Eterno

Personagem mais famoso de Ziraldo, Menino Maluquinho segue encantando gerações

Criada nas páginas de um livro em 1980, história foi parar no cinema em filme do diretor mineiro Helvécio Ratton que está completando 25 anos

Por Ana Clara Brant
Publicado em 28 de julho de 2020 | 03:00
 
 
normal

“Eu tive um AVC, mas mesmo assim não fiquei lesado. Eu já sou lesado. Sempre fui um menino maluquinho”. Foi com esse comentário que o cartunista e escritor mineiro Ziraldo começou o bate-papo com o Magazine na última quinta (23), dia em que morreu o compositor Sérgio Ricardo, seu grande amigo.
 
Com quase 88 anos – ele faz aniversário em outubro –, este mineiro de Caratinga, na região do Rio Doce, diz que nem sentiu o confinamento imposto pela pandemia do novo coronavírus justamente por estar em casa há algum tempo se recuperando do acidente vascular cerebral hemorrágico que sofreu há quase dois anos e o deixou internado em estado grave por quase um mês. “Minha mulher montou um ‘home care’ aqui. Estou muito bem assistido. Só lamento o tanto de gente bacana e importante como o próprio Sérgio que estamos perdendo nesse período. A gente começa a descobrir o que é saudade quando vai perdendo as pessoas queridas. O significado de saudade é muito mais amplo do que a palavra”, filosofa Ziraldo, que é criador de inúmeras figuras que marcaram gerações como A Turma do Pererê (que ele considera seus preferidos e que quer retomá-los em um novo projeto, ainda embrionário), Supermãe e Flicts. 
 
Mas é o Menino Maluquinho, que completa quatro décadas em 2020 e cujo filme dirigido pelo cineasta Helvécio Ratton faz 25 anos agora, que se tornou o seu personagem mais popular e conhecido “É um personagem fácil de ser querido. É um menino feliz, cheio de amigos, amado pela família. E quem é assim acaba se tornando um cara bacana quando adulto”, frisa o cartunista. 
 
O menino que “tinha o olho maior do que a barriga, tinha fogo no rabo, tinha vento nos pés, umas pernas enormes e macaquinhos no sótão” não deixa de ser inspirado no próprio Ziraldo e em sua infância no interior de Minas. “A gente brincava na rua, vivia na casa dos outros, e as mães nem se preocupavam. Não tinha como não ser um menino feliz”, argumenta. 
 
Não é à toa que o personagem que nasceu em um livro em 1980 acabou ganhando o mundo e foi parar nos quadrinhos, no teatro, na TV e na telona. Em meados da década de 90, o cinema brasileiro começava a sua retomada após a extinção da Embrafilme pelo então presidente Fernando Collor.
 
Mesmo a duras penas, “Menino Maluquinho: O Filme” foi lançado em 1995 e foi um sucesso de público e de crítica. “Até hoje, o que mais me impressiona é que esse filme continua sendo visto. Seja através da própria TV, do streaming, está no YouTube. É difícil até de mensurar qual o público certinho desse projeto. E o mais bacana é que ele não ficou restrito apenas às crianças, mas os adultos também viram e gostaram. Acho que o sucesso pode ser explicado porque ele aborda um menino que teve uma infância feliz”, opina o diretor Helvécio Ratton, que participa hoje, às 20h, de uma live ao lado da atriz Patrícia Pillar no Instagram da Quimera Filmes (@quimerafilmes), sua produtora, para falar sobre os 25 anos do longa-metragem. 
 
O cineasta revela que um dos aspectos que mais chamaram sua atenção foi o caráter universal do Menino Maluquinho. Na seleção de crianças para o papel-título, ele se deparou com garotos de todos os tipos. “Eram meninos brancos, negros, nisseis, indígenas. Não havia um menino maluquinho definido. Isso me deu uma dimensão de como ele chegava às pessoas”, recorda.
 
De ator a produtor
Entre as 3.000 crianças testadas, um garotinho paulista então com 9 anos foi o escolhido. Samuel Costa, hoje com 35, já tinha feito algumas participações em comerciais quando acabou se tornando oficialmente o Menino Maluquinho. “Eu fui criado lendo gibis da Turma da Mônica, do Maluquinho também, mas daí a interpretá-lo foi algo que eu nunca esperei. Tenho um grande orgulho de ter feito esse personagem”, ressalta Costa, que, apesar de ter feito outros trabalhos como ator, acabou indo parar nos bastidores do audiovisual.
 
Já na época das filmagens em Belo Horizonte e Tiradentes, ele era fascinado com a parafernália que uma produção como aquelas demandava. “Eu queria saber como funcionava a câmera, o áudio, eu queria mexer no rolo do filme. Sempre gostei muito desse tipo de coisa e adoro tecnologia. Tanto que hoje tenho uma produtora de audiovisual (Samuel Costa é sócio do amigo Bruno Bocks na produtora Blues Filmes)”, comenta.
 
Para ele, o filme ainda toca as pessoas porque aborda temáticas que fazem parte da vida de qualquer um: a família e as amizades. “Seja a relação de um menino com o avô, com os vizinhos e colegas de escola, com os pais. É uma história que fala de sentimento, de emoções. Podem se passar cem anos que esse tipo de coisa não vai mudar nunca”, defende. 
 
Patrícia Pillar, que interpretou a mãe do protagonista no longa e estará na live de logo mais com Ratton, conta que o que mais a encantou no roteiro foi como o filme trata a infância com respeito. “Não foge dos assuntos para criar uma falsa felicidade, tem assuntos doídos como a separação dos pais e a morte do avô amado. E o personagem era muito encantador, era uma ‘mãe maluquinha’ que tocava corneta para chamar as crianças para o almoço”, observa.
 
A atriz tem gratas recordações daquele período e salienta que uma das lembranças mais especiais era a alegria espontânea das crianças que, segundo ela, já dava um astral incrível ao filme.
 
“Helvécio as queria livres, ele queria essa energia no filme, e isso dava o tom das filmagens. Filmamos em BH e em Tiradentes, e isso me faz até sentir novamente o perfume das comidinhas mineiras. Tenho lembranças muito, muito afetuosas dos grandes Hilda Rebello e Luís Carlos Arutin (eles faziam os avós do Maluquinho)”, destaca.
 
Patrícia Pillar ainda acredita que tanto o filme como o personagem sobrevivem ao tempo porque são uma homenagem à infância, ao direito de ser criança, à infância livre e repleta de imaginação. “A essência do livro e do personagem é que ele se tornou um adulto legal porque teve uma infância feliz. E o filme mostra uma infância feliz, que pode acontecer em qualquer tempo”, resume.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!