regional para a apuração da ocorrência e para a adoção das medidas cabíveis no âmbito corporativo.

Com o registro da ocorrência na Polícia Civil, as investigações seguirão a cargo da corporação e a CBTU-BH aguarda o desfecho por parte da Autoridade Policial. A Companhia permanecerá à disposição para contribuir com a investigação dos fatos, sempre que requerida."

A reportagem também entrou em contato com a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), já que foi relatado que um servidor teria se negado a registrar a ocorrência em uma base móvel. Em nota, a corporação esclareceu que estão sendo adotadas medidas para a verificação quanto à existência do fato apresentado.

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