A onda de calor por trás das grades de uma cela somou mais um problema além das altas temperaturas e da superlotação: a falta de acesso à água. Denúncias de familiares de pessoas privadas de liberdade, recebidas pelo diretor de Inclusão da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), William Santos, datam que ao menos sete presídios da região metropolitana de Belo Horizonte ficaram sem abastecimento de água durante o calorão. Até o momento, a situação não foi solucionada.
As penitenciárias afetadas estão em Contagem, Ribeirão das Neves e São Joaquim de Bicas (veja lista abaixo). No presídio Nelson Hungria, em Contagem, por exemplo, falta água há pelo menos cinco dias direto. Os relatos dos presos aos familiares durante as visitas denunciam uma insalubridade: dias sem poder dar descarga, falta de banho e rotina de higiene mínima, suor debaixo do calor em celas superlotadas, e, quando uma situação melhor, 1,5 litro de água dentro de uma pet para cada 30 ou 35 presos do cárcere.
O advogado criminalista Gregório Andrade é um dos que acompanha as denúncias junto aos familiares dos presos. Segundo ele, a racionalização de água se tornou rotina dentro dos presídios, mas, em meio à onda de calor, o problema se agravou. “Durante a onda de calor, recebi inúmeras denúncias. Quando falta água na cidade, as pessoas estão livres, podem ir buscar soluções. O preso não, ele vai sofrer de sede, de mal estar com o calor, de risco de pegar doença. Tenho informação de presídio em que os presos estão há uma semana sem dar descarga. Sem banho, sem higiene, é insalubre”, afirma.
Sem água, presídio vira foco de doenças
Andrade reforça o risco, principalmente, da disseminação de doenças pela falta de acesso à água. Ele reforça que, em celas pequenas e superlotadas, a falta de higiene é um risco à saúde. “Com o calor, essa escassez de água faz do sistema prisional uma zona de guerra. O presídio vira um foco de doença. Não dar descarga, não ter higienização em um lugar superlotado, sob altas temperaturas, é insalubre. Um problema também para aqueles que trabalham nos presídios e para as famílias que vão visitar e não têm água”, continua.
Quando há água, até 35 presos dividem uma garrada pet
As denúncias chegaram ao diretor de Inclusão da OAB-MG, William Santos. Ele afirma que as reclamações por racionamento de água dentro dos presídios só tem aumentado. Segundo Santos, quando há oferta de água nas celas, os presos são obrigados a sobreviver com alguns mls. “Algumas unidades têm uma gestão de água mínima. É 1,5 L, em garrafa pet, para 30, 35 presos. Os presos colocam a garrafa do lado de fora da cela, próxima à grade, para que ela não esquente tanto quanto dentro da cela”, denuncia.
O diretor se preocupa com a situação, uma vez que as ondas de calor vieram para ficar. Ele diz que reclamações chegam pelas famílias dos presos, principalmente após as visitas, mas que nada é feito para solucionar o desabastecimento de água. “As autoridades não apresentam nem resposta. É um problema crônico, mas piora na situação de calor. Imagine uma cela com 35 pessoas, um espaço mínimo, sob situações de clima extremo. Situação absurda”, afirma. De acordo com Santos, não foi notificada morte de pessoas privadas de liberdade na Grande BH devido ao calor.
Lista de presídios que apresentam reclamações de falta de água durante onda de calor na Grande BH:
- Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem
- Presídio de Ribeirão das Neves I
- Presídio de Ribeirão das Neves II
- Penitenciária José Maria Alkimim, em Ribeirão das Neves
- Presídio Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves
- Penitenciária Professor Jason Soares Albergaria, em São Joaquim de Bicas
- Presídio de São Joaquim de Bicas, em São Joaquim de Bicas
O que diz a Sejusp e a Copasa?
Apesar da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) negar as denúncias, dizendo que "não há problemas de falta de água para detentos em nenhuma das unidades da primeira e segunda Risp" e que "o uso consciente de água faz parte da rotina das unidades prisionais", a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) confirmou a falta de abastecimento de água e a necessidade de uso de caminhão-pipa.
"A Copasa informa que foi necessário complementar o abastecimento do presídio de São Joaquim de Bicas, na última sexta-feira (17/11), utilizando como recurso caminhões-pipa, já que as instalações internas da unidade prisional apresentaram problemas na distribuição de água para os pavilhões.
No sábado (18/11) a Copasa realizou manobras na rede de distribuição do entorno, que não só abasteceram a unidade como também promoveram o equilíbrio do sistema de fornecimento de água da edificação.
A Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, também foi abastecida por caminhões-pipas solicitados pela administração da unidade prisional.
Em Ribeirão das Neves, na Penitenciária José Maria Alkimim, as instalações internas apresentaram problemas na distribuição de água para os pavilhões. Entretanto, a unidade prisional fica na parte baixa da cidade, onde não houve longos períodos de desabastecimento", afirmou em nota.