Temas como raça e gênero sempre “atravessaram a vida toda” da mineira de Caetanópolis Sonia Gomes. Então, é natural que essas questões estejam presentes também em suas obras, mesmo que de maneira não-figurativa. Não que a artista, que acabou de abrir uma exposição individual pela galeria Mendes Wood, em Paris, se preocupe exatamente com isso.
“Eu não elaboro os trabalhos com expectativa de dar conta de conceitos. Se a obra suscita essas reflexões, isso é consequência do processo. Só depois de pronto que paro para pensar nos títulos e para elaborar por um tempo o significado da obra, mas ainda, sim, é difícil apontar que determinada obra fala sobre raça e outra sobre gênero”, acentua.
Sonia é uma das convidadas da itinerância da “35ª Bienal de São Paulo – Coreografias do Impossível”, que começa nesta quinta-feira (20), no Palácio das Artes, no centro de Belo Horizonte, e que destaca, dentre outros temas, as afromineiridades e os trabalhos de artistas mulheres.
“Todo meu trabalho é pensado a partir do movimento, do desafio do corpo com a materialidade. Vejo-o de maneira livre para que as pessoas tenham a liberdade para imaginar, não o fecho dentre um pensamento. O que eu desejo sempre é que a obra transmita alegria, essa é minha busca”, assevera.
Ao todo, estarão em exposição 123 obras, criadas por 24 artistas e coletivos nacionais e internacionais, expostos na bienal de São Paulo, ocorrida entre setembro e dezembro do ano passado. Por aqui, os visitantes terão até o dia 15 de setembro para visitar as obras selecionadas a partir de uma curadoria pensada especialmente para a capital.
“Achei muito assertiva a maneira com que a curadoria desenhou a disposição das obras no espaço, pensando em diferentes planos, convocando o público para se relacionar com a obra, a partir dessa relação de deslocamento do corpo. Isso fica evidente desde as troxas rasteiras no chão até o pendente suspenso do teto”, evidencia Sonia.
Os trabalhos de Sonia que estão expostas no Palácio das Artes são, de certa forma, um conjunto representativo de sua trajetória, das quais a mineira destaca algumas. “Essas obras representam diferentes momentos de minha produção. Sobre as obras mais recentes, destaco a série ‘Tela-Corpo’, que tem uma conversa com a obra literária da [poeta e ensaísta] Leda Maria Martins. A tela, para mim, se expande acolhendo outros corpos que carregam tensão, peso em constante negociação entre cor e forma,” elabora.
A artista destaca ainda que trabalhou com Hélio Menezes, um dos curadores, para que pudesse “frisar a contemporaneidade” de sua produção com trabalhos mais emblemáticos e “não fechá-los numa ideia de retrospectiva.”
“Esses trabalhos marcam momentos diferentes de minha produção e seus desdobramentos. Gosto de me desafiar em novas possibilidades de composição e materialidade. Poder reunir essas obras para a Bienal é muito significativo, pois ela não fechou a leitura deles numa cronologia e sim nas relações que as formas estabelecem entre si”, aponta.
As obras de Sonia são produzidas por meio de tecidos, que se entrelaçam entre texturas delicadas e robustas. O nome da artista, aliás, consta no panteão dos maiores das artes plásticas não somente no Brasil, como também no exterior.
“Para mim é algo muito novo, nunca imaginei que meu trabalho fosse atingir essa escala. Eu me sinto grata pelo reconhecimento e o respeito pela minha trajetória, isso tem me ajudado a compreender melhor a verdadeira função da arte, a alegria de ver que o trabalho pode transformar e tocar as pessoas de diferentes formas”, diz.
Além de Sonia, estarão expostos os trabalhos de outros artistas mineiros, como o do fotógrafo Eustáquio Neves, nascido em Juatuba; o da artista plástica e performer de Contagem, Luana Vitra; Luiz de Abreu, que há mais de quarenta anos desenvolve um trabalho de dança que lida com as questões de cor, raça e gênero; e o do poeta e performer belo-horizontino Ricardo Aleixo, que, recentemente, assumiu uma das cadeiras da Academia Mineira de Letras. Também se destacam obras de artistas do cinema yanomami e trabalhos das artes visuais do povo Tukano.
Pela primeira vez, as obras estarão expostas no Hall de Entrada do Palácio das Artes. Além do espaço, elas também ocuparão as galerias Alberto da Veiga Guignard, Arlinda Corrêa Lima, Genesco Murta e Mari'Stella Tristão.
Belo Horizonte faz parte de uma das 14 cidades a receberem a itinerância em 2024. Desde 2011, a capital integra o programa que leva obras expostas na bienal para diversas cidades do Brasil e do exterior. Neste ano, inclusive, BH sedia uma das maiores exposições realizadas fora do Pavilhão da Bienal de São Paulo no Ibirapuera.
SERVIÇO
Itinerância da “35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível”
Quando. Abertura: quinta-feira (20/6), às 19h. Período expositivo entre 21/6 (sexta-feira) e 15 de setembro (domingo)
Horários: De terça-feira a sábado, das 9h30 às 21h, e aos domingos, das 17h às 21h
Onde. Palácio das Artes (avenida Afonso Pena, 1.537, centro)
Classificações indicativas: Livre, exceto nas Galerias Mari’Stella Tristão (18 anos) e Arlinda Corrêa Lima (16 anos)
Quanto. Entrada gratuita