Música

Davi Moraes lança EP em homenagem ao pai, Moraes Moreira: 'Explosão de gratidão'

Projeto 'Todos Nós' traz parcerias com artistas como Joyce Moreno, Carlinhos Brown e Marina Lima

Por Alex Ferreira
Publicado em 11 de janeiro de 2021 | 06:00
 
 
 
normal

A primeira vez que Davi Moraes, de 47 anos, dividiu o palco com Moraes Moreira foi numa noite nublada de janeiro no ano de 1985. Era a edição original do Rock in Rio, e Davi, com 11 anos, empunhando um cavaquinho elétrico, mostrou uma versão reverberada do clássico “Brasileirinho” para uma plateia de mais de 100 mil pessoas. 

“Ele tinha uma coisa incrível que me tocava muito, que era sempre acreditar em mim. Ele me punha para subir no palco com ele e me incentivava ‘vamos lá, vamos lá’. Isso me moldou como pessoa e me deu convicção como músico”, relembra com emoção o artista, 36 anos após o show antológico ao lado do pai no Rio de Janeiro.

“Imagine, colocar um garoto para tocar chorinho em frente a uma multidão de metaleiros em um festival importante daqueles. Esse é o maior ato de confiança que um pai pode demonstrar para um filho. Sinto muita falta da nossa parceria”, confessa ele, por telefone, em um misto de surpresa, gratidão e admiração.

Lembranças como essas têm servido de combustível para o guitarrista desde que o pai, um dos mais importantes músicos brasileiros e fundador dos Novos Baianos, partiu, em abril do ano passado, aos 72 anos. Como se não bastasse tamanha perda, Davi viu também irem embora a mãe, Marília Mattos, e a avó Dona Cândida, que morreu vítima da Covid-19, aos 97 anos. “Difícil digerir essas pancadas todas. Me sinto perdido no meio de tanta dor e saudade”, lamenta com a voz embargada.

A relação musical e de amor entre pai e filho é a principal força que move “Todos Nós” (Biscoito Fino), mais novo EP de Davi Moraes, que já está disponível nas plataformas de streaming.

Pensado como uma homenagem ao legado de Moraes Moreira, o trabalho traz quatro faixas – sendo três delas inéditas e uma regravação do clássico “Davilicença” – todas nascidas da parceria de Davi com um time de artistas e amigos próximos da família, como Joyce Moreno, Carlinhos Brown e Marina Lima. 

“Esse disco simboliza uma explosão de gratidão por esse pai, amigo, companheiro e mestre que trouxe tanta alegria para a vida de muita gente”, diz o cantor, compositor e multi-instrumentista.

Davi explica ainda que as gravações, além de funcionarem como um escape para lidar com as perdas, são uma maneira de manter viva a memória artística do pai.

“Ele merece esse reconhecimento pelo músico e ser humano que foi. Reunir todas essas participações maravilhosas nesse trabalho mostra como ele era respeitado e querido. Acima de tudo, colocar esse disco na praça tem um cachê espiritual imensurável. É uma forma de aliviar a saudade, fazer carinho na saudade”, complementa.

‘Um bálsamo contra dores e perdas’

Com produção musical de Alexandre Kassin, habitual colaborador de Davi em sua carreira solo, “Todos Nós” conta com material novo e surpresas arrebatadoras, como a canção “Aquele Abraço do Gil”. Feito em parceria com a cantora Joyce Moreno, o samba conta com uma das últimas letras escritas por Moraes Moreira e serviu como inspiração central para o disco. 

“Essa música nasceu de um encontro inusitado entre meu pai e a Joyce em uma padaria da Gávea. Ele me contou na época que deu a letra para Joyce e pediu para que ela escrevesse uma melodia. Dois dias depois, ela mandou de volta esse samba maravilhoso que me deixou encantado”, recorda. 

O músico revela que pediu permissão aos dois para gravar a canção no seu próximo álbum, porém com a morte do pai o projeto foi pausado. Somente quando Joyce sugeriu, pouco tempo depois, que a música fosse lançada como uma homenagem a Moraes Moreira, foi que a ideia do EP se materializou.

“Ela falou ‘Vamos fazer um single dessa música para homenagear seu pai’, e eu pensei que seria muito pouco lançar só uma canção. Então eu decidi que um EP seria o formato ideal naquele momento e corri atrás de outras canções para completar o projeto. Fiquei muito contente com o resultado final”, diz.

Outra faixa de destaque de “Todos Nós” é “Aos Santos”, parceria de Davi com Carlinhos Brown. Em versos cheios de profecia poética, o bolero contempla o peso da ausência logo após a partida de quem se ama (Você foi embora, me deixou aos prantos e apaixonado, consultei os santos).

“Eu mandei a música para o Carlinhos, e ele conseguiu traduzir perfeitamente o sentimento que eu buscava expressar em letra. Foi inusitado, mágico mesmo, ver ali nos versos dele, tudo que eu queria dizer para o meu pai”, revela abismado.

Marina Lima faz duo com Davi em “Davilicença”, única regravação do disco. Composta por Moraes Moreira e Armandinho Macedo, a canção foi lançada pelo ex-Novos Baianos em 1977, em seu segundo álbum solo, “Cara Coração”.

“Foi maravilhoso esse dueto com a Marina, que é prima-irmã da minha mãe e com quem a gente sempre teve uma ligação forte. Inclusive, ela presenciou meu pai e Armandinho compondo essa canção lá em casa no fim dos anos 1970”, relata o artista.

Já “O Cantor das Multidões”, composição de Mú Carvalho e Tuca de Oliveira, fecha o EP. Escrita em tom biográfico, a faixa conta com a participação de Mú, no piano, e Dadi Carvalho, no baixo.

“Essa é uma canção muito bonita que me tocou muito. Achei que a letra tinha semelhanças com a história de vida do meu pai e por isso quis incluí-la no disco. Tenho um orgulho enorme de poder ter trazido o Dadi e o Mú para o projeto. Eles são representantes de A Cor do Som, uma banda de enorme importância para a história do meu pai. Não podiam faltar nessa homenagem”, elogia.

Armazém de relíquias

Davi também confessa que pretende trabalhar no garimpo de material inédito do pai para possível lançamento ainda em 2021. A ideia é reunir poemas e textos não publicados que devem ganhar trilha sonora composta pelo herdeiro de Moraes Moreira. 

“Com certeza vamos ter material inédito para ser lançado no futuro. O plano é compilar o material que ele deixou, inclusive muitos dos poemas lindos que ele escreveu e nunca publicou. Vamos reunir tudo e decidir que destino a gente vai dar a isso. É importante que a obra dele vá para o ar, não pode ficar guardada em uma gaveta. Queremos trazer os parceiros mais próximos dele para participarem também, então tem uma grande história vindo por aí. É minha missão cuidar da arte dele com carinho”, promete.

 

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!