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Clássico do Joy Division, 'Unknown Pleasures' completa 40 anos

Álbum de estreia da banda fez de Manchester, na Inglaterra, a capital da música mundial

Por Frederico Jota
Publicado em 09 de junho de 2019 | 03:00
 
 
 
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A decadente Manchester do final da década de 70 – cenário de um período turbulento para a Inglaterra, em crise econômica e assolada por greves – foi o palco para o surgimento de uma nova cena musical, influente e duradoura. Se pudéssemos definir um marco para o início da mística da cidade e de um verdadeiro culto ao som local, esse seria o álbum inaugural de uma banda que deixaria uma marca indelével na história do pop, mesmo tendo lançado apenas dois discos.

O seminal “Unknown Pleasures” completa, no próximo dia 14, quatro décadas de seu lançamento. Estavam ali os elementos que tornariam o Joy Division um ícone musical de uma era prolífica em Manchester. As letras atormentadas de Ian Curtis, o som distorcido pelo gênio do produtor Martin Hannett, a capa clássica de Peter Saville. Tudo capitaneado por Tony Wilson, o mentor da Factory, uma gravadora com um perfil único. Sua influência é incalculável.

O álbum sintetizou em dez músicas a poesia transtornada de Ian Curtis e transformou o agressivo som punk dos primeiros anos da banda em uma parede sonora que, por vezes, diminuía o vigor da guitarra de Bernard Sumner e do baixo característico de Peter Hook. Até mesmo a bateria de Stephen Morris soa um pouco menos poderosa em comparação com canções como “Warsaw” e “Leaders of Men”, registradas no início da trajetória da banda.

Tudo culpa de Hannett, que fez suas produções e intervenções longe do quarteto, para evitar a reação da banda. Acabou mudando a história do Joy Division.

Para uma jovem banda inglesa do fim da década de 70 (ainda sob os ecos do punk), o uso de alguns teclados, sintetizadores e efeitos poderia ser entendido como uma ofensa. Não foi. Muito pelo contrário. Hook e Sumner podem não ter gostado ao perceber que seus instrumentos perderam a potência, mas o mito tinha sido criado. E as letras ganharam ainda mais evidência.

Um ano daqueles

Aquele 1979 foi bem intenso para Ian Curtis. Em janeiro, recebeu o diagnóstico de epilepsia, o que lhe marcaria profundamente. A doença trouxe ainda mais transtornos, reações em shows e uma superdosagem de remédios. No mesmo mês, o Joy Division grava sua primeira sessão com o histórico John Peel, na BBC. Com uma agenda regular de shows pela Inglaterra e o aprimoramento do som, a banda começa a gravar “Unknown Pleasures” no fim de março, nos estúdios Strawberry, em Stockport. O registro das músicas seria encerrado no início de maio.

Em 16 de abril, nascia Natalie Curtis, fruto de um conturbado relacionamento de Ian Curtis com Deborah Woodruff. Natalie nasceu após quatro anos de um casamento tumultuado, que a agenda de shows e a gravidez só ajudaram a piorar. Vale lembrar que Ian se casou com apenas 19 anos. As obrigações da paternidade e a agenda atribulada deterioraram ainda mais seu relacionamento, o que acabaria impulsionando adultérios e mais crises de saúde.

As letras

Tamanha transformação era percebida na densidade das letras que compunham “Unknown Pleasures”. “A dor da abstinência é dura/ pode mesmo matar você/ tão distorcido e magro/ Onde terminará?”, dizia em “Day of the Lords”. Com “Forçado pela pressão/ os territórios marcados/ sem restar mais prazer/ Ah, perdi a fé desde então” abria “Candidate”, que ainda tinha o perturbador verso “Não sei o que me fez/ o que me deu o direito de bagunçar com seus valores e mudar o errado para certo”.

Em “Insight”, um recado, talvez para Deborah: “Lágrimas de tristeza por você/ Reflete um momento no tempo/ Sim, desperdiçamos nosso tempo/ Na verdade, não tivemos tempo/ mas nos lembramos de quando éramos jovens”. A vibrante “New Dawn Fades” traz outro recado: “O esforço é demais/ não dá para aguentar mais”. Em “She’s Lost Control”, ele relata, assustado, os reflexos da epilepsia após observar a reação de uma senhora.

Os exemplos são inúmeros. Ian Curtis usava o som do Joy Division para expressar suas angústias. O som, por vezes sombrio, trazia elementos que seriam observados no segundo álbum da banda, “Closer”, lançado em 1980 – outro que deve fazer parte de qualquer discoteca básica. Entre o lançamento de “Unknown Pleasures”, em junho de 1979, e o de “Closer”, em julho de 1980, Ian Curtis se enforcou em sua casa, em Macclesfield, na grande Manchester. Era 18 de maio de 1980, véspera da primeira turnê do Joy Division pelos EUA. Em 1981, os atônitos remanescentes, já como New Order, colocavam o álbum “Movement” na lojas. A cena seguiria forte, agora em um outro ritmo.

VEJA MAIS 

“24 Hours Party People” (A Festa Nunca Termina): filme de 2002, dirigido por Michael Winterbottom, que retrata a cena musical de Manchester do fim da década de 70 ao início dos anos 90 com base na gravadora Factory e em suas duas grandes estrelas: o Joy Division e o New Order.

“Control”: lançado em 2007 e totalmente em preto e branco, com direção de Anton Corbijn. Traz toda a trajetória pessoal e artística de Ian Curtis. Baseada no livro “Touching from a Distance”, de Deborah Curtis.

LEIA MAIS

“Touching from a Distance: Ian Curtis and Joy Division”:Livro escrito por Deborah, esposa de Ian, lançado em 1995. Trata de maneira direta e nunca antes vista a trajetória do compositor. Deborah escancara problemas como infidelidade, a relação de Ian com a epilepsia e sua tímida experiência como pai.

“Unknown Pleasures” (2015): O baixista Peter Hook, autor do livro, traz detalhes da trajetória da banda, com muitos casos que, até então, não tinham vindo à tona. A análise da história do Joy Division a partir da visão de um de seus integrantes torna a obra muito especial.

“Unknown Pleasures - o Livro do Disco” (2004): O crítico musical Chris Ott disseca toda a produção do álbum, com detalhes sobre as gravações, as músicas e a trajetória da banda durante o período de concepção do disco.

A DISCOGRAFIA

“Unknown Pleasures” (1979)
“Closer” (1980)
“Still” (1981), que traz sobras de estúdio e o último show da banda, gravado em Birmingham no dia 2 de maio de 1980, 16 dias antes do suicídio de Ian Curtis

Ouça faixas do disco:

 

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