Em março de 2019, o Festival Brasileiro de Cerveja em Blumenau, que abriga o mais prestigiado concurso do gênero do país, coroou a Backer como a melhor cervejaria de grande porte do
país. Fábricas de grande porte têm produção acima de 100 mil litros por mês, e os mineiros já haviam superado o número de 800 mil depois de uma ampliação em 2018.
Menos de um ano depois da consagração, a Backer vive seu pior momento com o caso da contaminação por dietilenoglicol, que levou a 19 casos confirmados de intoxicação, incluindo quatro mortes.
Depois de uma entrevista coletiva neste ano, a empresa passou a falar apenas por meio de comunicados oficiais via assessoria de imprensa.
Em seu site, uma declaração se limita a informar que o foco "está nos pacientes e seus familiares" e que "prestará o suporte necessário, mesmo antes de qualquer conclusão". Também avisa que continua colaborando com as investigações ao mesmo tempo em que solicitou uma perícia independente.
Em sua defesa, a cervejaria diz que nunca comprou o dietilenoglicol para usar como anticongelante – toda cervejaria utiliza um anticongelante na produção, muitas uma solução à base de etanol.
Mas isso importa menos. A grande questão continua sem resposta: como é que o anticongelante entrou em contato com o líquido no processo de produção, contato esse que causou a contaminação?
O episódio trágico não aconteceu com uma cervejaria qualquer. A Backer é das mais respeitadas e antigas do setor no país, fundada em 1998. Vários dos mais de 20 rótulos de seu portfólio passaram com sucesso por São Paulo. A Belorizontina não era vendida na capital paulista.
Com a fábrica ainda fechada pelo Mapa e com todos os rótulos recolhidos, a cervejaria da marca ao lado da fábrica, no bairro Olhos d'Água em Belo Horizonte, quase fronteira com Nova Lima, estava aberta normalmente na sexta-feira (17), ou quase normalmente.
Pratos do cardápio que usam algum rótulo da empresa na execução eram vendidos apenas na versão "sem álcool".
A única bebida alcoólica produzida pela Backer comercializada eram drinques à base do uísque Três Lobos ou do gim Lebbos, destilados que entraram para o portfólio da empresa em 2018.
Mesmo no final da tarde do início do fim de semana, quando os bares estão cheios, o Templo Cervejeiro (nome da casa) estava praticamente vazio.
Na lojinha ao lado do bar-restaurante, rótulos estavam expostos, mas a funcionária avisava que ainda não podia vendê-los e esperava que a situação fosse revertida. Novamente, apenas uísque e gim, entre as bebidas alcoólicas, podiam ser comercializadas.
Em bares especializados de Belo Horizonte, o clima é de apreensão. Em uma das principais casas de cerveja artesanal da avenida do Contorno, o proprietário recolheu cerca de 30 caixas com títulos da Backer. Para ele, mesmo que a empresa consiga uma liminar para voltar a operar, "quem compraria uma cerveja Backer agora?"
Em outro bar na Pampulha, cuja carta de chopes oferecia apenas opções da Backer, o garçom oferecia de cabeça as novas versões da Verace, outra marca mineira. Para ele, o bar deveria voltar a comercializar as cervejas da Backer tão logo ocorra a liberação.
"Não tenho dúvida de que a Backer tem plenas condições de recuperar o mercado. São empreendedores comprometidos", diz Carlo Lapolli, presidente da Abracerva (Associação Brasileira de Cerveja Artesanal). Para ele, o importante agora é que a empresa siga auxiliando as investigações e, sobretudo, tenha transparência com o consumidor.
Ministério detecta mais 11 lotes contaminados
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento anunciou na noite de sábado (18) que constatou a presença de dietilenoglicol, substância proibida em alimentos, em mais 11 lotes de cervejas Backer.
A substância foi encontrada no sangue de pacientes que apresentaram os sintomas de uma síndrome nefroneural e relataram ter consumido a cerveja Belorizontina, produzida pela empresa mineira.
Somando-se às análises realizadas anteriormente, a pasta já identificou 32 lotes da Backer contaminados.
Com isso, chega a dez o número de produtos da cervejaria em que foi detectada a presença de substâncias tóxicas. São eles:
- Belorizontina,
- Capixaba,
- Capitão Senra,
- Pele Vermelha,
- Fargo 46,
- Backer Pilsen,
- Brown,
- Backer D2,
- Corleone e
- Backer Trigo.
Na sexta (17), a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) já havia proibido a venda de cervejas de todas as marcas produzidas pela empresa com data de validade igual ou posterior a agosto de 2020.
Com a medida, comerciantes que ainda tinham os produtos à venda foram obrigados a retirá-los das prateleiras imediatamente.
Quatro pessoas morreram em Minas em decorrência de síndrome nefroneural associada ao consumo de cerveja da marca, mas o número pode subir. Outros 14 casos foram notificados. O primeiro caso foi relatado em 30 de dezembro.
Segundo a secretaria de Saúde de Minas Gerais, os pacientes com o quadro apresentam náuseas, vômitos, desconforto abdominal e comprometimento da função renal.
A Vigilância em Saúde de Minas orienta que as pessoas que consumiram as cervejas desde 30 de outubro e apresentem sintomas sejam observadas por equipes de saúde. As manifestações neurológicas podem ser apresentadas dias depois da ingestão da bebida.