Foram necessárias apenas 24 horas para que os ingressos da sessão de autógrafos com as atrizes tailandesas Orm e Folk se esgotassem no Brasil. A demanda foi tanta que a Highway Star, produtora do evento, abriu vendas para mais um encontro com as artistas. Protagonistas de “Apple My Love The Series”, da Kongthup Production, as duas desembarcam no país nesta quinta-feira (30) para eventos com os fãs em São Paulo e reforçam o sucesso que as séries Girls Love ou GL tailandesas - produções que têm como foco o relacionamento romântico entre mulheres - fazem por aqui.
“Poder ir para o Brasil já é algo muito além do que sonhávamos. Foi muito além do que esperávamos. Foi algo que pensamos que era como um sonho que nem ousávamos sonhar. Conseguir isso é realmente como realizar um sonho que não imaginávamos”, confessam as atrizes em entrevista a O TEMPO. “Só queremos que todos sejam felizes e tenham bons momentos conosco. Só queremos que vocês recebam felicidade de nós enquanto estivermos aí. Isso já seria o máximo de felicidade para nós, realmente”, afirmam.
Embora não imaginassem o alcance que teriam, as duas são apenas um dos exemplos de como essas produções têm conquistado públicos cada vez maiores e mais distantes. Para se ter uma ideia, no X, nomes como Freen Sarocha e Becky Armstrong, estrelas de “Gap The Series” e “The Loyal Pin” - que tem o apoio do governo tailandês -, figuram com frequência entre os temas mais comentados. No YouTube, plataforma onde são hospedados os GL tailandeses, as séries ultrapassam as milhões de visualizações. O primeiro episódio de “Gap”, por exemplo, acumula 22 milhões de plays na plataforma. Lançado há dois meses, o capítulo de estreia de “Pluto The Series”, já chega a 1,4 milhões de views no YouTube.
Dayane Barretos, professora do departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisadora do Grupo de Estudos em Lesbianidades (GEL/UFMG), pontua que por ser um fenômeno recente, ainda é difícil apontar uma justificativa certeira para o êxito crescente dessas produções. “Mas temos algumas pistas”, ela afirma. “O público LGBTQIAPN+ é carente de produções que representem as suas experiências de forma plural, sem cair em estereótipos ou tramas em que os personagens sofrem ou morrem no final”, comenta, pontuando que essa pode ser uma das justificativas para o êxito de produções como os GLs.
A pesquisadora acrescenta ainda a própria força das redes sociais como mantenedoras e impulsionadoras das séries sáficas tailandesas. “No X também vemos muito conteúdo sobre essas séries, que ficam circulando ali entre as pessoas que já consomem esse tipo de produção e, com a forma como o algoritmo funciona (de apresentar conteúdos semelhantes àqueles com os quais se interage), vai ganhando força entre esse público ‘nichado’.
Foto: Kongthup Production/Divulgação
Muitas influenciadoras e youtubers que produzem conteúdo voltado para o público LGBTQIAPN+, especialmente para lésbicas e bissexuais, comentam sobre essas séries, fazem ranking das melhores, transmissões comentadas por outras plataformas, causando um burburinho em torno delas. É bem bacana ver isso e como essas dinâmicas vão construindo esse fenômeno”, pontua Dayane.
Há ainda mais uma justificativa para o sucesso, essa dizendo respeito ao próprio gênero das séries: o melodrama. “É um tipo de produção que estamos acostumados a consumir no Brasil, parecido com novelas, então isso também pode ajudar. A emoção, as reviravoltas, até a trilha sonora, tudo isso é bem típico do melodrama com que estamos bem acostumados. Então é como se juntasse o formato narrativo, a demanda pelo tipo de trama e representação, a lógica das redes sociais e o direcionamento para um público bem específico e a facilidade do acesso”, conclui.
Responsáveis pela página do X Girls Love Hub, Rillary Santos Santana, Adriele Amâncio Lima, Maria Tamara Alves e Maria Barbosa, criadora do portal Boys Love Hub que engloba também o portal voltado para GLs, acreditam que o sucesso das produções tailandesas passa por vários fatores. O primeiro deles tem relação com a falta de representatividade clara na TV aberta, algo semelhante ao que pontua a pesquisadora. Vale ressaltar ainda que os conteúdos GL estão disponíveis de forma gratuita no YouTube, o que reforça também o fácil acesso às produções.
“Essas séries acabam servindo de apoio e acolhimento para uma comunidade que não se sente vista”, dizem. “Os dramas GLs oferecem uma representatividade relevante, permitindo que muitas pessoas se identifiquem com as histórias apresentadas aproximando a comunidade LGBTQIAP+ das narrativas. Nós ainda não temos nada parecido no Brasil, mas na Ásia - principalmente a Tailândia, país que hoje é o responsável pela maior parte dessas produções -, elas estão não apenas crescendo em número, mas também, mostrando um cuidado maior e se tornando cada vez mais inclusivas para a comunidade, e consequentemente quem consome”, observam.
Eventos
O êxito de produções como os GL tailandeses também tem movimentado o mercado no Brasil. Não por acaso, o país tem recebido, cada vez mais, eventos de encontros com artistas da Tailândia. Exemplo disso é a própria visita das atrizes Orm e Folk ao país e a semana do “Olá BL & GL”, evento gratuito que traz ao Brasil astros das séries tailandesas.
Produtora na Highway Star, responsável pelos eventos, Laiza Kertscher explica que o sucesso desse tipo de conteúdo fez com que a empresa belo-horizontina expandisse seus negócios. “Até pouco tempo atrás, nossa empresa trabalhava majoritariamente com artistas sul-coreanos e, diante da crescente popularidade das séries BL e GL da Tailândia, temos investido cada vez mais em eventos com esses artistas. No ano de 2024, pela primeira vez em nossa história, tivemos mais eventos com artistas tailandeses do que shows de k-pop. Podemos dizer que o cenário do entretenimento tailandês está no Brasil em patamar semelhante ao que o k-pop se encontrava há alguns anos”, afirma.
Prova do potencial dos eventos com fãs de GL está no próprio anúncio da visita de Orm e Folk ao Brasil. “O evento foi anunciado em um prazo muito mais curto do que costumamos trabalhar, com abertura de vendas no mesmo mês de realização do fansign. Normalmente isso representaria um risco grande, mas mesmo com o prazo curto, o público se mostrou bastante interessado em participar da sessão de autógrafos”, conta.
A produtora ainda explica que o evento funciona de forma semelhante às sessões de autógrafos já feitas com grupos de k-pop. “Os participantes têm a oportunidade de receber um autógrafo de cada uma das artistas enquanto conversa brevemente com elas. Diferente dos shows e dos fan meetings, a sessão de autógrafos é um evento mais intimista, onde os artistas conseguem interagir mais diretamente com o público. Então se torna uma oportunidade única de se aproximar dos artistas, o que nem sempre é possível em outros formatos de evento. Além dos autógrafos, fãs poderão tirar fotos e selfies com as atrizes”, explica. Os ingressos para o evento, ainda disponíveis para venda na segunda sessão, custam a partir de R$ 160.