Disparidade

Imposto de Renda 100 anos: 'Leão' morde mais quem ganha menos e traz distorções

Quem ganha dois salários mínimos têm 70% de sua renda tributada e 30% isenta. Mas os mais ricos chegam a ter 70% de sua renda livres das garras do Leão.

Por Karlon Aredes
Publicado em 02 de setembro de 2022 | 03:00
 
 
 
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O Imposto de Renda vai completar 100 anos de existência no Brasil, já que a lei que o criou foi homologada em 31 de dezembro de 1922, já para incluir recursos no orçamento federal do ano seguinte, em 1923.  E nestes cem anos, distorções do Imposto de Renda aconteceram, como a defasagem de 147% na tabela do IR acumulada desde 1996. Essa defasagem dá-se porque a correção não acompanhou a inflação neste período. Outra questão é que o Leão morde mais quem ganha menos. 

O relatório “Análise dos Dados das Declarações do IRPF no Brasil”, feito do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) com base nas  declarações de IR enviadas à Receita, mostra que um trabalhador que recebe um salário de R$ 8.500 por mês paga mais Imposto de Renda (IR) proporcionalmente, do que quem ganha R$ 370 mil mensais. Já quem ganha R$ 24 mil mensais chega a comprometer um percentual de sua renda com o IR que é mais do que o dobro do percentual comprometidos pelos mais ricos. Os dados são referentes ao ano exercício de 2020. 

Como é calculada a alíquota do Imposto de Renda?

Segundo Sindifisco Nacional, o estudo calcula a alíquota efetiva de IR cobrado sobre rendimentos de pessoas com diferentes faixas de renda. A alíquota efetiva é aquela que, de fato, é paga pelo contribuinte após descontos e isenções. De acordo com o estudo, os assalariados que receberam entre 5 e 7 salários mínimos em 2020 comprometeram 4,91% com o IR declarado em 2021. Já quem recebia mais de 320 salários mínimos comprometeu 5,25%. Em compensação, quem recebia entre 20 e 30 salários mínimos por mês, comprometeu 11,89% de sua renda com o IR,  mais que o dobro dos contribuintes mais ricos, que recebem R$ 370 mil por mês, por exemplo. 

Segundo o estudo, quem ganha dois salários mínimos têm 70% de sua renda tributada e 30% isenta. Mas os mais ricos chegam a ter 70% de sua renda livres das garras do Leão.  

Para que serve o Imposto de Renda?

Flavio Prado, vice-presidente do Sindifisco Nacional (Delegacia Sindical de Santos), disse que o Imposto de Renda é importante por ser uma das principais ferramentas para que o Estado possa ter recursos para financiar a saúde e educação, entre outras políticas públicas. “No entanto, no Brasil, o Imposto de Renda tem dois problemas: o primeiro é a falta de atualização da tabela, que acumula defasagem de 147% desde 1996, o que faz com que uma pessoa que ganhe 1,5 salário mínimo já comece a pagar imposto de renda. E a segunda é a falta de tributação de lucros e dividendos distribuídos pelas empresas, como ocorre nos principais países do mundo. Ambos os problemas afetam de forma mais severa os mais pobres, que acabam pagando proporcionalmente mais imposto de renda que os mais ricos”, enumera. 

Segundo o relatório o Sindifisco Nacional, dados do Banco Central do Brasil revelam que a remessa de lucros e dividendos ao exterior alcançou, em 2018, o montante de US$ 19,96 bilhões. Como as remessas de lucros e dividendos estão isentas de imposto de renda, o Brasil vem renunciando a receitas tributárias em favor dos países-sede das matrizes recebedoras dos dividendos, que acabam muitas vezes tributando a parte que deixou de ser tributada no Brasil, ou em favor do próprio investidor estrangeiro, a depender das regras de tributação internacional do país de destino dos lucros remetidos. Convertendo o valor de US$ 19,96 bilhões em reais, pela cotação média do dólar em 2018, chega-se a montante superior a R$ 73 bilhões. Uma tributação à alíquota de 15%, que prevalecia até 1991 quando a remessa de dividendos passou a ser isenta, possibilitaria arrecadação superior a R$ 11 bilhões, somente em 2018 

Nesta sexta-feira (2), um debate sobre um novo modelo de tributação sobre a renda e a reorganização da administração tributária marca o lançamento da campanha dos “100 anos do Imposto de Renda”, idealizada pelo Sindifisco Nacional e que tem como objetivo reunir ideias e soluções para tornar o imposto de renda mais justo no Brasil.  A ideia é que até novembro sejam realizadas novas rodadas de discussão em debates regionais previstos para acontecer em Salvador, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Brasília. Como fruto dos seminários, o Sindifisco pretende construir um documento com propostas e simulações econômicas de reforma do imposto de renda, considerando as realidades de cada região relativas à regressividade do IR, a ser entregue ao presidente da República eleito.

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