Nesta sexta-feira

Entre o erudito e o popular, Orquestra Ouro Preto celebra 20 anos com live

Músicos sobem ao palco do Sesc Palladium com repertório que também contempla Beatles e Alceu Valença; concerto será exibido a partir de 20h30

Por Bruno Mateus
Publicado em 21 de agosto de 2020 | 07:06
 
 
 
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Na noite desta sexta-feira (21), quando o maestro Rodrigo Toffolo pisar no palco para reger mais um concerto, um longo filme passará pela sua cabeça. Um filme que compreende uma história de 20 anos, com capítulos que trazem a imagem do esplendor dos teatros lotados a aplaudir uma apresentação até a desesperança em certos momentos, quando a situação apertou e o futuro parecia um imenso vazio.

Poder, enfim, celebrar o aniversário de duas décadas da Orquestra Ouro Preto, ainda que longe do público, é um momento que deixa os dias cheios de expectativas. “Estamos muito ansiosos para fazer uma leitura do que foram esses 20 anos. É um momento muito especial, penso em como tudo aconteceu, como deu certo. Quando começarmos a tocar, as pessoas vão ver a orquestra em sua essência, excelência e versatilidade”, comenta o maestro.

Direto do Grande Teatro do Sesc Palladium, Toffolo e 28 músicos – todos devidamente testados quanto à Covid-19 e respeitando o protocolo sanitário do evento ¬– celebram essa importante data com um concerto emblemático tanto do ponto de vista da efeméride quanto do repertório, que vai passear pelos tantos universos musicais nos quais a orquestra entra sem censuras e caretices bloqueadoras.

Desde o erudito até o rock orquestrado dos Beatles, passando pela música de Milton Nascimento e Fernando Brant e também pela obra do parceiro Alceu Valença, além de clássicos do cinema, a apresentação inédita marca o 20º aniversário de um companhia que nasceu com um pé fincado na vanguarda e outro na contemporaneidade. 

Esse trânsito entre mundos estéticos e musicais distintos marcou desde sempre a trajetória da orquestra, que é fruto da união do Quarteto Ouro Preto, dedicado ao erudito, com o trio Triloz, focado totalmente na música popular. Rodrigo Toffolo fazia parte dos dois grupos. O primeiro concerto, na Casa da Ópera em Ouro Preto, já tinha a marca do experimentalismo.

A criação de um repertório eclético, pondera Toffolo, sempre foi almejada conscientemente pela orquestra. “Fizemos uma adaptação da sinfonia 29 de Mozart com uma série de músicas portenhas arranjadas pelo Rufo”, recorda o regente.

Rodrigo Toffolo se refere a Rufo Herrera, bandoneonista argentino radicado em Minas Gerais desde o fim dos anos 70 e personagem fundamental na criação da orquestra em 2000, juntamente com Ronaldo Toffolo. Herrera, no campo das artes, e Toffolo, na área da metalurgia, eram professores na Universidade Federal de Ouro Preto e, mesmo em lados diferentes na academia, dividiam a paixão pela música e a vontade de dar a Ouro Preto uma companhia profissional.

“A orquestra me deu toda essa satisfação da minha ideologia, do meu princípio de que a gente faz música para os outros. Claro que não achava que ia chegar tão longe. Pensava que íamos acontecer em Minas, mas em todo o país e fora dele com sucesso e respeito eu não imaginava”, diz Rufo Herrera.

Para Ronaldo Toffolo, a caminhada de duas décadas culmina, hoje, em um momento de realização plena e um “orgulho simples e verdadeiro”: “Na escrita de nossa vida, com todas as falhas existenciais, todos os erros, temos a alegria de ver que alcançamos uma contribuição, e ela não será esquecida. Algo está registrado, um fragmento na história dos homens e dos tempos civilizatórios”. 

Toffolo lembra que o ano de 2008 representou um salto na história do grupo, que deixou de ser um projeto acadêmico e passou a ter vida própria. Mas aquele ano também trouxe a crise econômica, a perda de um importante patrocínio e, quando tudo parecia perdido, a inesperada chegada de um novo apoiador, tudo em questão de poucos meses. “A crise de 2008 abalou muito a orquestra, mas a vida traz essas belezas em meio às incertezas e ás dificuldades”, pondera Rodrigo. 

O violinista Márcio Valladão ainda se lembra do primeiro ensaio com a Orquestra Ouro Preto, em 2005. Era um sábado de manhã na ex-capital de Minas, e a ansiedade consumia o músico, que não via a hora de conhecer os novos colegas. A entrada de Valladão no grupo se deu meio por acaso – ele chegou para substituir um músico que saiu de licença médica, depois se envolveu com outros projetos e nunca mais voltou. Hoje, ele é da turma mais antiga a integrar o grupo. Valladão diz que todos os concertos são especiais e cada um deles tem algo bom para ser lembrado. 

Entre viagens para países como Argentina, Bolívia, Inglaterra e Portugal, além dos vários Estados brasileiros que já receberam os concertos da orquestra, foi em uma noite de dezembro de 2018, no Largo do Rosário, no centro histórico de São João del Rei, onde ele nasceu e se encantou com a música ainda na infância, que Valladão sentiu uma das maiores emoções nesses 15 anos. “Muitos amigos pediam para que tocássemos lá, então surgiu a oportunidade. A orquestra se apresentou na minha terra, para o meu povo. Foi algo inesquecível”, conta.

Do interior de Minas a Liverpool, de Mozart a Alceu Valença, do erudito à música pop, a Orquestra Ouro Preto chega ao 20º aniversário com uma produção relevante, ativa e diversa, festejada em um concerto que simboliza 20 anos de algo que surgiu para celebrar a música em suas várias formas. “Nossa orquestra é a cara de Ouro Preto. É a senhorinha varrendo a rua e os casarões de três séculos com estudantes de vinte e poucos anos e suas ansiedades. A cidade convive com o velho e o novo diariamente”, diz o maestro Rodrigo Toffolo.

Educação também é o foco da orquestra

Desde o seu surgimento em um espaço acadêmico, a Orquestra Ouro Preto entendeu e valorizou o caráter formador da música. Fora dos palcos e das grandes plateias, a companhia mantém dois projetos socioeducacionais. Um deles é a Academia Orquestra Ouro Preto, para jovens músicos entre 18 e 28 anos, que conta, atualmente, com 42 violinistas, violistas, violoncelistas, contrabaixistas e percussionistas. Todos eles recebem uma bolsa mensal para participar do projeto, que em tempos de pandemia tem realizados as aulas de forma online. 

Além de lapidar o talento dos músicos, Toffolo acredita que a iniciativa deixa um recado fundamental: “Quando eles recebem uma bolsa para estudar música, esse valor não só dá responsabilidade, mas valoriza cada um deles e mostra que a arte pode contribuir financeiramente. É muito simbólico você chegar em casa e falar: ‘Pai, a conta de luz é comigo’”, diz o regente. A cada três anos, a turma da Academia é renovada após passar por um criterioso processo de seleção.  

Outro projeto do qual o regente se orgulha é o Núcleo de Apoio às Bandas Marciais, presente em dez cidades de Minas, duas do Ceará e uma do Rio Grande do Norte. “O legal é que você pega pessoas dos 10 aos 80 anos de idade. É um núcleo muito importante e enaltece as bandas de música que tocam no interior”, ele comenta.

Na quarentena, o ensino também é feito a distância, e os grupos ganham uma bolsa por quatro meses. “A orquestra sempre teve esse olhar para o que está acontecendo a sua volta. Um projeto que chega à sua maturidade consegue entender exatamente essa responsabilidade”, destaca Rodrigo Toffolo.

Programe-se

O concerto que celebra os 20 anos da Orquestra Ouro Preto será transmitido ao vivo do palco do Grande Teatro do Sesc Palladium nesta sexta (21), às 20h30, pelo canal do grupo no YouTube

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