MÚSICA

Cat Power mergulha no universo de Bob Dylan em show que ela traz ao Brasil no C6 Fest

Cantora norte-americana volta ao país para apresentar o disco "Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert", no qual interpreta o repertório de show icônico do músico

Por Fabiano Fonseca
Publicado em 07 de maio de 2024 | 06:00
 
 
 
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Quando Bob Dylan subiu ao palco do Manchester Free Trade Hall, na Inglaterra, em maio de 1966, poucos poderiam saber que havia ali uma revolução musical - na carreira de Dylan e no folk norte-americano. A apresentação marcou uma "transição elétrica" nos shows do artista, que dividiu o espetáculo em uma versão acústica - como era de praxe de Dylan - e outra amplificada, acompanhado da sua banda de apoio.

Durante toda essa turnê, Bob Dylan enfrentou críticas da imprensa, vaias e abusos de puristas da música folk que sentiram uma traição do músico. E este lendário concerto foi gravado e a fita pirata foi erroneamente chamada de “Royal Albert Hall” – a famosa casa de espetáculos de Londres. Fato é que o álbum - que teve um relançamento mais profissional em 1998 - mudou a era do rock e, assim como seu "patrono", inspirou gerações através de gerações pelo globo.

"Eu tenho 52 anos, então acho que isso aconteceu na minha vida da mesma forma que aconteceu com outras pessoas ao redor do mundo e que têm a mesma idade que a minha: por causa de seus pais. Tutores ou babás, irmãos e irmãs mais velhos. Qualquer pessoa que tocava músicas daquela época. E ele era um dos muitos artistas que estavam no ar, inspirando muitas pessoas".

É dessa forma que Cat Power define como a música de Bob Dylan entrou em sua vida. Nascida Charlyn Marshall - e mundialmente conhecida pela alcunha artística de Cat Power -, a cantora e compositora norte-americana reflete sobre a intensidade com a qual absorveu a música de Bob Dylan que tocava em sua casa, e sabia bem que "havia algo diferente em Bob". "Quando eu era pequena, eles (os pais) agiam de maneira diferente quando as músicas de Dylan tocavam. Falavam sobre ele, entravam em conflito sobre ele como cantor, sobre ele como cantor folk ou como cara do rock'n'roll. E havia essa complexidade nele. E isso me deixou mais interessada em descobrir por mim mesmo o que há de tão complexo", relembra Chan (apelido com a qual prefere ser tratada), em entrevista exclusiva a O TEMPO

"Foi aí que aprendi que as letras dele eram muito fáceis, divertidas, porque me fizeram pensar. E eu acho que as músicas de Bob Dylan talvez tivessem muito a ver comigo quando criança, criando meu pensamento crítico. Porque era como uma rima ou um enigma. Algo que eu tive que descobrir, o que foi divertido. Quero dizer, para uma criança, você realmente não sabe muito. Mas eu acho que à medida que você cresce, você desvenda todos os significados que todas as letras dele poderiam ter. Mas quando eu era criança, ele era o compositor de arte mais interessante para mim".

E toda essa influência acompanhou a trajetória de Cat Power, uma das cantoras mais distintas de sua geração, emergindo da cena indie-rock do início dos anos 1990 para se tornar uma artista única que funde uma infinidade de estilos. E foi no ecletismo musical que a artista tomou para si a responsabilidade de recriar o icônico show de Bob Dylan para gravar e lançar "Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert", álbum gravado ao vivo no qual ela repassa na íntegra o repertório do ídolo, e que ela traz ao Brasil no próximo dia 19, como uma das principais atrações do C6 Fest, que acontece no Parque Ibirapuera, em São Paulo - o evento acontece entre os dias 17 e 19 de maio, reunindo diversas atrações.

"Eu só quero oferecer um presente para as pessoas. Só quis entregar o álbum porque Bob (Dylan) ainda está vivo. Ele ainda está na Terra e quero que as pessoas lembrem que ele ainda está aqui", conta Chan, que quis pretar um tributo não só a Dylan, mas também aos seus fãs ao gravar o disco, respeitando acorde por acorde todas as canções - ainda que se permitiu, respeitosamente, criar suas nuances vocais.

O disco, aliás, nasce exatamente de uma oportunidade que Cat Power teve para se apresentar no icônico Royal Albert Hall. "Resumindo a história, eu só faria um show em Londres para encerrar a turnê do meu disco de covers ('Jukebox'). Mas recebi mensagens de todo o mundo pedindo que fosse tocar nesses lugares. Então foi aí que pensei no disco. E é por isso que foi gravado naquela noite para oferecer às pessoas que talvez nunca o veriam", conta Cat Power, que se delicia ao lembrar de pessoas mais velhas que puderam assistir sua apresentação relembrando um gigante. "Eu não estava viva quando Bob Dylan fez esse show. Mas eu posso ver e sentir a energia das pessoas. Sou grata ao Bob por seu domínio, por sua escrita, por ajudar todas essas pessoas ao redor do mundo a realmente terem esse tipo de pensamento crítico coletivo, apenas em sua poesia, apenas em sua escrita. E ele ultrapassou muitos limites em seu trabalho. E estou muito grata por cantar suas músicas", destaca.

Relação íntima com o Brasil

"As pessoas têm uma grande conexão com a vida. Parece que há um pulso chegando. Talvez seja por causa da Amazônia. Talvez por causa da natureza. A música, a cultura, a comida faz parte do povo. Eu sinto que as pessoas são espiritualmente abundantes. É cheio de vida. Não sei como descrever, há algo orgânico tão espesso e vivo, é uma energia muito forte, uma energia espiritual que vem das pessoas. Não é como qualquer lugar onde já estive".

É dessa forma que Cat Power descreve seu sentimento com o Brasil e os brasileiros e brasileiras. Não à toa. A apresentação que ela fará no próximo dia 19 em São Paulo - um dos poucos lugares do mundo que poderá ver ela interpretando Bob Dylan - faz parte de um intenso roteiro de shows que a cantora já realizou no país nos últimos 20 anos.

E nesse rol de visitas a terras tupiniquins, Chan relembra com muito carinho um show realizado no metrô da capital paulista, em 2014, apresentação que ela define como "mágica".

"Honestamente, em todo o mundo, há apenas alguns showws que posso citar como perfeitos, por qualquer motivo. E esse é um dos principais. Parecia que estávamos tão próximos, como se estivéssemos na mesma jornada, na mesma dimensão, como se fôssemos seres antigos em uma caverna. Foi tão bonito", relembra, ansiosa por mais uma oportunidade em pisar no país, desta vez com o repertório de um ídolo na bagagem.

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