A partir de conversas descompromissadas no celular, eles descobriram o parentesco distante, e, desde então, Henrique Portugal só chama Zélia Duncan de “prima”. Os dois estreitaram laços e estrearam parceria por sugestão de Leoni. Ao enviar a melodia, o tecladista recebeu, em cerca de 15 minutos, a resposta da cantora, e logo se admirou com a letra que trata sobre “conquista, negociação e o caminhar de um casal”. 

Tudo isso resultou na faixa “No Meu Paraíso”, lançada em outubro nas plataformas digitais, com direito a um caprichado videoclipe, e que ganha, nesta sexta (13), uma versão acústica que reforça a sua identificação com a bossa nova, a partir do arranjo que “tem um espírito meio carioca, leve”. “Gosto de música assim”, disse Portugal em entrevista à rádio FM O TEMPO. Ele aproveitou para comentar sobre a novidade. 

“Mostrei a versão acústica para algumas pessoas e elas disseram que era até melhor que a original, aí resolvi lançar para o mundo”, disse. A capa do novo single também é “uma derivação da original”, e retrata cartões-postais do Rio de Janeiro, como o bondinho e o Pão de Açúcar. No entanto, há diferenças sutis. Brincando com a inteligência artificial, Portugal, admirador confesso da tecnologia, criou uma espécie de “jogo de cinco erros”, ao mudar figuras de lugar e propor o desafio de detectá-las aos fãs. 

“Já fiz muita coisa na música e a música me deu muita coisa, agora eu quero me divertir, fazer duetos, compor com quem admiro, montar o show da forma como eu gostaria de assistir”, declarou o músico, que sobe ao palco pela última vez no ano ao lado de Leo Jaime, em Goiânia, mas já prepara uma série de surpresas para 2025, que incluem inéditas com Leoni e com a Solar Big Band fundada por Portugal. “Estou fechando esse ano com chave de ouro, muito feliz, e 2025 promete”, projetou. 

Periferia, Skank e Sepultura

Portugal aproveitou para falar sobre sua participação no festival “A Voz da Periferia”, que acontece no início do ano que vem, em que atua na Comissão Julgadora ao lado de Flávio Renegado e João Marcello Bôscoli. “A música é um dos maiores fatores de inclusão social que existe atualmente e a música urbana domina as plataformas digitais. A periferia está com o poder nas mãos e isso é muito legal, porque as pessoas que moram na periferia têm o seu discurso e a sua história contadas através da arte, sem precisar se mudarem para a Zona Sul, permanecendo ao lado das pessoas e dos lugares em que elas foram criadas. Os maiores selos fonográficos do Brasil hoje estão nas periferias das grandes cidades”, exaltou.

Representante do escritório da Abramus (Associação Brasileira de Música e Artes) em Belo Horizonte, ele lembrou que expressões contemporâneas ligadas ao funk e ao rap, como o MTG e o trap, surgiram na cidade. “É uma forma de devolver para a música o que ela me deu, e ajudar esta geração que está começando a ter oportunidade, assim como eu tive”, destacou Portugal, que nunca quis sair de BH para viver de sua arte. Com o Skank, ele e seus companheiros chegaram ao estrelato nacional fincando os pés na capital mineira. O show de despedida da trupe, gravado no Mineirão, em março de 2023, “está pronto para ser lançado, dependendo só de questões burocráticas”. 

Para completar, há versões inéditas de canções de sucesso do Skank que devem vir à tona em breve. “Os fãs podem continuar escutando nossos álbuns em todas as plataformas digitais, porque os boletos continuam chegando”, brincou Portugal. “Tenho muito orgulho da história que a gente construiu, larguei tudo para ser artista e faria tudo de novo”, complementou o tecladista, que chegou a participar de três álbuns do Sepultura. “Eu era vizinho do Iggor e do Max Cavalera em Santa Tereza, a gente andava de skate juntos”, contou, ao recordar a força de “histórias e estilos musicais tão diferentes que partiram do mesmo bairro”, citando ainda o histórico Clube da Esquina. 

“Na verdade, eram três quarteirões, minha rua era na continuação da Paraisópolis”. Ele afirmou que gostaria que Belo Horizonte “tivesse um transporte urbano coletivo melhor”. “Facilita demais a vida das pessoas”. E, por fim, refletiu sobre tomar a parte principal do palco ao assumir os vocais em sua atual empreitada. “Quando você se torna cantor, o instrumento passa a ser o seu corpo. É praticamente uma nova vida. Acho delicioso e recomendo a todo mundo sair da sua zona de conforto, experimentar, inclusive para ter mais paciência com os outros”, arrematou. (com Ana Clara Brant e Renata Abritta)