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15ª edição da CineOP tem início nesta quinta-feira

Durante cinco dias, ações como a exibição de filmes e a realização de debates convidam o público a refletir sobre o momento atual mundial

Por Patrícia Cassese
Publicado em 03 de setembro de 2020 | 06:00
 
 
 
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Tendo como eixo central a temática “Cinema de Todas as Telas”, começa nesta quinta-feira (3) a 15ª edição da Mostra de Cinema de Ouro Preto (CineOP), que neste ano, claro, será realizada em ambiente virtual, em consonância com as diretrizes fixadas pelas autoridades sanitárias em função da pandemia do novo coronavírus. Durante os cinco dias do evento, ações como a exibição de filmes e a realização de debates convidam o público a refletir sobre o momento atual mundial, inclusive que tange ao próprio advento da Covid-19 e às suas marcas na recepção e na fruição dos produtos audiovisuais – mas sem deixar para escanteio um dos pilares da iniciativa desde a sua entrada em cena: o olhar para o passado, em particular no que diz respeito à importância da preservação. 
“Essa questão é protagonista do evento desde a sua primeira edição”, ressalta Raquel Hallak, coordenadora geral da mostra e diretora da Universo Produção, lembrando que, do antigo status de “patinho feio” da cadeia produtiva do cinema, a preservação acabou sendo alçada ao posto de tema ponta de lança, principalmente após o advento das novas tecnologias. A preocupação em tratar dessa pauta – que está atavicamente atrelada à da memória –, aliás, já rendeu, no curso do evento, dividendos como a elaboração das Cartas de Ouro Preto, nos quais, grosso modo, demandas e preocupações do setor são arroladas.  
Na verdade, a temática matriz da 15º CineOP, digamos assim, é, no evento, desdobrada em três vertentes específicas: Preservação, História e Educação. Na temática História, assinada pelo curador Francis Vogner dos Reis, o enfoque será “Televisão: o que foi, o que é e o que ainda pode ser”, que discutirá os pontos em que o cinema brasileiro se encontra com o universo da televisão, no ano em que a TV brasileira comemora 70 anos. “(No curso da história) alguns cineastas e outros artistas da imagem em movimento (os videastas) se aproximaram do meio TV para tentar, nas suas brechas, fazer outro tipo de trabalho, atingir outros públicos, ocupar o ‘latifúndio midiático’ e produzir de outra maneira. A ideia, então, é olhar para essas experiências na televisão brasileira”, especifica Francis.
Já a vertente Preservação tem José Quental e Ines Aisengart Menezes como curadores, trabalhando sobre o conceito de “Patrimônio audiovisual: acervos em risco e novas formas de difusão. E a Educação, pensada por Adriana Fresquet e Clarisse Alvarenga, assume o recorte “Telas e janelas: tempo de cuidado, delicadeza e contato”, que reflete como o cinema tem estado presente como nunca em diferentes telas, seja no ambiente doméstico ou no público. 
Diversidade marca programação e atividades. Raquel Hallak conta que, durante os cinco dias de CineOP, serão apresentados 101 filmes (13 longas, 11 médias e 76 curtas). Pérolas como uma cópia restaurada de “Pixote: A Lei do Mais Fraco” (1980), de Hector Babenco, ou as pré-estreias de “Cadê Edson?” (sobre movimentos populares em defesa da moradia), de Dácia Ibiapina; “Dorivando Saravá: O Preto que Virou Mar” (documentário sobre Dorival Caymmi), de Henrique Dantas; “Seres, Coisas, Lugares” (documentário sobre o universo de Guimarães Rosa), de Suzana Macedo; e “Banquete Coutinho” (documentário sobre o saudoso cineasta Eduardo Coutinho), de Josafá Veloso. Sem falar no curta “Mãtãnãg, a Encantada”, de Charles Bicalho e Shawara Maxacali, que flagra um tradicional mito Maxakali em uma história de amor com toques de espiritualidade e viés transcendental.
E, ainda, "Avesso, Festa, Baile”, documentário experimental sobre o programa musical “Festa Baile”, na época produzido pela TV Cultura de São Paulo, com apresentação de Agnaldo Rayol e Branca Ribeiro. A direção é de Tadeu Jungle, que estará na abertura, nesta quinta, em um debate junto ao líder indígena Ailton Krenak.
A CineOP também vai colocar 80 profissionais no centro de 28 debates. Não bastasse, haverá oficinas e masterclasses. No que tange ao formato online, Raquel Hallak entende que essa adaptação a uma intercorrência tão inesperada quanto a pandemia pode gerar, como efeito colateral, uma ampliação de público. “Ou seja, quem ainda não tinha tido oportunidade de conhecer o evento, vai ter, e os que já eram habituais continuarão a se identificar”. 
Outra faceta que ela destaca é a agenda artística em parceria com o Sesc em Minas, que inclui, por exemplo, exposição online alusiva aos 15 anos da mostra (30 imagens selecionadas por Leo Lara, coordenador de fotografia da Mostra Tiradentes, CineBH e CineOP desde as suas primeiras edições), cinco live shows e uma performance audiovisual inaugural. Esta, prevista para acontecer nesta quinta, às 20h, tem direção de Chico de Paula e Grazi Medrado, com trilha do Barulhista e participações de Sérgio Pererê, Mayi Mota, Eda Costa e Eduardo Moreira e Marcelino Xibil Ramos. Também nesta quinta, Às 21h30, haverá o show “Noite Festa do Cinema”, em homenagem à Rede Minas, com as presenças de Túlio Mourão, Titane e Maurício Tizumba. 
Programe-se 
Na sexta, às 21h, o live show recebe a banda Graveola. No sábado (5), Lamparina e a Primavera. No domingo (6), o Bloco Pacato Cidadão; e no encerramento, dia 7, no mesmo horário, o show “Nada Será como Antes”, de Lô Borges. Todas as atrações poderão ser vistas pelo site oficial do evento (www.cineop.com.br) e pelo canal do Sesc em Minas no YouTube. Outras notícias do evento podem ser acompanhadas nas redes sociais Instagram (@universoproducao); YouTube (Universo Produção); Twitter (@universoprod); Facebook (cineop / universoproducao) e LinkedIn (universo-produção).
Confira, a seguir, alguns destaques do CineOP 2020, divididos por recortes temáticos, com as informações do material enviado pela produção.
Mostra Histórica. O recorte feito pelo curador Francis Vogner dos Reis atravessa os últimos 40 anos da televisão brasileira. O estaque recai para programas e iniciativas que quebraram a linguagem mais convencional deste suporte. Um exemplo está na atuação de cineastas com trajetórias na televisão no fim dos anos 1970 e início dos 80, em especial no "Globo Repórter" entre 1975 e 1979. A CineOP vai resgatar duas reportagens dessa época que se tornaram marcos: "Theodorico, o Imperador do Sertão" (1978), de Eduardo Coutinho; e "Wilsinho Galiléia" (1978), de João Batista de Andrade. Outro exemplar diretamente dos canais abertos, "Os Arara" (1980-81) seria um documentário para a TV Bandeirantes, mas o diretor Andrea Tonacci se desentendeu com a emissora. O projeto permaneceu e se tornou referencial na abordagem de comunidades e vivências indígenas e no impacto da Transmazônica em grupos isolados.
Destaque especial da Mostra Histórica em 2020, a TVDO foi iniciativa de um coletivo de São Paulo que apostou na radicalidade estética, na suspensão de fronteiras entre arte, comunicação, cinema e poesia, na metalinguagem e no humor corrosivo e disruptivo. Os vídeos selecionados para o espectador da CineOP são: "Mocidade Independente" (1982), episódio de programa para a TV Bandeirantes; "Quem Kiss Teve" (1983), piloto de um programa que não foi continuado; "Avesso Festa Baile" (1984), episódio de programa da TV Cultura proibido de ser exibido na época; e "Heróis 2" (2003), um de seus últimos e mais significativos trabalhos e que integra um projeto iniciado ainda em 1987.
A Associação Brasileira de Vídeo Popular chegou a agregar 250 organizações, entre elas, a TV Viva, de Olinda, e a TV Maxambomba, do Rio de Janeiro, que estarão com trabalhos na Mostra.  Os vídeos na CineOP são "Amigo Urso" (1985), que faz humor com a pergunta "todo brasileiro é corno?", questionada ao acaso pelas ruas; e "Brasilino" (1985), no qual dois repórteres conversam, de maneira irreverente, com várias pessoas questionadas sobre os rumos do Brasil no pós-ditadura. Por sua vez, a TV Maxambomba, na Baixada Fluminense, fomentou o projeto de TV comunitária ao mobilizar os moradoresa produzirem vídeos tratando de suas questões. Já os filmes "TV Cubo 1 e 2" (1986 e 1987), de Marcelo Masagão, são a gravação de uma transmissão de TV pirata. Ainda integram a Mostra Histórica "Avenida Brasilia Formosa" (2010), de Gabriel Mascaro; "Olho de Gato Perdido" (2009), de Vitor Graize; e "A Luta do Povo" (1980), de Renato Tapajós.
Mostra Contemporânea
Nos longas e médias-metragens, com curadoria de Francis Vogner dos Reis, a CineOP chama atenção para a produção contemporânea brasileira que, de alguma forma, dialoga com o passado para reconfigurar questões do presente. 
Inserido nas sessões Cine Vila Rica, "Cadê Edson?", de Dacia Ibiapina, fala de um ataque da Polícia Militar a uma ocupação em Brasília. "Seres, Coisas, Lugares", de Suzana Macedo, parte da literatura de Guimarães Rosa, em especial o conto "O Recado do Morro”, para buscar a realidade que o inspirou, tratando, assim de uma memória que está nas letras. 
"Os Olhos na Mata e o Gosto na Água", de Luciana Mazeto e Vinícius Lopes, traz para a tela as histórias de um passado distante em uma pequena comunidade no Sul do Brasil. "A Jangada de Welles", de Firmino Holanda e Petrus Cariry, retoma a estada do cineasta Orson Welles no Brasil do começo dos anos 1940, mesclado a memórias do Estado Novo e da luta de jangadeiros por direitos trabalhistas.
Ainda que sem as sessões na Praça Tiradentes, o CineOP mantém o Cine-Praça, mesmo que virtualmente. "Dorivando Saravá - O Preto que Virou Mar", de Henrique Dantas, aborda conceitos da vida e obra de Dorival Caymmi através de poéticas praieiras concebidas a partir dos seus trabalhos de pintura e composição. 
"Banquete Coutinho", de Josafá Veloso, parte de um encontro filmado com o diretor Eduardo Coutinho em 2012 e vasto material de arquivo para retratar as inquietações do realizador, que morreu dois anos depois. 
Também em pré-estreia, "O Filme da Minha Vida", de Alvarina Souza Silva, a cineasta retoma a própria vida e trajetória para pensar a situação de crise do audiovisual no atual governo federal . 
Já o longa "José Aparecido De Oliveira – O Maior Mineiro do Mundo", de Mário Lúcio Brandão Filho, Gustavo Brandão, documenta a trajetória do jornalista, deputado federal, secretário de Estado, ministro de Estado, governador e embaixador José Aparecido de Oliveira. 
"Helen", de André Meirelles Colazzo, apresentam o cotidiano e desejos juvenis.
Na Mostra Contemporânea de curtas-metragens, com curadoria de Camila Vieira, a seleção de 11 títulos se espalha também pelos recortes do Cine-Praça, Cine-Teatro e Cine Vila Rica e abrange diferentes modos de manifestações de processos histórico-sociais nas imagens cinematográficas e suas relações entre passado e presente. 
No Cine-Praça, filmes como "As Constituintes de 88", de Gregory Baltz, ou "A Viagem de Seu Arlindo", resgatam imagens e imaginários de tempos da história nacional ou da intimidade de personagens retratados para ressignificar seus próprios sentidos.
"Dona Cila, Não me Espere para o Jantar", de Carlos Segundo, foi feito no contexto da pandemia e reflete sobre o isolamento social pela chave da ficção científica. 
Por sua vez, "Mãtãnãg, a Encantada", de Shawara Maxakali e Charles
Bicalho, retrata rituais Maxakali através da animação.
Na sessão Cine Vila Rica, "Acabaram-se os Otários", de Rafael de Luna e Reinaldo Cardenuto, e "Extratos", de Sinai Sganzerla, se utilizam de fotografias e documentos para reconstituírem memórias audiovisuais de filmes e figuras importantes do meio. 
Questões da negritude e da memória negra aparecem em "E no Rumo do meu Sangue", de Gabriel Borges, e "A Morte Branca do Feiticeiro Negro", de Rodrigo Ribeiro.
Por fim, os curtas do Cine-Teatro trabalham a abordagem de comunidades e culturas singulares representadas sobre outras possibilidades de olhar, casos de "A Fome de Lázaro", de Diego Benevides, sobre as celebrações a São Lázaro, na Paraíba; "Abdução", de Marcelo Lin, que retrata um morador da comunidade Aglomerado da Serra, na periferia de Belo Horizonte; e "Relatos Tecnopobres", de João Batista Silva, que segue, como num documentário, as ações dos guerrilheiros de uma comunidade subterrânea contra forças de repressão cyberburguesa.
Em parceria com a TV Ufop, a 15a Mostra de Cinema de Ouro Preto – CineOP apresenta duas sessões de curtas realizados em universidades, escolas de cinema ou núcleos de formação em audiovisual, que serão apresentados exclusivamente na TV Ufop.
Mostra Preservação
Dedicada a filmes do passado, a mostra da Temática Preservação de 2020 vai exibir a versão recém-restaurada de "Pixote, A Lei do mais Fraco" (1980), de Hector Babenco. A restauração foi viabilizada pelo World Cinema Project, que já recuperou 41 filmes de 25 países. "Pixote" é o segundo brasileiro trabalhado pela entidade, organização sem fins lucrativos fundada em 1990 por Martin Scorsese. O primeiro foi "Limite" (1930), de Mário Peixoto.
A sessão de curtas deste recorte foi preparada pela Associação Brasileira de Preservação Audiovisual, com filmes das décadas de 1950 a 80 digitalizados em arquivos, cinematecas e iniciativas diversas, de forma a difundir e conscientizar o público sobre o patrimônio audiovisual brasileiro.
E a mostra se completa com a exibição de "Fotografação", de Lauro Escorel, ensaio sobre a percepção imagética e a importância da fotografia ao longo de mais de um século.
Mostra Educação
Na primeira sessão do recorte de filmes da Temática Educação, serão apresentados trabalhos audiovisuais que se relacionam com a pandemia: isolamentos, encontros e desvios possíveis, efeitos do afastamento nas relações sociais e de aprendizado, pela onipresença do vídeo como janela de comunicação e pelas necessidades de outros tipos de afetos. Adultos, jovens e crianças, professores e cineastas, diante do ambiente mais cotidiano possível, registraram jardins, hábitos, parentes e inquietações, ora como um documento audiovisual e histórico da pandemia, ora como um gesto de cinema brincante. Serão três sessões com 11 trabalhos selecionados especialmente para a CineOP e comentados e discutidos ao vivo a partir dessas perspectivas.
Outra série abarca 37 curtas-metragens produzidos no Brasil por educadores, estudantes e cineastas no contexto escolar e espaços não-formais de ensino, que serão também exibidos e comentados. Por fim, acontece a sessão de médias-metragens do projeto Nehemongueta Kunhã Mbaraete, que consiste na troca de vídeo-cartas entre as professoras e suas experiências pessoais da perspectiva indígena e não-indígena.
Cine-Escola e Mostrinha
As sessões contêm curtas adequados para cada uma das faixas etárias montadas na seleção: entre 5 e 7 anos; de 8 a 10 anos; entre 11 e 13 anos; e a partir de 14 anos, faixa inclusive que contará com o longa "Meu Nome é Daniel", de Daniel Gonçalves, sobre o cotidiano do cineasta, portador de deficiência.
A sessão Mostrinha vai ser composta pelo longa "Para'í", de Vinicius Toro, que acompanha a história da menina guarani Pará, que mora com sua família na menor terra indígena do país. 
 

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