Novo álbum

A voz e a rima de Orochi, o novo fenômeno do rap nacional

Rapper fluminense, de 21 anos, divulga seu primeiro disco solo e acumula milhões de visualizações e seguidores nas redes sociais

Por Bruno Mateus
Publicado em 19 de maio de 2020 | 04:30
 
 
 
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O rapper Orochi fez uma live na última sexta-feira (15), sua estreia no formato durante a quarentena, para lançar seu primeiro disco solo, “Celebridade”, e mostrar outras canções já conhecidas. Ele chegou a estar em primeiro lugar nas transmissões da plataforma naquele dia e, no Twitter, foi um dos assuntos mais comentados. Até a tarde de ontem, quando as primeiras linhas deste texto eram escritas, o show no canal do músico no YouTube já havia ultrapassado 2,6 milhões de visualizações. No Instagram, 3 milhões de seguidores querem ler, ver e escutar o que esse jovem fluminense de apenas 21 anos tem a dizer.

No fim de março, Orochi, apelido que Flávio César Castro adotou ainda na adolescência em alusão ao personagem branco, alto e forte do game “The King of Fighters” – “totalmente diferente” dele, segundo o próprio rapper –, jogou “Celebridade” nas plataformas digitais, e o disco o ajudou a bater espantosos meio bilhão de acessos a suas músicas no YouTube. “Balão”, por exemplo, tem 95 milhões de views.

O tema foi escrito nove dias depois da prisão, em 2019, por posse de maconha e desacato a autoridade, e é mais um em que Orochi coloca nas rimas episódios de seu dia a dia. “Minha cara agora tá no jornal/ Recebo a ligação do meu pai/ Achando que tá tudo normal/ A mídia não me deu um troféu/ Quando eu fui campeão nacional/ Agora quer me fazer de réu/ Infelizmente eu sou imortal”, diz a letra. 

A escolha do nome do álbum, Orochi explica, tem a ver exatamente com esse momento positivo que vive na sua carreira e com o status que ele alcançou: “Consegui me tornar uma pessoa influente na cena do rap e no meu círculo de amizades. Consegui fazer com que a minha mensagem chegasse a muitas pessoas”.

Sexo, drogas, violência, ostentação, desigualdade social e críticas ao sistema são assuntos que permeiam “Celebridade”. Em “Nova Colônia”, ele questiona: “Me diz quanto vale um preto morto?/ Menos que um gol na Copa/ Já que preto e maconha não prestam, quanto vale um avião de coca?”. Segundo o rapper, todas as faixas do disco são espelhos de suas experiências. “Meu som tem tudo isso porque foram as coisas que passei e conquistei dentro dessa sociedade, que não quer que o preto cresça”, analisa.

Foi na música que Orochi, hoje tido como o grande fenômeno do rap nacional, encontrou a possibilidade de ajudar a mãe. E foi na arte também que o rapper mudou seu destino. Hoje, ser visto como referência para outros jovens é motivo de orgulho para ele, que admite ter pensado um dia que seria apenas mais um número entre os milhares de jovens negros assassinados nas favelas do país. “Todo dia a gente contraria as estatísticas por estar vivo. E estar vivo, ganhando dinheiro e sendo reconhecido por sua mensagem de crítica é quase assinar a própria sentença de morte”, ele pondera.

Trajetória

O primeiro contato de Orochi com o rap foi na escola. Naquela época, ele prestava atenção em dois amigos, que eram gêmeos e faziam rimas nos intervalos das aulas. Aquilo foi definitivo para o músico. “Comecei a ganhar gosto por isso”, lembra. Orochi nasceu e cresceu em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, onde acontece a famosa roda cultural Batalha do Tanque. Aos 14, ele estreou nos duelos de rap. A realidade que se impunha para milhares de moradores da região foi crucial para ele construir seu repertório desde muito cedo. Em 2015, com apenas 16 anos, conquistou, em Belo Horizonte, o Duelo Nacional de MCs.

O feito representou um salto na carreira do artista, que enxerga nas batalhas de rap sua verdadeira alfabetização na música e a principal influência no seu estilo. “Estar no meio de uma roda cheia de gente gritando e conseguir prestar atenção aos detalhes para que eles sirvam de inspiração é ver o mundo de outra forma. Foi a rua que me ensinou algumas situações da vida, e, com isso, aprendi a como me comportar nos palcos. O freestyle é e sempre será a minha essência”, afirma o músico.

Naquele tempo, Orochi integrava o grupo carioca de rap Modéstia Parte e conseguiu projeção nacional. O voo solo veio em 2019, naquela que foi a decisão mais arriscada de sua vida. “Para ajudar nas despesas de casa, a música era a minha única forma de ganhar dinheiro. Por isso, tive que me tornar adulto e encarar a música como um trabalho, o que eu faço de melhor”, comenta. 

Sobre sua ainda breve carreira, Orochi consegue perceber uma constante evolução e valoriza o amadurecimento, o acesso a novas realidades e o permanente olhar para as desigualdades. “Mainstreet” é o nome de uma música do rapper, mas também é a expressão que ele tem tatuada na cabeça e que carrega como lema: “É o potencial que a cultura de rua tem de entrar no mainstream. O nosso jeito de nos vestir, de falar, de escrever e de fazer música representa o Brasil e, por isso, precisa estar nos veículos de massa, precisa ser consumido e precisa ser divulgado”.

Minientrevista

Como você tem lidado com a quarentena?

Tenho trabalhado bastante, mas curtido também o lançamento do álbum. Aproveitando o ócio criativo e recreativo.

Como é a experiência de lançar um álbum, mas não poder fazer shows e rodar o país em turnê?

É muito estranho. Estou com uma saudade muito grande dos palcos. Mas lançar neste período, em que todos estão em casa, é bom para as pessoas entenderem a mensagem que eu quis passar com o álbum todo. Elas podem se conectar mais com o meu som. Daqui a pouco, poderei ver a multidão cantando as músicas novas comigo.

Você acha que esse fenômeno das lives veio para ficar ou é uma tendência momentânea para tempos de pandemia?

Acho que é uma saída para o contexto de agora. É muito importante ter esse contato com o artista que você admira, faz bem para passarmos por essa juntos. Mas nada é como uma roda cheia de gente, ouvir um som ao vivo com o calor humano.

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