Em um país onde o racismo estrutural ainda reflete nas desigualdades sociais, uma iniciativa pioneira surge para reescrever narrativas e resgatar a identidade cultural de milhares de crianças e adolescentes.

A Prefeitura de Betim, na região metropolitana de BH, instituiu recentemente, por meio de decreto municipal, publicado no “Órgão Oficial”, a aplicação das leis federais 10.639, de 2003, e 11.645, de 2008, que tornaram obrigatório o ensino da história e da cultura afro-brasileira e indígena nas escolas públicas no país.

Por meio do projeto "Caminhos para a Igualdade", mais de 50 mil alunos terão acesso a um ensino que valoriza suas raízes e combate o preconceito a partir da educação, por meio da disciplina obrigatória "África e Povos Originários na Educação de Betim", que estará na grade curricular das escolas da rede municipal infantil e fundamental.

A decisão coloca Betim à frente de grande parte dos municípios brasileiros, uma vez que, apesar de a obrigatoriedade do ensino sobre a história afro-brasileira, indígena quilombolas e ciganas existir há mais de duas décadas, sua aplicação ainda é um desafio.

Um levantamento de 2023 do Instituto Alana revelou que 71% das cidades brasileiras não implementam a Lei 10.639/03, criada justamente para combater o racismo no ambiente escolar. 
“O ‘Caminhos para a Igualdade’ representa, com ações práticas, um combate irrestrito ao preconceito e à invisibilização histórica de povos que construíram a base de nosso país. Vamos formar gerações mais conscientes, respeitosas e orgulhosas da nossa identidade cultural diversa”, destaca o prefeito de Betim, Heron Guimarães. 
 


Nesta sexta-feira (4), o município promoveu a primeira formação dos educadores que levarão o conteúdo às salas de aula. O evento, que aconteceu no Clube Atlético Rodoviário, reuniu cerca de 2 mil profissionais da educação municipal, e acontece em dois turnos - manhã e tarde, garantindo que o ensino seja aplicado de forma pedagógica e eficaz.

A capacitação foi conduzida pelo historiador e professor da "Griô Educacional", Natanael Santos, especialista na temática afro-brasileira e indígena. "Estamos capacitando nossos profissionais para que eles possam transmitir aos alunos um conhecimento essencial sobre a história e a cultura afro-brasileira, indígena, quilombola e cigana, combatendo o preconceito e promovendo o respeito à diversidade. Aproveitamos o momento para apresentar o material didático que compramos exclusivamente para essas aulas. São livros para o professor, para o estudo do aluno e outros literários que irão compor o acervo das bibliotecas", destaca a secretária municipal da Educação, Marilene Pimenta.

Panorama da desigualdade

Já algum tempo, especialistas ressaltam que uma educação que ignora as contribuições dessas populações perpetua um apagamento histórico que impacta a autoestima e o senso de pertencimento de milhões de estudantes negros e indígenas.

Muitos alunos atravessam a vida escolar sem aprender sobre os verdadeiros protagonistas da história brasileira, sendo expostos, majoritariamente, a narrativas que apagam a resistência negra e indígena.

O reflexo disso pode ser visto nas desigualdades educacionais: estudantes negros, apesar de representarem a maioria nas escolas públicas, enfrentam mais dificuldades para concluir os estudos e acessar o ensino superior.

Dados do IBGE apontam que, no cenário nacional, em 2022, a taxa de conclusão do ensino médio entre jovens brancos foi de 73,6%, enquanto entre jovens negros e pardos, o índice caiu para 59,1%.

Ao implementar uma política educacional que resgata a identidade e fortalece o senso de pertencimento, Betim se torna um exemplo de como a educação pode ser um poderoso instrumento de combate à desigualdade.

Mais do que cumprir a lei, a cidade está abrindo caminho para uma nova geração que cresce consciente, respeitosa, conectada às suas verdadeiras raízes e tendo a representatividade como parte do seu cotidiano.

Um projeto que ecoa a identidade betinense

Nomeado "Caminhos para a Igualdade", o projeto será implementado em 162 escolas, centros infantis e creches parceiras, atendendo estudantes desde a educação infantil até a Educação de Jovens e Adultos (EJA).

O impacto da iniciativa ganha ainda mais relevância diante da composição da população local: dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, revelaram que 65,91% dos moradores de Betim se autodeclaram pretos ou pardos.

A disciplina abordará, de forma interdisciplinar e continuada, a trajetória e as contribuições dos povos afro-brasileiros, indígenas, quilombolas e ciganos, ampliando a compreensão dos alunos sobre as histórias de resistência, as lutas históricas e o protagonismo desses grupos na formação do Brasil e, especificamente, de Betim.

Ainda segundo o gestor, a nova disciplina contempla um ponto essencial de seu plano de governo, que inclui outras três disciplinas importantes para a formação cidadã dos estudantes: educação financeira, empreendedorismo e programação robótica. 

Educação antirracista na prática

Para garantir a qualidade e efetividade do ensino, a prefeitura adotou o material "Griô Educacional", desenvolvido por especialistas para aprofundar o estudo da cultura afro-brasileira, indígena, quilombola e cigana. A disciplina será ministrada semanalmente, totalizando 90 horas/aulas por ano, com dois eixos principais: linguagem e história.

A implementação também inclui um investimento massivo na capacitação dos professores. Cerca de 2 mil profissionais da educação infantil e do ensino fundamental participarão de formação continuada, com palestras de sensibilização e oficinas sobre as temáticas abordadas.

Mais que uma disciplina, um movimento

O "Caminhos para a Igualdade" transcende o ambiente escolar. A iniciativa também prevê uma mostra cultural anual, na qual os alunos poderão compartilhar suas produções com a comunidade, consolidando o impacto social e educativo da iniciativa. Além disso, ao final de cada ano letivo, será produzido um livro de base anual com as experiências vividas nas unidades escolares, registrando as práticas pedagógicas e os impactos do projeto.

Esse material servirá como referência para outras cidades brasileiras interessadas em adotar iniciativas semelhantes na educação pública. 

Para saber mais sobre o projeto clique aqui

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