Abandonar um tratamento oncológico pode trazer uma série de consequências para os pacientes. O alerta é feito por especialistas, que têm constatado uma diminuição nos atendimentos a pessoas com câncer. É o que mostra um levantamento da Sociedade Brasileira de Patologia publicado recentemente. Esse estudo revela que, diante da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), a quantidade de análises de biópsias de pacientes oncológicos operados caiu muito entre os meses de março e abril se comparada com a do mesmo período do ano passado.
Em 2019, ao menos 4.385 exames foram computados em Minas Gerais, enquanto, neste ano, houve a realização de apenas 554 análises no Estado, o que representa uma queda de 87% e acende o alerta.
Esse resultado pode ser reflexo do medo da contaminação pela Covid-19. Muitos pacientes com doenças crônicas, por exemplo, têm cancelado consultas de acompanhamento contínuo, e milhares de cirurgias também foram canceladas em todo o país.
É consenso no meio científico que o isolamento social é essencial para conter a disseminação do novo coronavírus entre a população. Em março, no início da quarentena, a fim de liberar leitos para pacientes infectados pela Covid-19 e evitar que pessoas saudáveis frequentem unidades de saúde e se contaminem, a Agência Nacional de Saúde Suplementar orientou que consultas, exames ou cirurgias que não se enquadrem em casos de urgência e emergência fossem adiados.
No entanto, segundo especialistas, grupos mais vulneráveis à Covid-19, como os pacientes cardíacos, diabéticos e com câncer não podem deixar que o medo da contaminação impeça a continuação do tratamento.
Isso porque pessoas com câncer que estejam em tratamento de quimioterapia ou radioterapia, que tenham se submetido a cirurgia há menos de um mês ou que usem medicamentos imunossupressores fazem parte do grupo de risco.
Em entrevista a O TEMPO, o oncologista Dr. Amândio Soares, fundador da Oncomed (clínica especializada em tratamento oncológico), alerta que, dependendo do tipo e do estágio do câncer, por exemplo, há mais risco de falecimento pela doença ao se abandonar o tratamento do que por infecção pela Covid-19. “Muitos tumores evoluem de maneira muito rápida. Por isso, a pausa no tratamento ou o adiamento de consultas preventivas tem impacto crucial no tratamento, impactando os resultados terapêuticos”.
Segundo Soares, é importante ressaltar que, na oncologia, a prevenção deve ser sempre preconizada e, com o atraso no diagnóstico, a taxa de cura também é reduzida. “No câncer, existem vários aspectos que vão afetando o sistema imunológico dos pacientes. Alguns tipos de tumores têm comportamentos biológicos mais ou menos agressivos, e é isso que precisamos avaliar, já que, em alguns casos, o melhor é não esperar para iniciar o tratamento. O que estamos recomendando é que, em caso de qualquer sintoma, o paciente não deixe de procurar auxílio médico”, salienta.
Linha de cuidados essenciais
Para garantir a continuidade nos tratamentos e assegurar a proteção dos pacientes quanto ao contágio pelo novo coronavírus, a Oncomed – clínica especializada em tratamento oncológico em Belo Horizonte – está seguindo todos os protocolos de segurança definidos pelo Ministério da Saúde, realizando a triagem de pacientes e acompanhantes na recepção, com aferição da temperatura e fornecimento de máscaras.
Além disso, foi realizada a mudança de layout na clínica, para se respeitar o espaço de segurança entre as pessoas, e um canal direto com o médico de plantão foi criado para orientação sobre sintomas e possíveis encaminhamentos ao serviço de saúde e consultas de controle em modelo de teleorientação.
Segundo especialistas, paciente com câncer também deve tomar algumas precauções no dia de sua consulta ou tratamento, como ter somente um acompanhante e que não apresente sintomas de resfriado ou gripe. Especialistas também orientam sobre outros cuidados, como lavar as mãos com água e sabão e, na ausência disso, usar álcool em gel. É recomendado que o paciente fique em casa quando não for dia de tratamento e só saia, em casos extremos, quando for realmente necessário e usando máscara.
Telemedicina é opção neste período
Especialistas na área de oncologia afirmam que a suspensão do acompanhamento de casos crônicos trará sobrecarga ao sistema de saúde, tanto público quanto privado.
A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade já prevê mais uma onda de doentes no sistema nas próximas semanas. “Esse adiamento das consultas e das cirurgias pode, sim, gerar uma fase de superlotação em hospitais e clínicas nas próximas semanas”, defende o oncologista Amândio Soares.
De acordo com o médico, o ideal, para evitar esse colapso, é que o paciente não adie a consulta com um especialista, realizando, por exemplo, uma teleconsulta.
“A telemedicina tem ajudado os pacientes que estão com medo de sair de casa a tomarem a decisão de continuar com seus tratamentos. Por meio das consultas por vídeo, o médico poderá avaliar amplamente a solução de cada caso”, explica o especialista.