O aumento da taxa básica de juros realmente serve para controlar a inflação? Para a economista Maria Lúcia Fattorelli, a medida adotada pelo Banco Central nessa quarta (4), que estabeleceu a Selic em 12,75% ao ano, não tem efetividade para derrubar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 11,3% nos últimos 12 meses.
Como justificativa, Maria Lúcia lembra que o grupo de transportes é um dos que mais pesa na inflação acumulada que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) calcula. O IPCA desse setor é de 17,37% em 12 meses, puxado pelos combustíveis (27,89%).
“Esse aumento da Selic é um verdadeiro abuso contra a sociedade brasileira. A inflação brasileira é fabricada pelo Preço de Paridade de Importação (PPI) aplicado na Petrobras. É como se nós estivéssemos importando 100% dos combustíveis que usamos aqui, só que a gente importa uma coisa mínima”, afirma.
Ela sustenta que essa política de preços da Petrobras é mantida para assegurar lucros exorbitantes dos acionistas da estatal. Para se ter uma ideia, no ano passado, a remuneração desses investidores da empresa chegou a R$ 101 bilhões no ano passado.
“Daí, eu me pergunto: subir juros vai diminuir a inflação? É claro que não, porque não afeta a inflação de combustíveis, que afeta a maioria dos setores do País. Teria que mudar essa política de preços da Petrobras”, diz Maria Lúcia Fattorelli.
Outro ponto ressaltado pela economista é o peso da inflação dos alimentos no IPCA geral. Os preços desses itens subiram 11,62% em 12 meses, puxados pela cenoura (166,17%), tomate (94,55%) e hortaliças e verduras (33,29%).
“Toda política agrícola e agrária do País é voltada ao incentivo do grande agronegócio de exportação. As grandes corporações preferem vender em dólar, com isenção de ICMS lá pra fora, do que atender o mercado brasileiro. Isso porque falta regulação no preço dos alimentos. Subir juros não corrige isso”, afirma a economista, que também coordena a Auditoria Cidadã da Dívida nacionalmente.
Por que a Selic aumentou?
A taxa básica de juros é tida pelo Banco Central como principal medida para controlar a inflação. A meta da instituição é assegurar a alta de preços entre 2% e 5% em 2022, apesar de o mercado já trabalhar com um IPCA de 7,64% ao fim do ano, conforme a última edição do Boletim Focus.
Para o economista-chefe da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Minas Gerais (Fecomércio MG), Guilherme Almeida, há elementos na conjuntura macroeconômica que fogem do controle do Banco Central. Na visão dele, isso limita a influência da Selic na inflação.
“Nós temos esse conflito entre Rússia e Ucrânia que acaba gerando um processo inflacionário em commodities energéticas, agrícolas e minerais. Nós temos um choque de oferta proveniente também da política adotada pelo governo chinês de tolerância zero à Covid, que tem gerado fechamento de fábricas. Isso afeta toda cadeia produtiva, já que a China é uma importante parceira comercial”, afirma Guilherme Almeida.
Mas, para além da demanda, o economista-chefe da Fecomércio MG defende que a alta da Selic consegue controlar a inflação brasileira. “O Banco Central tenta, ao aumentar juros, atrair dólares para o Brasil. O investidor estrageiro, quando olha para o Brasil, vê um risco alto. Para que aloque capital no Brasil, ele espera uma remuneração maior. Contendo a escalada do câmbio, temos um controle da inflação em médio prazo”, diz Almeida.
Ele lembra, ainda, que tanto os bancos europeus quanto os dos Estados Unidos usam essa estratégia de aumento da Selic como medida de controle da inflação.