Diversificação

Barro Preto, entre a moda e a saúde, busca real identidade

Em pouco mais de três anos, entre 2018 e 2021, o setor de saúde movimentou R$ 4,2 bilhões no Barro Preto, mais que o dobro que todo o comércio e serviços do bairro


Publicado em 30 de janeiro de 2023 | 06:00
 
 
 

Logo após cruzar a praça Raul Soares, com o asfalto recém-colorido pelos artistas do Circuito Urbano de Arte (Cura), e seguindo pela avenida Augusto de Lima na direção do Fórum Lafayette, uma placa a 5,5 m de altura anuncia a chegada ao Polo da Moda em três idiomas. A partir daquele ponto do bairro Barro Preto, quem passa encontra dezenas de lojas de roupas para venda no atacado e varejo, prédios residenciais enfileirados com mais de 20 andares, escritórios de advocacia perto de um dos maiores órgãos da Justiça mineira e seis dos principais hospitais de Belo Horizonte.

Mas também encontra ruas com movimento tranquilo — alguns comerciantes diriam “fraco” —, uma sequência de portas fechadas com placas de “aluga-se” e uma economia que, passados os tempos mais efervescentes da moda mineira, lucra mais com a saúde do que com o comércio e com o vestuário.

O bairro “primo-irmão” do centro da capital, com 1 km² de extensão, é o que seguiu mais fielmente os traçados originais de Aarão Reis, urbanista que planejou a cidade, e teve múltiplas vocações ao longo das décadas. Agora, lojistas cobram mais foco e união para recuperar o movimento após os tempos mais duros da pandemia. Nos últimos anos, é o setor de saúde que tem se fortalecido na região.

Em pouco mais de três anos, entre 2018 e 2021, o setor de saúde movimentou R$ 4,2 bilhões no Barro Preto. O volume é mais que o dobro do que todo o comércio e os demais serviços do bairro levantaram, R$ 1,6 bilhões no mesmo período. Atualmente, conforme dados da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, o Barro Preto concentra metade dos estabelecimentos ligados à saúde da região central de BH. 

Felício Rocho é um dos hospitais que têm o Barro Preto como endereço

São 418 empresas do segmento no bairro, das 759 na região. O desempenho de gigantes hospitalares do Barro Preto, como Mater Dei, Vera Cruz e Felício Rocho, elevam os números, que também são sustentados por dezenas de clínicas e consultórios particulares espalhados pelas ruas do bairro. Em um movimento que se constrói há décadas, hoje a região se consolida como a segunda área hospitalar da cidade.

“É uma região que, no passado, era muito focada na indústria da moda e confecções. Por uma questão de custo de imóveis, perfil dos imóveis, as confecções foram migrando para o bairro Prado. E temos um setor muito forte, muito pujante, que já escolheu o Barro Preto como local. É uma oportunidade de expansão desse segmento ligado à saúde que chamamos de ciências da vida”, descreve o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Adriano Faria. 

O representante do Executivo afirma que, com a instalação de empreendimentos ligados à saúde, há um grande potencial de empregos na região. “Temos os maiores hospitais da cidade localizados no Barro Preto. Precisamos aproveitar a grande quantidade de hospitais, clínicas e laboratórios que ali se instalam para gerar emprego e renda para a população que ali reside ou frequenta”, complementou Faria. 

Investimentos impulsionam perfil da saúde no bairro

E as mudanças no perfil do bairro vão se apresentando entre os cruzamentos de quem caminha de uma ponta a outra da avenida Augusto de Lima, desde a praça Raul Soares até a avenida do Contorno. Neste trajeto, é possível reparar as diferenças quarteirão após quarteirão. No começo, o bairro é pontilhado por lojas de roupa, depois por lanchonetes próximas ao Fórum até que, na altura da avenida Barbacena, as lojas somem e dão lugar a clínicas. 

O engenheiro José Rogério Lara enxergou uma oportunidade na região e investiu R$ 1,2 milhão para reformar uma antiga clínica no bairro e transformar o espaço em um coworking para médicos na rua dos Timbiras, a UnioMedic. São 30 salas já equipadas que os profissionais podem alugar por turno, horário ou mensalmente.

Coworking voltado à saúde reúne consultórios no Barro Preto

“Belo Horizonte tem duas regiões hospitalares. No Santa Efigênia, há hospitais grandes, públicos, como a Santa Casa, o São Lucas e o Hospital das Clínicas. Outro centro, o Barro Preto, mais nobre, tem dois Mater Dei, Felício Rocho, Vera Cruz e o Socor, ao lado. É um bairro que tem focado cada vez mais no alto padrão de ofertas para a área médica. Depois da minha clínica, reformada em 2019, vieram várias”, diz o empreendedor.

Descendo a Augusto de Lima e se aproximando novamente da Raul Soares, a Galeria Chaves acumula lojas de portas fechadas com avisos de “aluga-se” — uma barbearia mudou-se há meses e não retirou sequer sua placa. Mas, no primeiro andar, um negócio prosperou, segundo a proprietária, Cibele Maria.

Ela abriu a farmácia de homeopatia Casa das Fórmulas no local uma semana antes da irrupção da pandemia na capital e, a partir de então, inaugurou mais três unidades no bairro. “Desde a pandemia, ainda não é o Barro Preto que a gente conhecia. Não posso reclamar porque o setor da saúde teve crescimento”, pontua. Na galeria, por volta das 9h30 de uma terça-feira, não se via clientes e Cibele atesta que a maior parte das vendas são feitas online.

Saúde movimenta outros setores

Fortalecendo-se como opção econômica no Barro Preto, o setor de saúde também movimenta outros segmentos. Na avenida Barbacena, Flávio Luiz Braga, 46, inaugurou um restaurante no meio da pandemia e diz que, graças a escritórios de advocacia, funcionários do Fórum Lafayette e de clínicas e hospitais, o negócio vai bem.

“O negócio está acima do que eu esperava, mas o bairro está muito abaixo. Conheço o Barro Preto desde menino e sempre foi movimentado, mas deixou de ser. Uns falam que ele morreu. Mas é que não evoluiu e parou no tempo. Queria ver mais restaurantes ao lado do meu, falta muito movimento à noite aqui”, reflete. Braga diz que já encaminhou à prefeitura a sugestão para a formação de uma feira popular na região, por exemplo, porém o projeto não foi adiante. 

Na Galeria Chaves, o vendedor de óculos Welbert Peixoto não tem do que reclamar do movimento de clientes na ótica. No entanto, ele avalia que o bairro precisa de mais pessoas circulando. “O maior erro dos comerciantes aqui é o marketing. As pessoas pensam em roupa e pensam no Barro Preto, mas o forte aqui não é só isso mais. Falta união ao comércio”, diz.    

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