Artes cênicas

Dilemas e reflexões femininos inspiram espetáculos da dançarina Rosa Antuña

Coreógrafa é integrante da companhia Mário Nascimento

Por Rafael Rocha
Publicado em 21 de agosto de 2019 | 03:00
 
 
 
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Exatamente tudo pode inspirar uma dançarina, mas são as questões femininas que têm atraído a força criativa de Rosa Antuña. Mesmo dentro desse recorte, a régua da artista pode perpassar por questões fundamentais, como a opressão à qual as mulheres ainda são submetidas, ou mesmo a gatilhos aparentemente banais, como o simples ato de comprar um vestido.

As vivências da bailarina são o material de trabalho que deu origem aos três espetáculos que ela apresenta a partir de sexta-feira, que, em série, receberam o nome de 'Trilogia do Feminino'.

Sozinha no palco, Rosa usa o espaço como oportunidade para demonstrar ao público belo-horizontino o resultado de suas pesquisas artísticas que ultrapassam as fronteiras da dança. Vítima de algumas contusões que mudaram o curso de sua carreira profissional, Rosa usou estudos em teatro e música como uma espécie de muleta. Muito da transversalidade de seus trabalhos vêm daí. Dessa forma, números de dança contemporânea aparecem entremeados a incidências musicais e interseções textuais.

A dramaturgia aparece mais presente em 'Mulher Selvagem', montagem de 2010 que é a primeira da série a ser apresentada agora. A peça é inspirada no livro 'Mulheres que Correm com os Lobos', da pesquisadora Clarissa Pínkola Estés. Considerado um clássico da literatura feminista, a obra demonstra como a natureza instintiva da mulher foi domesticada ao longo do tempo. Na proposta de Rosa, o palco recebe movimentos que resultam da reflexão sobre as dores da mulher. “Mas o espetáculo vai para um caminho do autoencontro, da solução e da libertação. Conduz a mulher a um caminho”, explica.

Ícone internacional da dança, a coreógrafa e diretora alemã Pina Bausch, morta há dez anos, surge na peça 'O Vestido'. Em certo dia, a dançarina mineira ignorou um belo vestido que habitava a vitrine da loja de Ronaldo Fraga. Dias depois, ela decidiu retornar e comprar a peça, que já havia sido vendida. Na terceira visita ao endereço, outro vestido idêntico apareceu. “Eu disse à vendedora que o vestido parecia figurino da Pina Bausch, e ela me explicou que aquela coleção era inspirada na coreógrafa, que pra mim é uma grande inspiração, então tive que comprar”, relembra. “Mas pensei: onde vou usar isso? Então pensei em criar um espetáculo para usar o vestido”, complementa.

Uma residência artística no Odin Teatret, na Dinamarca, é o estopim de 'A Mulher que Cuspiu a Maçã', o solo derradeiro. Com direção de Roberta Carreri, o trabalho é inspirado no livro 'A Cama na Varanda', da psicóloga Regina Navarro Lins, e cita frustrações que acompanham as mulheres ao longo da história.

Para a artista, a oportunidade de o público assistir aos três espetáculos em perspectiva é algo interessante. “Isso traz outras camadas de reflexão, pois o assunto é amplo. Precisamos nos liberar das dores das mulheres e curar nossas feridas”, arremata.

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