Artes Cênicas

Teatro Kleber Junqueira vive situação delicada e pode fechar a qualquer momento

Em meio a polêmica entre gestores e Cemig, espaço cultural virou sinônimo de abandono com a falta de investimentos e depredações

Por Bruno Mateus
Publicado em 14 de março de 2020 | 04:07
 
 
 
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Não há cadeados nas portas empenadas. A sujeira é a única presença no palco em estilo italiano, e o azul das 500 poltronas está encoberto por um verniz de poeira marrom. A escuridão e o clima decadente, o cheiro nauseante de mofo e as paredes descascadas pela ação do tempo dão a dimensão da situação em que se encontra o Teatro Kleber Junqueira, no bairro Calafate, único da região Oeste de Belo Horizonte.

Sem programação há mais de dois anos – o último espetáculo encenado na casa foi “A Roupa Nova do Imperador”, adaptação da própria companhia, em dezembro de 2017 –, o teatro sofre com a falta de investimentos. Mais recentemente, duas invasões, em setembro e em dezembro do ano passado, contribuíram para a degradação do local, que em 16 anos recebeu cerca de 500 mil espectadores.

“A qualquer momento, Belo Horizonte e o Estado de Minas Gerais, podem perder um teatro, já temos até ordem de despejo da imobiliária, e um oficial de Justiça deve aparecer uma hora ou outra. Quando entro aqui, tenho vontade de morrer”, afirmou o ator, diretor, produtor e dramaturgo Kleber Junqueira, que fundou o teatro que leva seu nome em 2004. O aluguel do espaço não é pago há um ano e meio.

O lamentável cenário ganha contornos ainda mais tristes após uma troca de acusações envolvendo os produtores do local e a Cemig, uma das maiores patrocinadoras da cultura da capital. E uma briga judicial se avizinha. Em 2019, o Teatro Kleber Junqueira teve seu projeto, no valor de R$ 1,5 milhão, aprovado na Lei Estadual de Incentivo à Cultura.

Segundo o diretor administrativo e financeiro, Éder Paulo, a Cemig se comprometeu a investir na reconstrução do teatro, mas condicionou esse aporte à aprovação da prestação de contas de um projeto de 2018, apresentada em fevereiro deste ano, dada pela Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), num prazo de seis meses a um ano.

“Em 28 de fevereiro de 2020, a Secult recebeu a prestação de contas da Associação Móbile Cultural (Teatro Kleber Junqueira) referente ao projeto em questão”, confirma a secretaria. “Estamos na fila como todos os outros mortais. A Cemig nos pediu os documentos da prestação de contas, que empresa nenhuma pede e que é entregue para os órgãos de cultura, não para o patrocinador”, avalia Kleber Junqueira. “Não existe amparo legal para isso. A Cemig está passando por cima da autoridade da Secult, isso é função da Secretaria de Cultura”, acrescentou Éder Paulo. 

A instituição se defende. “O teatro pleiteou insistentemente o patrocínio. A empresa, mesmo com todo o passivo do proponente, solicitou que ele regularizasse sua situação, cuja aprovação de contas dependia do andamento das negociações”, afirmou a Cemig por meio de nota.

A empresa informa que, em janeiro de 2018, acatou o patrocínio no valor de R$ 20 mil para a realização da peça “A Roupa Nova do Imperador”, a ser exibida para alunos de escolas públicas, o que nunca aconteceu. Em novembro do mesmo ano, um novo investimento, de R$ 150 mil, foi repassado ao Teatro Kleber Junqueira. 

Questionado, Éder Paulo rebate: “A peça não foi realizada porque a verba de R$ 20 mil era para pagar dois meses de aluguel de teatro e algumas despesas de água e luz que estavam atrasadas. Tivemos a promessa de um patrocínio de R$ 700 mil, o que virou R$ 150 mil”.

De acordo com a Cemig, os gestores “pediram, novamente, socorro, informando que R$ 150 mil não eram suficientes para pagar aluguel e contas”. A solicitação, informou a estatal, não foi acatada “em função dos recursos já aportados e do não cumprimento dos objetivos do projeto cultural”. 

Último ato

Diante do imbróglio, não bastasse o fechamento iminente do teatro, as duas partes não se entendem, a situação pode terminar em uma queda de braço na Justiça. Segundo a Cemig, os gestores do Teatro Kleber Junqueira ofenderam representantes da entidade ao telefone: “A empresa entende que não há mais diálogo possível e decidiu recorrer à Justiça contra as graves ofensas”.

Em conversa com a reportagem, Éder Paulo negou a acusação. “O que eles estão alegando não é verdade. Não houve ofensa, e, inclusive, vamos oferecer denúncia no Ministério Público. A postura da Cemig configura má-fé”, defendeu o diretor administrativo do Teatro Kleber Junqueira, que vê seus dias contados. (Com Carlos Andrei Siquara)

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