O jardineiro Narvel Roth nos faz lembrar o acompanhante de "O Gigolô Americano", lançado em 1980 e cria do mesmo diretor de "Jardim dos Desejos", em cartaz nos cinemas. Ambos têm uma rotina calcada numa organização excessiva.

Julian Kaye, o garoto de programa vivido por Richard Gere, chega a ser compulsivo na organização de seu apartamento, perceptível na separação das roupas nas gavetas.

Narvel (Joel Edgerton) segue caminho semelhante em relação à jardinagem, na forma meticulosa como se dedica às flores da propriedade de uma viúva rica interpretada por Sigourney Weaver.

Esse mundo de aparente simetria e beleza é quebrado quando um elemento do passado dos protagonistas vem à tona, transformando tudo à volta num grande caos, tornando visível formas de poder que eles estão atrelados.

Julian é belo e sedutor, mas opta por levar uma vida mais independente, uma situação que o antigo cafetão acaba interferindo negativamente. Narvel é um jardineiro dedicado e, num momento extremo, se vê totalmente manipulado pela patroa.

Esse é o grande contraste desenvolvido por Schrader nos dois filmes, em que o cuidado de Julian e Narvel para manter um ambiente belo e controlado é submetido a certas castas, em que o dinheiro e o status social falam mais alto.

No caso de "Jardim dos Desejos", é interessante ver a evolução da personagem de Sigourney, uma mulher cada vez mais dominadora, egoísta e preconceituosa, incapaz de cuidar da sobrinha negra e viciada em drogas.

A missão de introduzir a sobrinha nos trabalhos de jardinagem é dirigida a Narvel e, conhecendo o passado dele, compreenderemos, aos poucos, o grau de perfídia da tia. Ela se torna uma das peças principais dessa América de Donald Trump que Schrader quer radiografar.

A parte mais evidente dessa sociedade, com homens solitários em busca de remissão (tema sempre abordado pelo diretor, em obras como "Fé Corrompida" e "O Contador de Cartas"), é apenas a ponta do iceberg de um mundo extremamente doente.