O destino incerto e uma esperança no fim do túnel. Essa é, em poucas palavras, a retórica de “O Holandês Errante”, último espetáculo montado pela Orquestra Sinfônica de Minas Gerais em 2018, em conjunto com o Coral Lírico, ambos ligados à Fundação Clóvis Salgado. A narrativa da ópera resume a atual situação da própria Sinfônica. “Vivemos um momento de expectativa e incerteza sobre qual será a política cultural implementada. Como haverá troca de governo, a gente espera por mudanças, só não se sabe quais serão”, afirma o maestro Silvio Viegas.

Fundada em 1976, a Sinfônica é a mais antiga das orquestras profissionais da cidade. Os ensaios e as apresentações acontecem no Palácio das Artes. Com um currículo invejável, a orquestra se notabilizou nos últimos anos por levar aos palcos óperas inéditas na capital mineira, casos de “Romeu e Julieta” (de Charles Gounod), “Porgy e Bess” (de George Gershwin), “Norma” (de Vincenzo Bellini) e a citada “O Holandês Errante” (de Richard Wagner).

Apesar disso, Viegas não vê apenas motivos para comemorar. “Nossa situação é limítrofe. Quero dizer com isso que os nossos músicos estão entre os mais malpagos do Brasil na comparação com orquestras que não têm a tradição e a importância da Sinfônica”, declara. “Isso interfere no crescimento da orquestra, porque nos tira a capacidade de atrair novos músicos e dar tranquilidade aos que estão conosco para desenvolver um trabalho tão exigente e minucioso”, completa o regente.

De acordo com Viegas, os últimos três anos “foram de grande apoio do governo de Minas Gerais para a realização das temporadas, o que viabilizou repertórios importantes”. Sem saber o que vem pela frente, ele reafirma a intenção de “deixar a casa arrumada”.

“Estamos nos programando com base em tudo o que vivemos nos últimos anos, com o pensamento artístico que nos guiou”, observa. Na opinião do maestro, a marca da Sinfônica é a diversidade. “Somos a mais democrática das orquestras, temos um leque de atuação grande, que abarca música popular, ópera, concertos sinfônicos, balé”, enumera ele, que não esconde outro orgulho. “A ópera é um gênero amado pelo público e, em Minas, uma responsabilidade nossa”, afiança.

A Filarmônica é a outra grande orquestra do Estado, tanto numericamente quanto no destaque. Regida por Fabio Mechetti desde sua criação, ela superou dificuldades na comemoração de seus dez anos de existência. Durante todo o 2018, a Filarmônica sofreu com a falta de verbas e o atraso de repasses da Secretaria de Cultura. O atual acordo com o governo expira no primeiro semestre de 2019, o que vai exigir um novo edital de seleção.

Ao mesmo tempo, a orquestra viu aumentar o seu número de assinantes, que chegou a 3506. Esse foi um dos fatores que permitiu cumprir toda a programação e já anunciar a agenda para 2019, que prevê 57 concertos. “Estamos vivendo com o mínimo. Mas graças a um esforço interno não tivemos que cancelar nada, os salários estão em dia, e o público foi preservado”, diz Mechetti. Em uma década de história, a Filarmônica realizou 816 concertos, sendo que entre 2015 e 2018, 94 deles foram gratuitos ou a preços populares.

 

Os desafios das pequenas

Além das orquestras de grande porte, que possuem muitos integrantes e uma variedade maior de instrumentos, Belo Horizonte oferece ao público outra categoria que se debruça sobre a música erudita. São as orquestras de câmara.

O nome vem do italiano “camera”, que pode ser traduzido como “quarto” ou “sala”, já que elas se apresentam em lugares menores, geralmente fechados. Fundada em 1986, a Orquestra de Câmara Sesiminas acumula, em seus 32 anos de tradição, espetáculos emblemáticos ao lado de ícones como o maestro João Carlos Martins e os pianistas Nelson Freire e Arthur Moreira Lima. Mantida pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), a orquestra não escapou da crise.

“O número de concertos caiu de 40 para 30 entre 2017 e 2018. Com esse corte, houve também uma perda salarial para os músicos”, conta o maestro assistente Felipe Magalhães, que em algumas ocasiões substitui o titular, Marco Antônio Maia Drumond.

Os efeitos da recessão econômica também atingiram a Orquestra Opus, outra com formação de câmara. Criada em 2006 pelo maestro Leonardo Cunha, a Opus sobrevivia graças a leis de incentivo até 2014. A partir de 2015, Cunha passou a investir dinheiro do próprio bolso para manter a orquestra de pé.

“Como não temos uma instituição mantenedora, procuramos ter apelo junto ao público. Nosso projeto Orquestrando o Brasil acendeu essa fagulha”, afiança o maestro.

Polêmica

Em outubro, Romeu Zema criticou a sede da Filarmônica, cuja construção foi finalizada em 2015, e a definiu como “monstruosidade da elite”. Segundo o maestro Fabio Mechetti, depois de eleito, o governador visitou o prédio e se desculpou. “A Filarmônica é essencial e tem muito mais a mostrar do que essa visão equivocada. Isso é desinformação”, rebateu Mechetti.