Novidades

Instituto Inhotim apresenta nova exposição e novas obras comissionadas

A partir de hoje, museu apresenta novidades ao público, com trabalhos dos artistas Lucia Koch, Rommulo Vieira Conceição e Aleksandra Mir

Por Patrícia Cassese
Publicado em 28 de agosto de 2021 | 03:00
 
 
 
normal

Neste 2021, ano em que o Instituto Inhotim completa 15 anos de funcionamento, a expectativa era de uma agenda plena de comemorações. No ano passado, porém, a pandemia da Covid-19, que à época já provocava estragos mundo afora, em particular na China e em países da Europa como a Itália, irrompeu com força também no Brasil, impingindo a toda gente um novo modo/estilo de vida.

As medidas de isolamento, tomadas para tentar mitigar o contágio, fizeram com que muitos espaços dedicados à arte e à cultura tivessem que passar meses com as portas fechadas ao público – com breves respiros propiciados por um aparente controle da situação, como no final do ano passado, que depois revelou-se efêmero. Com o avanço da vacinação mundo afora, cria-se, agora, uma nova perspectiva. A arte, mais uma vez, pulsa. 

Não por outro motivo, neste sábado, o Inhotim volta a apresentar novidades ao público. Na verdade, três, a começar da exposição “Entre Terras”, individual da artista polonesa Aleksandra Mir, que já ocupa a Galeria Praça, com quatro trabalhos potentes. São desenhos em grande escala da série “Mediterranean” (2007), à qual ela deu início após uma residência na Sicília. Um conjunto que, como indicado pelo material de apresentação, a artista “questiona as forças sociopolíticas que moldam as identidades nacionais”. 

Mas não só. Também neste sábado, quem visitar o Inhotim vai poder apreciar os novos frutos do Comissionamentos Inhotim, programa do instituto que convida artistas para desenvolver obras inéditas a partir de experiências com a instituição e seu entorno. Desta vez, o chamamento foi feito a Lucia Koch e Rommulo Vieira Conceição. Em uma visita a convite da instituição, ontem, jornalistas de vários Estados do Brasil puderam conferir em primeira mão as novas apostas desse oásis artístico fundado por Bernardo Paz. Na ocasião, a imprensa foi acompanhada pelo curador do Inhotim Douglas de Freitas e pelos dois artistas citados. 

Baiano de Salvador, Rommulo Vieira Conceição reside há mais de 20 anos em Porto Alegre, onde, em seu ateliê, dá à luz obras que transitam por suportes visuais diversos. A partir de agora, quem visitar o Inhotim terá a oportunidade de apreciar a obra “O Espaço Físico Pode Ser um Lugar Abstrato, Complexo e em Construção”, harmonicamente instalada ao ar livre, no Jardim Sombra e Água Fresca, perto da Cosmococa. Arcos, cúpulas, paredes, grades, andaimes, quartinhas e frontões compõem o impactante trabalho do artista. Acompanhando a visita, Rommulo pontuou aos jornalistas o seu apreço ao elemento cor. “Aqui, trabalhei com as cores primárias e as complementares”, destacou, acrescentando também a opção pelas superfícies brilhantes. 

Segundo ele, o embrião da obra pode ser localizado em 2013, ano em que, atentou, o país registrou um claro recrudescimento da intolerância e da polarização. A obra traz elementos que remetem o público a uma miríade religiosa – da matriz africana, que, lembra ele, segue sofrendo ataques,  “aos frontais das neorreligiões” – passando por referências estéticas ao judaísmo e ao islamismo, entre outras. No entanto, grades e outros tipos de obstáculos, como um muro, indicam que os caminhos nem sempre são facilmente transponíveis. E, se um aspecto de parque infantil se delineia, este vem imbricado a uma característica desses espaços destinados a crianças: “São locais onde você pode, mas, ao mesmo tempo, não pode”, diz Rommulo, referindo-se às normas vigentes para o uso dos brinquedos, que variam de acordo com condições como idade. Os andaimes, por seu turno, instigam o visitante a pensar as possíveis construções para o futuro do Brasil. 

Gaúcha radicada em São Paulo, Lucia Koch ocupa espaços da cidade de Brumadinho e do Instituto Inhotim com “Propaganda” (2021), série na qual mostra um conjunto de intervenções em outdoors, feitas com fotografias de caixas e embalagens vazias que ela coletou não só por lá, como também em Belo Horizonte. As cinco obras em Brumadinho ocupam outdoors que ressalte-se, já estavam por lá estruturados, enquanto os que foram dispostos no Inhotim, instalados – inclusive no meio do lago. Há, ainda, um trifásico. "Inclusive, esse painel é um hit, é super, super quente, tem vários espalhados por Brumadinho, feitos por um artista de uma empresa de comunicação visual. Fiquei imediatamente atraída, porque nunca tinha experimentado essa coisa meio cinemática de uma imagem se transformando em outra", diz Lucia

No caso dos de Brumadinho, vale ao visitante ficar de olho, já no centro da cidade, para já apreciá-los. "Tnho um amigo arquiteto, de BH, que falou: 'Que bom ver um projeto do Inhotim que se estende para Brumadinho'. Mas é um pouco ao contrário: estou estendendo para Inhotim o que comecei a pensar para Brumadinho", fala a artista. 

Lucia contou que já vem trabalhando com essa pesquisa há mais de 20 anos, tendo inclusive desenvolvido obras que dialogam com as atuais em Rabat, no Marrocos, e na Bienal de Lyon, na França. "Essas fotografias sempre são feitas para um lugar específico, ao menos a primeira apresentação tem a ver com o contexto para o qual foi pensada.  E, para que provoquem um certo estranhamento, eu preciso de uma certa familiaridade também. Então, se eu vou para o Marrocos, eu vou procurar uma caixa de um produto que as pessoas precisam reconhecer - assim, a operação toda se esclarece".

Em Rabat, em 2019, ela foi a convite de um programa público para criar terrenos de proximidade, de sociabilidade na cidade. "E aí eu  encontrei, na rua, uma caixa de um  biscoito super colorido, que me parecia muito popular, tipo uma bolacha Maria deles - não sei o que seria similar agora no Brasil, talvez um Doritos". Lucia comprou duas caixas e inverteu a embalagem. "Coloquei (o lado) que externo para dentro. E era uma pintura super africana. Ali, eu estava adorando a ideia de finalmente estar fazendo alguma coisa na África. Então, a imagem dessas duas caixas com a embalagem invertida, ampliadas, foram outdoors numa área que havia sido designada como área de sociabilidade, um pouco para investigar. Queria  repercutir a presença daquele dispositivo visual ocupado por uma publicidade que aparentemente não vendia nada. Que não informava nada, mas que, ao mesmo tempo, era familiar à população". 

Em Lyon, ela esteve em uma convocação de artistas ("inclusive outros brasileiros") desafiados a criar trabalhos para uma área que era uma antiga fábrica de seda. "Visivelmente era uma área da cidade em pleno processo de gentrificação - e, bem, nada como uma Bienal para fazer valorizar (ainda mais) a área. Aliás, é muito comum a gente (artista) ser colocado nesta posição, de participar de processos de gentrificação. Mas é raro a gente conseguir responder a isso, e, lá, eu fiz uma foto ampliada em escala de outdoor que remetia àquele processo de incorporação imobiliária - e que era tão vertiginoso que o prédio atrás do cartaz foi vendido e demolido ainda durante o período da Bienal".

No caso do Inhotim, o projeto foi pensado a partir de um momento específico da vida de Brumadinho, mais precisamente, há cerca de dois anos, ou seja após a tragédia do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em 25 de janeiro de 2019, quando, mesmo em meio ao trauma, aos ecos da tragédia, ao lamento e ao choro, por tantas vidas lamentavelmente perdidas, ceifadas, por tanta natureza destruída, a localidade vivenciou, paradoxalmente, um certo impulso local. "Isso se revelava no aumento de dispositivos visuais publicitários espalhados pela cidade. Outdoors anunciando até condomínios, novos bairros. E mesmo na presença de carros importados circulando. Uma diferença na paisagem bem significativa". 

Ela prossegue: "E a outra coisa que me interessou muito experimentar era ter a mesma imagem inscrita na paisagem de Brumadinho e inscrita no ambiente de Inhotim. O que é o ambiente de Inhotim para mim? Na verdade, pra mim, sempre foi difícil pensar num projeto aqui. Sabe esses lugares que as pessoas vão e todo mundo tem uma ideia do que fazer um dia? Nunca tive essa ideia. Estou acostumada, habituada a responder a lugares que são menos 'controlados'. A condições não tão normais de temperatura e de pressão. Sou normalmente mais instigada por lugares nos quais as condições são extremas, anormais, ou onde há alguma coisa acontecendo. Mas me interessou muito a oportunidade de ver essas imagens duplicadas, aparecendo em Inhotim por quem já foi em Brumadinho e vice-versa. Porque eu imagino, entendo, que a diferença essencial entre esses dois ambientes pulsa. Deixa de ser algo subliminar, algo que se possa ignorar".

As obras de Lucia passam a pertencer ao Inhotim, mas, neste momento inicial, ficam expostas no período de um ano. “Acho interessante passar essa ideia de um dispositivo de publicidade ocupado por algo que, aparentemente, não está voltado à venda de nada”, precisou.  "A ideia de que por um ano esses painéis não vão se constituir publicidade de seguros, cursos de informática... E, ao mesmo tempo, vão estar ocupados por uma imagem que não esclarece muito o que está fazendo ali.. Esse tipo de perturbação era é que me interessava colocar naquele lugar". 

No caso da exposição de Aleksandra Mir – artistas atualmente radicada em Londres, embora já tenha passado por quatro migrações –, da citada série “Mediterranean”, a artista se valeu das canetas sharpie nas mãos, explorando do preto ao cinza sobre fundo branco, com o desgaste da caneta. O conjunto de quatro obras – “Headache” (dor de cabeça), “Heartbreak” (decepção amorosa), “Heatwave” (onda de calor) e “Iceage” (era do gelo) – pode ser visto na Galeria Praça, na mostra individual “Entre Terras”. 

Inaugurações no Inhotim 
Novas obras de Lucia Koch e Rommulo Vieira Conceição e mostra “Entre Terras”, de Aleksandra Mir 

Visitação: de quinta a sexta-feira, das 9h30 às 16h30; e aos sábados, domingos e feriados, das 9h30 às 17h30 
Ingressos: R$ 22 (meia) e R$ 44 (inteira), no Sympla 
Entrada gratuita na última sexta-feira de cada mês, exceto feriados, mediante retirada prévia através do Sympla 
***Moradores de Brumadinho cadastrados no programa Nosso Inhotim e Amigos do Inhotim também possuem entrada franca

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!