Se por um lado um contingente cada vez maior de pessoas se dá por vencido na luta contra o desemprego, por outro existem aqueles que ainda resistem: 849 mil mineiros aceitam trabalhar menos tempo do que poderiam e, consequentemente, ganham menos do que gostariam. São os chamados subocupados na classificação do IBGE – aqueles que, apesar de disponíveis, trabalham menos de 40 horas por semana. Em Minas Gerais, nos últimos cinco anos, um exército de 348 mil mineiros entrou para esse grupo. No Brasil, esse contingente é de 6,7 milhões.
A educadora física Fernanda Júnia Rodrigues, 29, foi forçada a entrar nessa estatística. Depois de lutar para conseguir o diploma – com direito a gravidez no meio do curso e “participação especial” do filho recém-nascido nas aulas –, ela se formou no fim do ano passado. Desde então, tenta empregos formais na área para a qual se capacitou. Sem sucesso na procura nem perspectiva de mudança, ela passou a vender semijoias, mas ganha bem menos do que receberia com a educação física.
“Fico decepcionada com essa situação. Me esforcei muito porque sempre quis dar aula e, agora que me formei, levei vários ‘nãos’. Muitas escolas me chamaram para a entrevista, mas, quando eu cito que tenho filho, eu vejo que perdi a vaga pela cara que eles fazem. É triste porque mãe também precisa trabalhar”, desabafa.
O professor de economia do Ibmec Glauber Silveira destaca que, mais do que o emprego, muita gente já perdeu a esperança. “A instabilidade e a falta de perspectiva de encontrar vaga faz esse número de desalentados e subocupados subir. As causas disso são a forte crise nos anos de 2015 e 2016 e o crescimento muito aquém do desejado em 2017 e 2018. Com tudo isso, os empresários não sentem confiança para voltar a investir e gerar empregos. A situação é ainda pior para negros e mulheres”, analisa Silveira.
De fato, metade (54,5%) dos subutilizados no país são do sexo feminino, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). Assim como 52,6% dos desempregados são mulheres.
Para Ângela Meireles, 26, que está há dois anos desempregada, a saída foi a informalidade. “Eu pego todo tipo de bico que aparece. Aceito faxina, tenho trabalhado de garçonete em eventos, enfim, não escolho mesmo. Mas a coisa está bem complicada”, afirma.
Ela começou a trabalhar ainda com 12 anos em uma fábrica de sapatos, onde ficou até os 19. Trabalhou por vários anos em uma pizzaria até ser demitida sem sequer receber o acerto. Chegou a iniciar a graduação de recursos humanos, mas saiu faltando um ano para completar. “Esse mercado está desiludindo a gente”, reclama.
Mineiros buscam alternativa em trabalho por conta própria
O aumento do desemprego fez com que muitas pessoas passassem a trabalhar por conta própria. Em Minas, a alta foi de 21%, de 2014 a 2019, passando de 1.972 para 2.387, segundo o IBGE.
Foi assim com Elaine Cristina da Silva Rodrigues, 40. “Tem cinco anos que estou fora do mercado. Não sei se pela idade, mas senti muita rejeição das empresas, apesar de ter muita experiência como auxiliar administrativa. Fiz cursos de atualização, meus filhos não me atrapalhariam no emprego, mas, mesmo assim, não consegui. Então decidi empreender”, conta.
Ela agora vende roupas pela internet. “Comecei a fazer venda de desapegos no grupo de mães. Agora busco mercadorias em atacado. E meu marido, que estava desempregado, faz as entregas de moto”, diz.
Vagas intermitentes representam 0,5% de toda contratação
Em 2017, quando aprovou a reforma trabalhista, o então presidente Michel Temer prometeu que a desburocratização com o trabalho intermitente iria gerar empregos em um país que amargava uma taxa de desocupação de 12,8% na época. De lá para cá, no entanto, essa modalidade de contrato foi capaz de colocar no mercado mineiro apenas 14,3 mil trabalhadores. Ou seja, 0,5% dos 2,72 milhões de contratados no mesmo período no Estado, segundo dados do Ministério do Trabalho.
Como foram demitidos 4.705 desses profissionais contratados para trabalhar por demanda e com salários inferiores ao mínimo, houve a criação efetiva de apenas 9.596 vagas intermitentes no Estado. Em todo o país, foram admitidos 128,9 mil trabalhadores nessa modalidade de trabalho desde novembro de 2017. Desse total, 43,9 mil foram demitidos. Ou seja, sobraram 84,9 mil vagas.
“Quando a reforma trabalhista foi aprovada, o movimento sindical disse que haveria uma precarização do emprego e que as empresas iriam demitir e substituir por trabalhador intermitente. Isso é uma bobagem enorme, e os dados comprovam isso. Porque nenhuma empresa com trabalho contínuo vai colocar mão de obra intermitente. Elas contratam quando realmente precisam desse tipo de profissional”, explica o professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Hélio Zylberstajn.
Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), as dez principais ocupações para essa nova modalidade de trabalho no país foram: atendente de lojas e mercados, servente de obras, vigilante, faxineiro, mecânico de manutenção de equipamentos de mineração, alimentador de linha de produção, garçom, soldador, vendedor de comércio varejista e pedreiro.