Muito antes de os jovens de agora se lamuriarem por amores não correspondidos ou se deleitarem com novas paixões ouvindo Marília Mendonça, Gusttavo Lima e outros representantes da “sofrência”, a dor de cotovelo e o romantismo já existiam, obviamente, e eram combinados com a música. Nos anos 40, 50 e 60, era o bolero que permeava as amarguras e guiava os romances idealizados. Esse ritmo tão inesquecível é o fio condutor da peça “Minha Vida Daria um Bolero”, que estreia na capital mineira neste fim de semana, no Grande Teatro do Sesc Palladium.
A montagem, definida como uma comédia romântica, tem texto do dramaturgo Artur Xexéo e direção de Rubens Camelo e Paulo Denizot. Guiados por Itamar Assiere, que faz direção musical e toca piano, e pelo percussionista Diego Zangadopor, os atores Françoise Forton e Aloísio de Abreu cantam e dançam para dar vida aos protagonistas.
A história começa quando vai ao ar a última edição do programa de rádio apresentado por Diana (Françoise), que conta aos seus ouvintes sobre o relacionamento que mantém há 20 anos com Orlando (Abreu). Os dois nunca se viram: conversam por e-mail, mensagens de celular e pelo programa que ela comanda. Agora, finalmente, combinam de fazer uma aula de dança.
Para Abreu, um amor construído a distância, como o dos protagonistas, não é irreal. “Eu fui locutor muitos anos e acho possível, sim, se apaixonar por uma voz, porque quem trabalha em rádio só tem isso para passar emoção, envolver o ouvinte, e o rádio, muitas vezes, é um companheiro. O meu personagem, coitado, é um dedo podre, só gostou de mulher errada. Então, ele fica ligando para a Diana para ‘chorar as pitangas’. A partir daí surge essa atração, e os boleros contam a história dos dois”, diz.
Na trilha sonora que eles interpretam, há apenas clássicos, como “Tú Me Acostumbraste”, “Solamente una Vez”, “Angústia”, “Besame Mucho”, “Contigo Aprendi”, “Noite de Ronda”, “Vereda Tropical”, além de outras 11 canções. “Eu escolhi cada música. Não sou do tempo do bolero, mas o gênero sempre permeou minha vida, meus pais gostavam, vi muito cantor na TV. Então, pelo menos os clássicos eu tenho na memória e fui buscar essas recordações. Espero que a plateia de BH também os reconheça: no Rio (onde a peça estreou), todo mundo cantava junto, porque são músicas que fazem parte do imaginário da gente”, conta Xexéo, sobre a seleção musical.
Parceria. Abreu explica que a história é narrada com leveza e delicadeza: “É um espetáculo romântico. Existe uma tendência de personagens masculinos serem menos românticos, mas aqui, não. Ele é até mais que ela”, observa. Isso porque Diana é uma mulher que nunca se casou, nunca se arriscou, enquanto Orlando, um professor de dança, sempre quis se casar, mas foi abandonado pela noiva no altar.
Para construir a peça, o ator revela que foram apenas 21 dias de ensaio. “Com preparação de atleta, porque somos só nós dois no palco, temos que estar bem de saúde, com voz boa, memória, humor. Teatro é você, o parceiro e o público. Foi uma gincana, com muita aula de canto com a Paula Santoro (preparadora vocal). É uma carga grande, mas a gente faz com prazer”, confessa.
Parte do entrosamento deve-se também ao fato de que Françoise, Abreu e Xexéo repetem a parceria, nessa montagem, iniciada com a premiada “Nós Sempre Teremos Paris”, que também enfatizava a relação entre amor e música (no caso, a cidade-título da peça evocava as melodias). “Nós queríamos trabalhar juntos de novo, e Françoise deu a ideia de ser bolero e tango, mas eu falei: vamos só em um, porque tango é mais dramático, então é difícil permear uma história romântica com tons cômicos. Mas acaba que a peça termina com um tango. Ela insistiu”, conta Xexéo.
Serviço. Estreia em BH do espetáculo “Minha Vida Daria um Boleto”. Neste sábado (8), às 21h; domingo, às 19h, no Grande Teatro do Sesc Palladium (rua Rio de Janeiro, 1.046, centro). Ingressos de R$ 25 (meia-entrada, plateia III) a R$ 90 (inteira, plateia I).