Uma viagem que passa por sonoridades de países andinos e africanos. É essa a proposta que o cantor, compositor e multi-instrumentista mineiro Sérgio Pererê incorpora a um pocket show solo que será lançado nesta quarta-feira, às 19h, no canal no YouTube do Cultura UFMG. A performance integra o projeto Circuito Cultural UFMG #emcasa - que, em função da pandemia do novo coronavírus, leva para o ambiente virtual uma série de espetáculos mensais que seriam realizados presencialmente.
Na sala de sua casa, o músico, que estreia a nova temporada do projeto, revisita diversos momentos da própria trajetória artística recorrendo sempre a instrumentos inusuais. “O resultado tem um quê de inusitado. É simples, feito na sala, mas é sofisticado, por ser um passeio por sonoridades não convencionais da música étnica, africana e latina”, constata.
Pererê recorre, por exemplo, ao ronroco, de origem andina e que é espécie de charango mais grave, e ao tama, que é um tambor falante tradicional da África Ocidental. Também entram nesse rodízio musical a mbira, do povo Shona do Zimbábue, e a ilimba, um lamelofone da Tanzânia. “Além do entretenimento, busquei falar um pouco sobre a história desses instrumentos, então o show tem essa característica de ser informativo”, explica.
A apresentação é descolada de seus trabalhos mais recentes. Em março, o inquieto mineiro lançou o CD “Maurício Tizumba e Sérgio Pererê ao Vivo”, que registra um show da dupla feito em 2018. Já no dia 20 de maio, estreou nas mídias digitais o álbum “Revivências”, em que o artista se apresenta como intérprete da MPB, emprestando a voz para canções de Milton Nascimento, Chico Buarque, Gilberto Gil, Gonzaguinha (1945-1991) e Luiz Melodia (1951-2017), entre outros autores.
Previsto para o segundo semestre, Pererê optou por antecipar o lançamento de “Revivências” ao identificar um elo entre o repertório e o atual contexto mundial, afetado pela pandemia da Covid-19 e sobre o qual diz: “É bom vibrar o pensamento de que não seja para sempre e que passe o quanto antes”.
Emergência e aprendizado
Com as restrições de circulação e as medidas de isolamento físico, o artista encara os formatos digitais como uma alternativa emergencial e também como forma de aprendizado. “Precisamos desenvolver capacidade para lidar com novas formas de atuar e, na verdade, é quase uma técnica nova a ser desenvolvida: uma coisa é espetáculo em teatro, outra é apresentação em um bar, outra é um show na televisão. E as lives são uma outra coisa, uma coisa nova. Meio que TV ao vivo e interativa”, compara. “Nesse sentido, é interessante pensar que é mais uma forma de expressar nossa arte e comunicar com o público”, conclui.
Por outro lado, Pererê lembra que muitas vertentes da arte demandam da presença física. “A gente, da música, consegue lidar com a coisa da tela e desenvolver técnicas, mas muitos segmentos precisam do contato com o público. E, mesmo que havendo uma adaptação, chega a ser um pouco angustiante, às vezes, fazer um show em que não se vê exatamente para quem, em que não se vê quem está chegando”, examina.
O mineiro cita como exemplo de iniciativa capaz de oxigenar o meio artístico as transmissões ao vivo promovidas pela sambistas carioca Teresa Cristina, que se notabilizou por suas lives diárias em que canta à capela e divide com os espectadores seu enciclopédico conhecimento da história da música brasileira. Pererê já participou algumas vezes. “Tenho gostado muito dessa iniciativa dela. Fico sentindo que, diante de tudo que está acontecendo, nós, artistas, precisamos dessa sacudida, de pensar qual é a real função da arte e de que forma nosso trabalho se situa no atual contexto social e político, apesar do momento delicado”, avalia.
Romper estruturas
Na opinião dele, as transmissões da sambista vêm rompendo com práticas canônicas do meio musical. “Quando a Teresa convida o Caetano, me convida e depois chama uma poeta do interior de Minas, ela promove uma horizontalização das relações. Mostra que, neste momento, de uma certa maneira, estamos em uma situação parecida…”, analisa.
Paradoxalmente, em um momento em que expressões como “distanciamento social” se infiltraram no léxico popular, o multi-instrumentista defende uma maior união: “Eu fico sentindo que a gente precisa disso, de se unir e quebrar alguns paradigmas que já estão construídos há muitos anos e que geram uma distância entre nós. Temos que agir juntos, se não fica insuportável”.
Diante da insurreição dos protestos antirracistas nos Estados Unidos, que começam a ecoar em movimentos semelhantes no Brasil, Pererê é categórico: “Essa é uma luta que acontece há tempos. A violência racial nunca deixou de existir e a luta contra ela também não. Agora, diante desses movimentos e no atual contexto, acredito que mais artistas devem assumir o papel de buscar romper essa estrutura. É um momento em que a arte é convidada a se posicionar”.
Circuito Cultural UFMG #emcasa
A apresentação de Pererê marca a estreia da nova temporada do projeto Circuito Cultural UFMG #emcasa. A ação contará, ainda, com quatro cantautores mineiros. Durante o mês de junho, se apresentam a sambista Manu Dias, no dia 10, o compositor do Vale do Jequitinhonha Nino Aras, no dia 17, e a cantora, atriz e poeta, Priscila Magella, dia 24. Os pocket shows estreiam toda quarta-feira, às 19h, e ficam disponíveis na plataforma do YouTube. Desde o início das restrições de mobilidade instauradas em função da pandemia de Covid-19, o Circuito, que realizava apresentações presenciais mensalmente, migrou para a internet.
Serviço:
O que. Solo - Apresentação virtual de Sérgio Pererê. Quando. Nesta quarta-feira (3), às 19h. Onde. Canal no YouTube do Cultural UFMG.