Dez minutos de aplausos ininterruptos no palco do Palazzo del Cinema, que puseram o filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, entre os candidatos ao Leão de Ouro do Festival de Veneza, um dos mais importantes festivais de cinema do mundo. Além do diretor e dos atores Fernanda Torres e Selton Mello, também estava presente à sessão de domingo a mineira Bárbara Luz.

Ela integra o elenco, como um dos cinco filhos da família Paiva, que tem o patriarca Rubens como uma das vítimas da ditadura militar, em 1971. “Fiquei muito emocionada de estar ali. De estar em Veneza, de assistir o filme pela primeira vez e de estar celebrando junto com a minha ‘família’. Estou muito orgulhosa de poder contar essa história”, vibra.

A atriz de 22 anos não tem dúvidas de que o filme é essencial para a história do país no país neste momento, ao falar de memória. Coincidentemente, outra intérprete mineira, também jovem, tem colaborado para lembrar esse triste capítulo. Eduarda Fernandes vive uma militante de esquerda em “Zé”, de Rafael Conde, em cartaz nos cinemas.

Ambas são nomes que estão chamando a atenção e conquistando o seu espaço, principalmente na tela grande. Eduarda, hoje com 26 anos, despontou em 2018, como protagonista de “Luna”, de Cris Azzi, ganhando fartos elogios da crítica. A pandemia acabou atrapalhando a continuidade do trabalho, mas, neste ano, ela vive um ano muito especial.

Além de “Zé”, ela integrou o time da comédia dramática “Saideira”, que entrou em cartaz no ano passado. Atualmente ela filma “Bate e Volta Copacabana”, de Juliana Antunes. “Está um ano muito legal. É super bonito ver personagens de contextos  distintos ganhando suas histórias na telona”, comenta Eduarda, que também vem se dedicando ao teatro.

Apesar de estar estudando artes cênicas na Sorbonne, em Paris, Bárbara ainda não teve uma vivência mais efetiva no teatro, o que não deixa de ser curioso, por ser justamente filha de dois monstros sagrados dos palcos – Eduardo Moreira e Inês Peixoto, do grupo Galpão. “É curioso sim, mas é interessante experimentar outras coisas”, avalia.

“Para um ator, é muito importante estar em todos esses campos da atuação. Filosoficamente, eu sou muito apaixonada por teatro, por essa coisa do presente, do público, do aqui e agora. É uma arte mais democrática. Cinema tem essa coisa do conjunto, que acho belíssimo. Ninguém consegue fazer um filme sozinho”, registra Bárbara.

Ela começou no cinema aos dez anos, com “O Menino do Espelho”, de Guilherme Fiúza. De lá para cá, já totaliza oito títulos, três deles com Eduardo Nunes. “Fiz com ele o ‘Unicórnio’, num papel grande. Tenho mais dois que irão sair: ‘Cinco da Tarde’, que foi exibido no Festival do Rio, no ano passado, e ‘O Tempo das Delicadezas’, que filmamos em maio e junho”.

Já Eduarda  estava se formando em teatro quando foi chamada para viver o papel-título de “Luna”, uma experiência que, ela não nega, abriu muitas portas. “Foi um processo especial, porque eu nunca tinha tido contato com o cinema. Ele me apresentou o cinema  enquanto linguagem como também me fez entender como atriz””, assinala.

“Tive a sensação de que estava sonhando”, diz Bárbara

Para Eduarda Fernandes, “Zé” representou um trabalho muito oportuno, pois ela já vinha de uma série de estudos a respeito da ditadura militar no Brasil. A trama acompanha a trajetória de José Carlos Mata Machado, líder estudantil pertencente ao grupo Ação Popular que foi perseguido e assassinado pela repressão.

“Estava muito imantada, alimentada por esses materiais. Quando o filme veio, isso casou perfeitamente. Foi legal, porque a gente teve um encontro de elenco ali. Foi muito proveitoso essa nossa troca de conhecimento, para além do que a gente colocou ali na tela”, observa Eduarda, que interpreta Madalena, a namorada de Zé Carlos.

Ela teve “que entender que figura política era aquela, porque as pessoas que se opunham ao regime não eram uma coisa totalmente homogênea. Existiam ideias diferentes e maneiras de lutar contra aquilo”. Também foi necessário compreender como a maternidade se sustentava num “contexto muito conturbado, instável e perigoso”.

Na pele de Nalu, a filha do meio do deputado Rubens Paiva, Bárbara Luz salienta que um dos grandes momentos da preparação para “Ainda Estou Aqui” foi “entender essa personagem, que é real, pelo olhar e pela percepção do Walter, que é muito carinhoso e doce”. Explica-se: o realizador era muito amigo da família, especialmente de Nalu.

Durante as filmagens, confessa, chegou a duvidar de sua sanidade mental, ao estar ao lado de dois atores e um diretor tão brilhantes. “Não acreditava que aquilo estava acontecendo. Fiquei impressionada com o Walter porque ele é uma pessoa super delicada. A gente sente muito conforto. Sempre que vinha falar com a gente, sussurrava, sendo sempre carinhoso nas conduções”.