“De Volta ao Lar”

Um rolê aracnídeo

Primeiro filme do Homem-Aranha sob o selo Marvel, longa reinventa Peter Parker como um Vingador adolescente

Por Daniel Oliveira
Publicado em 05 de julho de 2017 | 03:00
 
 
 
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A primeira cena de “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” é a introdução de Adrian Toomes (Michael Keaton), contratante privado que, em meio aos destroços da batalha do primeiro “Vingadores”, decide criar um mercado negro de armas alienígenas, tornando-se o vilão Abutre. E a segunda é a apresentação do novo Peter Parker (Tom Holland), por meio de uma espécie de vlog e/ou Snapchat com vídeos feitos por ele durante o confronto do último “Capitão América: Guerra Civil”, em que ele foi introduzido.

O recurso “moderninho” não é utilizado novamente, mas já anuncia de cara a proposta do filme, que estreia nesta quinta-feira (6). “De Volta ao Lar” é um Homem-Aranha para a geração youtuber. Com o espectador que assistiu ao primeiro “Homem de Ferro” nos cinemas envelhecendo – e possivelmente se cansando do arroz com feijão repetitivo que a Marvel vem servindo –, o estúdio quer começar a cativar um novo público, atualmente mais interessado em plataformas digitais e posts instantâneos do que em ir ao cinema.

Diferentemente de Tobey Maguire (27 anos na época de seu primeiro filme) e Andrew Garfield (que tinha 29), Holland (19 anos) vive um Peter Parker realmente adolescente: egocêntrico, inconsequente, hiperativo e incapaz de cumprir uma ordem. Seu protagonista, de 15 anos, passa o filme todo tentando provar que é mais do que um garoto imaturo – uma necessidade que é sintoma do exato oposto.

Se no original dirigido por Sam Raimi em 2002 eles traziam grandes responsabilidades, nessa nova produção grandes poderes trazem uma enorme crise de ego. Depois de ajudar Tony Stark (Robert Downey Jr.) no longa anterior, Parker passa os dias tentando encontrar uma forma de mostrar que pode ser o novo Vingador – ignorando a vida escolar e a rotina típica de um adolescente. E quando, entre um ladrão de bicicleta e outro, seu caminho cruza com o do Abutre, o protagonista encontra sua oportunidade.

Versão adolescente. “De Volta ao Lar” se alicerça na crise de identidade desse garoto dividido entre a adolescência e o heroísmo, tentando descobrir quem ele é. E o fato de que o “modelo” em que Parker se espelha ser Tony Stark diz muito dessa nova encarnação do aracnídeo. Diferentemente da recente “Mulher-Maravilha”, o herói não quer enfrentar vilões para fazer o bem, mas sim para “ser cool” e se autoafirmar diante dessa espécie de figura paterna vivida por Downey Jr.

O Peter do filme não é o pobre desafortunado de Maguire, ou o romântico adorável de Garfield, e sim uma versão adolescente dos Vingadores: um homem-menino usando seus poderes para se autoafirmar diante de outros homens e compensar suas falhas humanas. E elas são muitas: Parker é um super-herói “em treinamento”, e o longa extrai a maior parte de seu humor desse “desastre em miniatura” ambulante.

Isso só não é mais cansativo graças ao talento de Holland. O ator é obrigado a carregar mais de duas horas de filme no mesmo ritmo “fanboy hiperativo que acabou de beber cinco Coca-Colas” com que roubou a cena em “Guerra Civil” – e se os diálogos de nível “Malhação” não o ajudam, o britânico faz o melhor com seu humor físico e inegável carisma. O trabalho de Holland é especialmente fundamental porque nenhum dos outros personagens é desenvolvido satisfatoriamente. O longa ganha pontos pelo casting multiétnico de um colégio técnico do Brooklin, mas os alunos são mais tipos do que personagens.

As mulheres são as que mais sofrem. Marisa Tomei não tem o que fazer com sua tia May. E a MJ da vez se chama Michelle (Zendaya) e não tem mais que cinco falas no filme. Porque a verdadeira história de amor de Parker em “De Volta ao Lar” é com Tony Stark.

O desconhecido Jon Watts (de “A Viatura”, que ninguém, viu) faz o que a Marvel espera de um bom diretor: grita “ação” e “corta”, sem um pingo de originalidade e autoria fora do estilo da marca. Sua principal função é manter o mesmo ritmo da verborragia adolescente do protagonista, com nenhuma cena durando mais que a capacidade de atenção de seu público-alvo.

O resultado – rápido e rasteiro – peca por não explorar o talento dramático que Holland demonstrou em “O Impossível” com nenhum perigo real. Com isso, é difícil se importar com a história ou mantê-la na memória por mais do que cinco minutos depois da sessão. Porque, em vez da universalidade de um John Hughes, “De Volta ao Lar” é um filme adolescente com a velha conhecida fórmula da Marvel – repaginada para a geração youtuber.

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