Michael Jackson (1958-2009) não morreu. Se para alguns a frase diz respeito à permanência de uma obra que continua repercutindo, para outros ela é literal e levada ao pé da letra, com teorias que garantem que o astro, falecido há uma década, vive anonimamente nos confins do planeta. “A obra impactante do Michael sempre esteve ao lado da figura controvertida que ele foi. No caso dele, é impossível evitar essa dualidade”, afirma o jornalista e crítico musical Carlos Albuquerque.
Sem perder a majestade de rei absoluto do pop, o artista se habituou a conviver, ainda em vida, com episódios que combinavam excentricidades a denúncias graves que o levaram ao banco dos réus. O mais novo e ruidoso capítulo veio com o lançamento do documentário “Deixando Neverland”, dirigido por Dan Reed e exibido pela HBO em janeiro deste ano. “Fiquei meio chocado com o documentário. Não ouço mais as músicas como antes”, admite o crítico musical Hagamenon Brito.
Com quatro horas de duração, o longa-metragem foca sua narrativa nos depoimentos do coreógrafo Wade Robson e do músico James Safechuck, que acusam Michael de tê-los molestado sexualmente. “Nenhuma denúncia vai ser capaz de tirar o valor artístico produzido por Michael. Não tem como mudar a história construída por ele no pop e na black music, mas, a partir de agora, é preciso acrescentar que, apesar do talento e da genialidade, ele foi um pedófilo cruel”, aponta Brito.
Para Albuquerque, trata-se de um filme “dramático e triste”. “O único problema é que o acusado não está mais aqui para se defender. Mas é um documentário sóbrio, sem tintas sensacionalistas, algo que, pelo tema, poderia facilmente acontecer”, opina. Brito concorda. “Acredito muito no documentário. É sintomático quando pessoas como a (apresentadora) Oprah Winfrey, uma importante representante da cultura negra, mudam de opinião (ela apoiou publicamente os acusadores). Não tem nada de sensacionalismo”, declara.
O crítico ainda se vale de outras passagens na vida de Michael para corroborar sua tese. “Quem lê sobre pedofilia sabe que existe um comportamento que vai se repetindo. Como, por exemplo, a cada turnê o Michael aparecer de mãos dadas com um menino, como se fosse um novo amor. Aquilo é muito didático e espanta como a gente não percebia na época”, observa Brito. “É um caso para analista, de uma pessoa sem infância, que teve uma criação terrível. Ele foi prisioneiro de um pai violento e aborda isso nas músicas”, completa.
Visão. A ideia de que “a imagem de Michael ficou arranhada” leva Albuquerque a outra constatação. “O legado dele sempre foi visual. Ele fez essa transição para o videoclipe melhor do que qualquer outro artista do mundo, quando o formato começou a imperar”, avalia. A união com o cineasta John Landis, que resultou no “assombroso” videoclipe de “Thriller”, é apenas um dos exemplos.
“O primeiro impacto não foi escutar a música: foi assistir o vídeo daquela figura longilínea, quase um herdeiro do Fred Astaire dançando pra caramba”, rememora Albuquerque. A mudança de cor de pele e as cirurgias plásticas também provocaram abalos. “Ele gostava de traços femininos, era meio andrógino, meio mutante, quase um precursor dessa atual estética k-pop”, finaliza Brito.
Recorde mundial. O disco “Thriller”, de 1982, é até hoje o mais vendido da história, com 65 milhões de cópias.
“Nunca houve um cantor negro tão poderoso como o Michael Jackson. Ele sempre gerou esse fascínio.” Hagamenon Brito, crítico musical
“A influência do Michael vai além da música: está na moda, no visual e nas atuais discussões de gênero.” Carlos Albuquerque, crítico musical
Tributo. Quando Michael Jackson morreu, aos 50 anos, vítima de uma overdose de medicamentos, o astro preparava um retorno triunfal aos palcos, com a turnê “This Is It”. Como o aguardado espetáculo nunca aconteceu, o paulista Rodrigo Teaser, 39, sósia de Michael, resolveu presentear os fãs com o “Tributo ao Rei do Pop”, realizado por ele há 7 anos e que “nasceu inspirado” em “This Is It”.
“Hoje, o show se tornou mais abrangente, porque o público pedia e, com o tempo, fomos agregando outras músicas ao repertório”, conta Teaser, ao dizer que o roteiro do show é “tão variado quanto a obra” do cantor. Neste domingo (23), ele sobe ao palco do KM de Vantagens Hall (avenida Nossa Senhora do Carmo, 230, São Pedro), às 18h, com ingressos entre R$ 45 e R$ 140, para mostrar a sua versão de sucessos como “Billie Jean”, “Thriller” e “Black or White”.
A empreitada tem a colaboração do coreógrafo LaVelle Smith, que trabalhou com Michael, e da guitarrista Jennifer Batten, que participou de todas as turnês do astro. “O maior legado do Michael foi não ter medo de ousar. Ele absorveu diferentes culturas, do rock ao soul”, enaltece. A relação com o ídolo começou quanto Teaser tinha 5 anos. “Minha mãe conta que eu ficava imitando as coreografias no espelho”, revela.
O primeiro videoclipe que o marcou foi “Smooth Criminal”, aos 9 anos. Teaser informa que as denúncias que vieram à tona com o filme “Deixando Neverland” resultaram no cancelamento de seus shows nos Estados Unidos, mas não abalaram sua admiração. “Ele morreu como um homem livre perante a lei. Acho o documentário tendencioso, com erros de datas e locais”, critica.
Assista “Thriller”, videoclipe emblemático de Michael Jackson: