Alternativas

Criatividade para ganhar a vida 

Na falta de trabalho com carteira assinada, cada um se vira como pode para se sustentar

Por Queila Ariadne
Publicado em 25 de outubro de 2015 | 04:00
 
 
 
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“Olha a água!” Quem nunca recebeu uma oferta dessa enquanto espera o sinal de trânsito abrir? Mas será que a chance de comprar aumenta se o produto vier em uma bandeja trazida por um garçom? É nisso que Cristiano Batista dos Santos, 35, aposta quando se arruma e sai para vender seus produtos na avenida Nossa Senhora de Fátima, esquina com rua Traíras, no Carlos Prates, região Noroeste da capital.

Sem conseguir trabalho na sua área, ele teve a ideia de levar para a rua seus cinco anos de experiência como garçom. “Trabalhei muito tempo servindo em gabinetes (de órgãos públicos) e como freelancer em restaurantes. Então pensei: tenho minha profissão e, se não consigo ser contratado, vou servir na rua”, conta Santos.

De acordo com o economista da RC Consultores Thiago Biscuela, com o aumento do desemprego, a disputa por uma vaga formal fica cada vez mais acirrada. “A taxa de ocupação está diminuindo para quem tem carteira assinada ou não. E vivemos uma migração dessas pessoas que saem do mercado para trabalhar por conta própria”, avalia.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de setembro do ano passado para setembro deste ano, enquanto a fatia dos trabalhadores com carteira caiu de 55% para 54%, a participação de quem atua por conta própria cresceu de 17,5% para 18,8%. “As pessoas perdem o emprego, mas precisam continuar ganhando a vida, como essa maneira criativa que nosso amigo arrumou”, comenta o economista.

A criatividade de Santos está rendendo tantos frutos que ele já nem sonha mais com a carteira assinada. “Até penso em me formalizar, virar microempreendedor individual. Trabalhando por conta própria estou ganhando mais”, afirma. Por dia, ele vende em média 48 garrafas de água mineral, a R$ 2 cada, além de refrigerante e suco em lata, entre R$ 2 e R$ 4. Todo dia ele acorda, prepara o suprimento e vai a pé até seu ponto comercial. “De segunda-feira a sexta-feira, trabalho entre 9h e 17h. Faço uma hora de almoço. No sábado, fico até mais ou menos meio-dia”, conta. Aos domingos, como a maior parte dos trabalhadores, o garçom do trânsito descansa.

É oferecendo os produtos geladinhos, de carro em carro, com um sorriso de um lado ao outro do rosto, que ele se diferencia da concorrência. A delegada Cristiane Lopes trabalha perto do ponto comercial de Santos. “Certamente a boa impressão faz muita diferença para quem vai comprar. Ele está sempre muito limpo e passa mais credibilidade”, afirma.

“Tem gente que até dá gorjeta. E por aqui, vou fazendo contatos para trabalhar como garçom em festas”, afirma Santos.

Remuneração

Diferença. Segundo dados do rendimento médio de setembro, medidos pelo IBGE, uma hora de trabalho com carteira assinada rende R$ 2,77 ao trabalhador. Por conta própria, rende R$ 2,63.

Para ‘conta própria’, renda cai menos



Com carteira ou não, todo mundo está ganhando menos – ou, pelo menos, o mesmo salário tem menor poder de compra. Mas, para quem trabalha por conta própria, os ganhos caíram menos: 2,9% em setembro, enquanto, de maneira geral, o rendimento médio da população ocupada (somando com carteira, sem carteira, por conta própria, empregador) caiu 4,3% em relação ao mesmo mês do ano passado. Os dados são da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE.

Para quem tem carteira, os rendimentos encolheram 3,9%. Já para os sem carteira, a redução foi de 6,2%. “Isso acontece porque, mesmo a renda caindo para todos, quem tem carteira ainda tem o respaldo de sindicatos, que negociam os reajustes”, justifica o economista da RC Consultores Thiago Biscuela. 

O coordenador do MBA de finanças da Fumec, Alexandre Pires, ressalta que há uma forte tendência, para aqueles que perdem o emprego, de investirem o acerto em algum empreendimento e virarem autônomos. 

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